Família ajuda quem tem diabetes a seguir tratamento: 'Sempre me incentivam'
Quando se trata de manter o diabetes controlado, não faltam conselhos que giram em torno de seguir uma dieta e fazer exercícios. No entanto, o apoio emocional e o suporte prático de quem convive com o paciente diabético também são essenciais no manejo da doença.
Uma pesquisa publicada em fevereiro deste ano na revista BMJ Open Diabetes Research & Care, por exemplo, mostrou que pessoas com cônjuges são mais propensas a controlarem os níveis glicêmicos, mantendo uma vida saudável a longo prazo.
Outros estudos também elucidaram que a coabitação faz com que o paciente diabético se mantenha motivado e disciplinado com o tratamento, que muitas vezes envolve a administração de medicamentos, monitoramento regular da glicose no sangue e visitas frequentes ao médico e nutricionista.
"Quando a família é consciente, a tendência é que ela promova um suporte maior para esse paciente, condicionando-o a um controle metabólico adequado", ressalta o endocrinologista Wellington Santana da Silva Junior, professor da Universidade Federal do Maranhão.
O aposentado Renato Faria, 54, teve complicações do diabetes e precisou morar com uma das filhas por um tempo. Ela preparava uma comida saudável, calculava a insulina, aplicava a glicose e ainda fazia curativos em seu pé.
"Como morava sozinho, eu descuidava dos horários das refeições e comia qualquer coisa. Depois desse tempo que passei com minha filha, eu vi a diferença que faz seguir a dieta e aplicar a insulina certinho", conta. Renato, que já voltou a morar sozinho, conta que mudou sua relação com a doença e diz ser muito grato pelo carinho e puxões de orelha que recebeu das filhas.
"Elas foram essenciais para que eu conseguisse retomar minha vida depois de sofrer uma amputação em um dos dedos dos pés, em decorrência do diabetes descontrolado", diz.
A esposa do arquiteto Carlos Benedetto, 63, que tem diabetes tipo 2, prepara doces e bolos sem açúcar, que segundo ele, o ajudam a manter a glicemia controlada. "Depois que me tornei diabético, a vontade de comer um docinho só aumentou", brinca.
Mas o suporte não é só no tratamento. Rafael Marques, psicólogo clínico e voluntário na ADIABC (Associação de Diabetes do ABC), diz que a família é uma fonte essencial de apoio emocional para o paciente, ajudando-o a lidar com estresse, ansiedade e eventuais sentimentos de isolamento, que são comuns principalmente no início do diagnóstico. "A comunicação aberta e o entendimento mútuo dentro da família são essenciais para criar um ambiente emocionalmente sustentável", diz.
Estímulo ao estilo de vida saudável
Foi pensando nas quatro filhas que o administrador Fabiano Araújo, 44, que tem diabetes tipo 1, decidiu mudar o estilo de vida. "Eu cuidava do diabetes de maneira muito superficial, e quando cheguei aos 105 kg, tomei um susto e fiquei com medo de não conseguir ver minhas filhas crescerem", conta.
Não só a alimentação mudou, como ele adotou a atividade física como hábito diário, tornando-se triatleta e maratonista. "Eu saio para pedalar ou para correr todos os dias às 5 horas", diz. "Elas sempre me incentivam."
De acordo com o administrador, as filhas conhecem bastante da doença e sabem lidar com episódios de hipoglicemia. "Uma vez, eu estava passeando com minha filha mais velha e passei mal. Mas ela soube o que fazer e evitou um evento mais grave", conta. Segundo Fabiano, a esposa Letícia não fica atrás e virou quase um "glicosímetro ambulante".
Atualmente, ele tem uma bomba de insulina junto ao corpo e quando participa de maratonas e competições, a esposa vai de carro de apoio, monitorando os níveis de glicemia dele através de um aplicativo no celular. "Ela sempre está ali me monitorando", orgulha-se.
