Individualidade no relacionamento: como manter sem gerar desentendimentos
Marcelo Testoni
Colaboração para o VivaBem
22/11/2023 04h00
A individualidade é a capacidade de manter a sua identidade pessoal, seus interesses, suas necessidades e seu espaço, sem que isso signifique renunciar ao amor e ao respeito pelo outro. Ela é importante para a saúde e o crescimento psíquico e emocional de cada sujeito e em um relacionamento permite que os parceiros se expressem livremente, se valorizem e se admirem.
No entanto, muitas pessoas confundem individualidade com individualismo, que é o egoísmo, a falta de compromisso, a indiferença e a desconsideração pelo outro. O individualismo pode prejudicar a relação, pois gera conflitos, desconfiança, ciúmes e insatisfação. Situações que Larissa Pontes, 25, de Guarulhos (SP), diz ter experimentado em seu primeiro relacionamento.
"Tive um namorado que não sabia diferenciar [esses dois conceitos] e como eu tinha medo de perdê-lo, por, na época, achá-lo lindo e ser muito jovem e inexperiente, acabei abrindo mão da minha individualidade", conta Larissa. Por consequência dessa atitude, ela diz ter desfeito amizades, perdido oportunidades de trabalho e adoecido quando o relacionamento terminou.
Como se conquista individualidade
Psicólogo pós-graduado pela PUC-Rio Grande do Sul, Yuri Busin explica que no início de um relacionamento, para não se prejudicar e nem ao outro, é preciso ser verdadeiro, estabelecer limites e equilibrar o tempo dedicado ao relacionamento e a si. "Primeiro vem o eu, que precisa ser validado e construído, para depois direcionar o olhar para o nós", acrescenta.
Não significa diminuir o parceiro, mas saber conciliar liberdade com compromisso, amor com autonomia. "Eu respeito as prioridades dele e ele as minhas. Se eu saio para fazer ioga, almoçar com minhas amigas, ele vai jogar bola com os amigos dele e tudo bem, nosso diálogo sempre foi aberto e honesto", diz Mayara Menezes, 33, de Salvador (BA).
Para a baiana, que namora há cinco anos, a comunicação sobre expectativas, sentimentos e desejos evita mal-entendidos, conflitos e frustrações. "Não renuncie ao que faz você feliz, não viva em função do outro e acordem o que é aceitável ou não na relação", aconselha o psicólogo Busin. Além disso, não force mudanças nem imponha suas vontades ou opiniões.
Juntos e separados é possível?
Qualidade é mais importante do que quantidade, e isso se aplica ao tempo juntos. Por isso, quando um casal faz algo, sai para algum lugar, deve aproveitar os momentos a sós para se divertir, se conectar, se renovar e se apaixonar. Mas se em algum momento o outro quiser fazer outra coisa, qual o problema? Afinal, a obrigação e o tédio atrapalham a intimidade e a cumplicidade.
Nesse caso, é necessário dosar o eu para não se sobressair ao nós. "Muita gente não respeita o outro por dificuldade em lidar com questões internas, por falta de autoconhecimento", informa Leide Batista, psicóloga pela Faculdade Castro Alves, em Salvador. De acordo com Larissa, seu ex-namorado era traumatizado por ter sido traído, tornando-se muito ciumento, carente e controlador.
"Se estivéssemos na academia lotada de gente e eu fosse fazer um exercício longe dele, ele se irritava. Tínhamos que utilizar os mesmos aparelhos, enquanto conhecia casais ali que faziam tudo separado", diz. Por não preservar sua individualidade devido a um problema do outro, Larissa constantemente se sentia sufocada, julgada, dependente, frustrada.
Mudança requer ação e firmeza
Quando um preza pela individualidade, mas o outro não, por não se conhecer ou se sentir inseguro, é importante então que se busque ajuda de um profissional de saúde mental, para trabalhar autoestima, confiança, comunicação. Havendo um agir, a outra parte, se quiser continuar nessa relação, precisa ter paciência e compreensão, mas também se manter firme.
"É importante conversar sobre o que se passa na cabeça do outro e avaliar se vale continuar ou não. Se sim, enfatize a importância de cada um ter sua privacidade, rotina, cuidados pessoais e autonomia, inclusive financeira", orienta Eduardo Perin, psiquiatra pela Unifesp (Universidade Federal de São Paulo).
O médico acrescenta que para dar certo, ainda é preciso carinho, respeito e apoio mútuo, valorização de qualidades, escolhas e conquistas, mas sem julgar, depreciar ou comparar.
"Marcos e eu já fazíamos psicoterapia antes de nos conhecermos e isso nos ajudou", acredita Mayara. A terapia individual é indicada quando se tem questões relacionadas à história de vida, personalidade, emoções, comportamentos. Já a terapia de casal, para como os dois interagem, e pode ser útil para resolver conflitos, estimular intimidade, negociações e fortalecer vínculos.