Terapia dos filhos pequenos só faz efeito se pais também fizerem?
São muitos os motivos comportamentais e emocionais que podem levar os pais a quererem que seus filhos façam terapia. Na fase pré-escolar, por exemplo, geralmente existe alguma preocupação sobre as habilidades e o nível de desenvolvimento da criança, ou ainda dúvidas sobre por que e como fazer ela dormir no horário certo, comer alimentos saudáveis.
Maiorzinha, entre cinco e dez anos, entram outras questões, como um possível mau desempenho na escola, ou discussões frequentes com colegas e em família. Pai e mãe também podem ter notado pessoalmente ou por meio de outras pessoas com as quais a criança passa algum tempo, que ela anda mais cabisbaixa, calada, isolada, ou muito agressiva.
Problemas como esses às vezes também se manifestam na adolescência e se somam a outros, mais característicos dessa fase e igualmente complicados. Os adultos podem se surpreender com certos comportamentos do filho, que agora pode estar faltando à escola, ingerindo bebida alcoólica, usando drogas, comendo compulsoriamente, ou conversando sobre sexo na internet.
Porém, nem sempre é —ou somente é— a criança ou o adolescente que precisa de ajuda. Há casos em que os adultos é que têm questões internas a serem resolvidas e causam problemas familiares. Tanto que nessas situações, quando questionados, é muito comum os pais abordarem apenas superficialmente os problemas do filho, comenta Wimer Bottura, psiquiatra pelo IPq-FMUSP (Instituto de Psiquiatria da Faculdade de Medicina da USP).
"Quando [os pais] fazem isso [de levarem os filhos à terapia e não resolverem os próprios problemas], os filhos correm o risco de ficar estigmatizados por algo que não lhes compete, que cabe, na verdade, a um ambiente disfuncional", explica o médico. Segundo ele, ainda hoje é muito difícil e complexo para alguns pais admitirem e aceitarem ter problemas, principalmente quando têm êxito profissional/financeiro e cumprem o que chama de "padrão da sociedade".
Quando procurar ajuda
Para que comportamentos sejam considerados preocupantes e exijam acompanhamento de perto com um profissional de saúde mental, é necessário que se manifestem com frequência. Assim, quando um menor de idade é levado pelos pais ou responsáveis a um terapeuta, a primeira coisa que este deve fazer é investigar as queixas e observar os problemas relatados.
Como não todas, mas algumas respostas mentais e emocionais da criança ou do jovem podem ter origem em alguma situação dentro do ambiente familiar, é aconselhável que os pais procurem saber o que compete a eles. "Os pais são as referências principais para a criança, que tende a copiar os comportamentos de seus modelos. É algo natural", aponta Thays Mendes, psiquiatra e professora da Afya Educação Médica, de Fortaleza.
Agressões físicas e verbais entre o casal ou a família, falta de diálogo, de disciplina, carinho, disponibilidade, tolerância, sensibilidade, ou até depressão, narcisismo, traumas de infância e inexperiência são alguns dos pontos que os adultos eventualmente devem reconhecer para que não gerem reações emocionais nos filhos e possam prejudicar seu desenvolvimento.
"Muitas vezes, não há a intenção dos pais em transferir seus problemas aos filhos, muito menos os comportamentos que nem eles identificam como problemáticos. Isso nos faz pensar que ser uma boa mãe ou um bom pai exige um exercício constante de humildade e reflexões sobre seus atos e valores", acrescenta Mendes.
Mesmo que os pais não tenham culpa direta sobre os comportamentos dos filhos e problemas em casa, é importante que eles aprendam em acompanhamento psicoterápico sobre como agir de maneira construtiva e equilibrada. Isso ajuda a reconhecer situações atípicas, iniciar conversas, ter paciência e poder de convencimento com crianças e adolescentes relutantes em ser ajudados.
É pelo bem da família inteira
Havendo indicação apropriada para que crianças e adolescentes façam terapia, espera-se que sejam ajudados e melhorem no comportamento. Em geral, eles se sentem mais seguros para se expressar, valorizados e compreendidos por serem ouvidos, aprendem como lidar com as emoções e os acontecimentos da vida e até aprendem técnicas simples de atenção plena.
Por outro lado, se os pais não dão importância em querer se conhecer e tratar suas questões pessoais, muitas situações e fatores que poderiam explicar ou dar pistas sobre os comportamentos ou demandas das crianças permanecem ocultados, podendo dificultar e até inviabilizar a condução e evolução terapêutica com elas.
Nesses casos, o terapeuta, percebendo que os pais é que estão com problemas, sobretudo quando sem perceberem tomam o tempo que seria do filho com suas próprias insatisfações pessoais e conjugais, pode tentar como estratégia deixar que falem à vontade para, depois, com base nessa experiência de colocar tudo para fora, discutir a necessidade de fazerem terapia, informa Cynthia Borges, psicóloga pela UEL (Universidade Estadual de Londrina).
"Em alguns casos, após o terapeuta apontar suas impressões, há pais que demonstram perceber a relação de seu comportamento com o do filho e concordam com o término da terapia da criança ou do jovem, iniciando seu próprio processo de terapia pessoal. Entretanto, outros não concordam, impedindo infelizmente os ganhos de uma psicoterapia bem indicada para os problemas reais", conclui a psicóloga.
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