Compreendendo a condição
Se o apoio familiar é importante para adultos, quando se trata de pacientes crianças, os pais e responsáveis têm papel crucial no manejo da doença. Munidos de informações a respeito da doença e seu tratamento, eles precisam repassar esse conhecimento, educando a criança sobre sua condição.
A corretora de seguros Aureloyse Máximo, 53, diz que desconhecia a doença até seu filho Arthur ser diagnosticado com diabetes tipo 1 quando ele tinha 5 anos.
"Fiquei sem chão, mas mergulhei de cabeça naquilo e comecei a ler tudo sobre o assunto para me informar e dar a ele o melhor tratamento", conta a corretora, que também buscou o suporte da ADIABC, que promove o acolhimento de famílias e pessoas com diabetes.
"A primeira vez que fui lá, estava tendo um evento para crianças e vi várias delas correndo, se divertindo, se alimentando e isso foi um marco para mim, pois percebi que meu filho teria vida depois do diagnóstico", recorda.
Não demorou muito para que a corretora decidisse criar um grupo no WhatsApp para que as mães pudessem se acolher e trocar experiências sobre o tratamento dos filhos.
"Com o grupo, a gente não precisava esperar pelos encontros quinzenais para conversar. Lá fazemos esse acolhimento principalmente das mães que acabaram de receber o diagnóstico dos filhos. Acho essencial essa troca, porque no começo a gente não sabe nem o que perguntar para o médico na consulta", diz.
Graças ao cuidado da mãe, Arthur teve uma infância comum, praticou diversas modalidades de esporte e hoje, com 17 anos, se prepara para prestar vestibular. "Agora estou na fase da autonomia dele, tenho que respeitar a individualidade e o conhecimento que ele também adquiriu sobre o tratamento", diz Aureloyse.
Dicas aos familiares do paciente diabético:
Promova uma alimentação saudável;
Estimule a prática de atividade física;
Ofereça apoio emocional;
Lembre o paciente de fazer a administração correta dos medicamentos;
Incentive a frequência nas consultas médicas e nutricionais.
O que é diabetes?
É uma condição de saúde que ocorre quando o corpo não consegue produzir insulina suficiente ou não a utiliza adequadamente. A insulina é um hormônio essencial para converter glicose (açúcar) em energia. Sem esse processo eficiente, a glicose se acumula na corrente sanguínea, resultando em níveis elevados de açúcar no sangue, uma característica distintiva do diabetes.
A doença, que atinge atinge 10,2% da população brasileira, conforme dados da pesquisa Vigitel Brasil 2023 (Vigilância de Fatores de Risco e Proteção para Doenças Crônicas por Inquérito Telefônico), tem dois tipos:
Tipo 1: ocorre quando o sistema imunológico ataca as células produtoras de insulina no pâncreas e seu aparecimento decorre de fatores genéticos e ambientais. Geralmente, os sintomas aparecem ainda na infância.
Tipo 2: desenvolve-se quando o corpo não produz insulina suficiente ou não a utiliza adequadamente. Frequentemente decorre de hábitos de vida, como dieta inadequada e falta de exercício. Fatores como histórico familiar, obesidade e idade avançada também aumentam o risco de desenvolver diabetes tipo 2.
Os sintomas da doença variam, mas incluem sede excessiva, aumento da frequência urinária, fome constante, perda de peso não intencional, fadiga e visão turva. Identificar esses sinais precocemente é crucial para um diagnóstico e tratamento eficazes.
Fontes: Rafael Marques, psicólogo clínico e voluntário na ADIABC; Ticiane Bovi, nutricionista, doutora em ciências médicas pela Unicamp e professora da Faculdade de Medicina da USP; Wellington Santana da Silva Junior, endocrinologista, professor da UFMA (Universidade Federal do Maranhão), diretor do Departamento de Diabetes da Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabologia e diretor do Departamento de diabetes tipo 1 da Sociedade Brasileira de Diabetes.
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