Câncer de mama afeta cada vez mais jovens; estudo aponta fatores de risco
Os casos de câncer em pessoas com menos de 49 anos aumentaram quase 80% entre 1990 e 2019, mostrou estudo britânico publicado na revista científica BMJ Oncology. Nas três décadas avaliadas na pesquisa, o câncer de mama foi o mais diagnosticado, estando também entre os mais fatais, junto com o de traqueia, de pulmão, de intestino e de estômago.
Os cientistas britânicos, em outro estudo, apontaram que a má alimentação, o tabagismo e o consumo de álcool estão entre os hábitos que aumentam o risco de tumores em pessoas com menos de 50 anos. Porém, a causa do crescimento de câncer precoce nessa população "ainda não está clara".
Buscando jogar luz sobre o assunto, um estudo do Icesp (Instituto do Câncer do Estado de São Paulo) analisou fatores que poderiam influenciar o aparecimento precoce de tumores na mama e encontrou dois: idade da primeira menstruação (menarca) e da amamentação.
Com base nos dados de 493 mulheres de até 40 anos com câncer de mama, a pesquisa observou que as que não amamentaram foram diagnosticadas, em média, com 33 anos, enquanto as que o fizeram, com 35.
Primeira menstruação
Em relação à idade da primeira menstruação, dentre as mulheres analisadas, foi constatado que o risco de desenvolver câncer mais precocemente aumentava quanto mais cedo tivesse iniciado o ciclo menstrual.
"Percebemos uma relação de progressão entre a idade da menarca e de diagnóstico. Nas pacientes que menstruaram com 8 anos, por exemplo, o risco era maior do que nas que menstruaram com 9 anos, que era maior do que nas com 10 e assim por diante", explica a ginecologista, obstetra e mastologista Karina Carreiro, autora da pesquisa.
Idade do 1º ciclo menstrual x câncer
Durante o ciclo menstrual, as células mamárias são expostas a uma grande quantidade de hormônios, o que aumenta o risco de mutação e câncer na região. Esse processo tem início com a primeira menstruação, o que faz com que meninas que menstruam cedo (antes dos 12 anos) sejam expostas a um período maior de risco, pontua Hélio Pinczowski, oncologista especializado em câncer de mama do Instituto Paulista de Cancerologia (IPC).
Durante o ciclo, a mente se prepara para uma eventual gestação, mas sem a fecundação, ocorre a menstruação. Nesse processo, o tecido mamário é exposto a uma chuva de hormônios.
Hélio Pinczowski, oncologista
A autora da pesquisa destaca, porém, que o estudo se restringiu a um grupo de mulheres com características específicas e que, por isso, a relação entre precocidade do câncer e menarca só pode ser relacionada a elas. "São mulheres jovens para o diagnóstico e que, provavelmente, tinham peculiaridades, como predisposição para o câncer".
Amamentação
Assim como a exposição hormonal durante o ciclo menstrual pode potencializar o risco de câncer de mama, a interrupção do ciclo durante a amamentação tem o efeito contrário.
"Durante a lactação (período de produção de leite), a maioria das mulheres fica sem menstruar, o que diminui a produção dos hormônios dos ovários — estrogênio e progesterona — que induzem a multiplicação de células mamárias e aumentam o risco de câncer", explica Luiz Porto, oncologista, professor e presidente do Grupo de Educação e Estudos Oncológicos da Universidade Federal do Ceará.
Além disso, o ato de amamentar protege a mama. Durante a amamentação, uma série de células ruins ou potencialmente cancerígenas são eliminadas, o que reduz o risco de câncer", diz Pinczowski.
Os especialistas destacam, contudo, que essa proteção é mais efetiva em mulheres que amamentam até os 30 anos.
Apesar disso, a proteção não é exclusiva desse período, já que, sempre que há diminuição da produção dos hormônios dos ovários (pausa no ciclo menstrual), há proteção.
Luiz Porto, oncologista
Fatores de risco e prevenção
Para interpretar os resultados da pesquisa, segundo Luiz Porto, é importante ter em mente que fatores de risco não indicam números absolutos, mas probabilidade. "Não é possível afirmar que mulheres que nunca amamentaram ou que iniciaram o ciclo cedo terão câncer de mama, por exemplo".
Além disso, para Hélio Pinczowski, esses fatores devem ser analisados em conjunto com outros, como comorbidades, sobrepeso e histórico familiar.
Às vezes, é difícil identificar quem é o maior responsável pelo aparecimento do câncer de mama, por isso, é importante observar cada caso para traçar estratégias de proteção.
Hélio Pinczowski, oncologista
Sobre prevenção, Karina Carreiro enfatiza a importância de a mulher conhecer o próprio corpo, fazer autoexames e, no caso de alterações, (retração da pele, vermelhidão, inchaço, ferida ou descamação do mamilo e secreção) buscar avaliação médica. "É importante conscientizar as mulheres e os profissionais para que se tenha diagnósticos o quanto antes".
Há relação com o uso de anticoncepcional?
Como o câncer de mama está vinculado a hormônios, muitos o relacionam com uso de contraceptivos hormonais. Segundo a mastologista Karina Carreiro, essa ideia tem fundamentos, dado que há estudos que comprovam essa relação. "Trata-se, no entanto, de um aumento de risco pequeno e normalmente transitório, que dura de 5 a 10 anos após a interrupção do uso".
Na pesquisa em questão, no entanto, não foi identificada relação entre o uso desses medicamentos e o aparecimento precoce do câncer, o que, segundo a autora, se deve à dificuldade de padronização dos contraceptivos.
"As pacientes usavam, há diferentes períodos, anticoncepcionais distintos, com formulações específicas e aplicados por diferentes vias — subcutâneo, intramuscular, diu com hormônio — o que dificulta o estabelecimento de padrões".
Para Carlos Alberto Ruiz, mastologista do Centro Especializado em Oncologia do Hospital Oswaldo Cruz, mesmo considerando os riscos que o uso desses medicamentos pode trazer, esse ainda é recomendado.
Colocando em uma balança os prejuízos e benefícios do uso desse método, os riscos de desenvolvimento de câncer de mama são muito pequenos e, portanto, não contraindicam o uso.
Carlos Alberto Ruiz, mastologista
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