'Já desmaiei na rua': como calor afeta a saúde de quem tem doença crônica
O Brasil tem vivido este ano recordes de calor com temperaturas que ultrapassam os 40°C, com sensações térmicas que chegam próximo a 60°C, como as ocorridas no Rio de Janeiro em novembro.
Para quem tem doenças crônicas ou acabou de fazer uma cirurgia, esse calorão pode representar diversos riscos à saúde.
Asmática desde criança, Janaína Castro, 27, fisioterapeuta de Salvador, já passou por incidentes graves por causa de altas temperaturas. "Uma vez estava no Uber voltado de uma consulta médica quando comecei a ficar enjoada e tonta até que desmaiei. E quando era mais nova cheguei a desmaiar na rua voltando da escola", lembra.
Não são só esses os sintomas que Janaina tem quando o calor ultrapassa os 33ºC. "Também sinto taquicardia com sudorese forte, principalmente se o calor estiver associado a um ambiente abafado com muitas pessoas. Nessas horas preciso sentar, beber água e fazer uso da minha bombinha [spray com medicamento para asma]", comenta.
A exposição a temperaturas elevadas pode levar a um aumento da frequência respiratória, um desafio para pessoas com problemas respiratórios.
Quem também sofre muito são diabéticos, cardíacos, pacientes renais e hipertensos.
Haja coração!
Dias muito quentes, principalmente quando ultrapassam os 36,5°C —média da temperatura corporal—, estressam o sistema cardiovascular.
Nesses períodos, a vasodilatação ocorrida pelo calor diminui a pressão arterial, o que faz com que o coração trabalhe mais para bombear o sangue. É uma das tentativas do corpo de resfriar o organismo através da troca de calor corporal com o ambiente por meio da irrigação de sangue na pele.
A outra é o suor. Nesse processo, se ocorrido em excesso, há desidratação e o sangue fica mais viscoso.
Esse esforço extra aumenta o risco de infartos, arritmias, insuficiência cardíaca e até AVC (acidente vascular cerebral), principalmente em quem já tem condições cardiovasculares pré-existentes, o que muitas vezes inclui pacientes com hipertensão e diabetes.
Há ainda risco de inchaço nas pernas, elevando a possibilidade de trombose e embolia pulmonar.
Se o aumento dos vasos ocorrer nas artérias, pode gerar taquicardia, queda de pressão e diminuição do fluxo de sangue no cérebro. Sem oxigenação suficiente, o cérebro começa a falhar no comando do organismo, podendo levar ao já citado AVC.
A diminuição da pressão arterial em pessoas hipertensas, sem o controle adequado do problema, pode trazer tontura, falta de ar e escurecimento visual. Mesmo aqueles que tomam o remédio regularmente podem sentir que a pressão está caindo muito, além do desconforto físico.
Nesses casos, o recomendado é não parar a medicação por conta própria e procurar orientação do médico para regular a dose durante períodos de temperaturas mais altas. Além de se manter hidratado.
Pacientes renais também precisam ficar atentos. Os rins desempenham um papel importante na regulação da temperatura corporal e diante do excesso de calor acaba desidratando, levando a uma piora numa disfunção renal pré-existente ou aparecimento de uma lesão renal aguda.
Uma desidratação excessiva pode levar até mesmo a insuficiência renal. Por isso, fique atento a coloração da sua urina, se estiver amarelo forte indica que o rim está economizando água por sofrer desidratação.
Pós-operatórios também exigem cuidados extras
Pessoas que acabaram de passar por cirurgia também precisam tomar alguns cuidados, principalmente aquelas de grande porte, que necessitam de uma reabilitação mais demorada.
O calor excessivo se soma a fragilidade da condição de pós-operado e pode aumentar o risco de queda de pressão com náuseas e desmaios em alguns casos, além de formação de coágulos sanguíneos (levando a trombose) —principalmente quando o paciente se movimenta pouco em casa para evitar sair no calor, estresse cardiovascular e aumento do inchaço na região operada devido a vasodilatação, com risco de sangramento.
O aumento do fluxo sanguíneo provocado pela maior dilatação dos vasos pode acabar ainda modificando a estrutura das cicatrizes.
Outro ponto importante é o aumento do suor, que muitas vezes pode deixar os curativos úmidos e elevar o risco de infecção. Nesses casos, a indicação é trocar o curativo com maior frequência para mantê-lo seco e limpo.
Por isso, é importante evitar lugares quentes até ao menos 21 dias após a cirurgia e a exposição ao sol direto nos 30 primeiros dias.
O que fazer diante de um mal-estar pelo calor
Conduza a pessoa para um local sombreado, fresco e arejado
Tire peças de roupa desnecessárias, como terno, por exemplo
Ofereça água fria ou gelada para resfriar o corpo
Use compressas de água fria na testa, pescoço, mãos, torso ou virilha
Se houver possibilidade, depois da melhora, tome um banho frio
No caso de queda de pressão, é importante deitar ou sentar em algum lugar para evitar o risco de queda. Deitado, busque colocar as pernas para cima para aumentar o fluxo de sangue em direção ao coração. Sentado, isso também pode ser alcançado cruzando a perna
Se houver falta de ar e alteração de consciência, é importante buscar atendimento médico imediatamente.
Atitudes preventivas que ajudam a diminuir os riscos
Andar na sombra quando estiver ao ar livre
Evitar a exposição prolongada ao sol entre 10h e 16h
Permanecer em ambientes ventilados ou com ar-condicionado
Usar chapéu ou boné em ambientes externos
Usar roupas leves, soltas e claras, com tecidos respiráveis como algodão
Ter uma boa alimentação, de preferência com alimentos leves e frescos, como frutas, verduras e legumes
Manter a hidratação. Beba água mesmo se não sentir sede
Evitar praticar atividade física entre 10h e 16h, mas se for praticar, fazer apenas em locais protegidos do sol e climatizados com ar-condicionado
Optar por banhos de água fria para diminuição da temperatura corporal
Evitar bebidas alcoólicas e cafeína, pois podem aumentar a desidratação
Sempre usar protetor solar apropriado para seu tipo de pele, de preferência com FPS acima de 30
No caso dos pós-operados, o indicado é seguir à risca toda a reabilitação proposta pelo médico e evitar ficar muito tempo sentado ou deitado por conta do calor
Fontes: Natan Chehter, clínico-geral e geriatra pela USP e médico do Hospital Estadual Mário Covas, em Santo André (SP), referência mundial no tratamento de infarto; Eduardo Lima, médico chefe do departamento de cardiologia do Hospital Nove de Julho (SP); e Júlio Barbosa, neurocirurgião e médico pela UFBA (Universidade Federal da Bahia).
Deixe seu comentário