Por que muitos idosos adoecem e morrem quando ficam viúvos?
Já ouviu o ditado "unidos até na morte"? Pois em se tratando de casais de idosos que viveram dezenas de anos juntos, infelizmente isso tende a fazer muito sentido, explica Paulo Camiz, geriatra e professor do HC-FMUSP (Hospital das Clínicas da Universidade de São Paulo): "Pela dependência muito grande entre si, quando a relação se rompe, o impacto é devastador", diz.
A parte sobrevivente precisa enfrentar o luto, um processo difícil, que pode começar antes do falecimento do cônjuge em si, com uma hospitalização ou doença crônica sofrida, por exemplo, e que exige atravessar uma dor composta por uma variedade de sentimentos e de perdas em diversos sentidos.
"Se o idoso não tiver condições emocionais, cognitivas e orgânicas —que inclusive são afetadas e podem ser duramente desestabilizadas pelo luto— e não contar com o suporte de uma rede de apoio (formada por familiares e profissionais, como médico, cuidador, psicólogo/psiquiatra), a probabilidade de não conseguir se adaptar, superar e morrer é bem elevada", informa Camiz.
Primeiros dois anos são decisivos
O acolhimento imediato ajuda o idoso a perceber que não está sozinho e que é importante e amado pelos outros.
Segundo os médicos, os períodos mais difíceis para ele e que merecem um acompanhamento de perto, de atenção e cuidados presenciais, abrangem do primeiro mês após o falecimento ou hospitalização da outra parte, até o segundo ano, devido às recaídas.
Nesse intervalo de tempo o risco de o viúvo também morrer pode aumentar em cerca de 60%, de acordo com pesquisadores da Universidade Harvard (EUA). Por trás disso é que, de modo igual, tanto doença como morte do cônjuge infligem altos níveis de estresse, perda de apoio social, emocional, econômico, depressão e adoção de hábitos ruins, como alcoolismo.
"Quando comparados os gêneros, estudos apontam que a probabilidade de os homens idosos morrerem quando ficam viúvos é maior, 21%. Já no que compete às mulheres idosas, 17%", explica Luiz Scocca, psiquiatra membro da APA (Associação Americana de Psiquiatria). Para efeito de comparação, o risco de morte por hospitalização de um dos pares, é de 4,5% para eles e de 2,7% para elas.
Doenças que mais prejudicam
A solidão que leva à morte não é somente decorrente da ausência física do outro, como também da ausência mental.
Condições psiquiátricas, a exemplo de Alzheimer, que cursa com a perda progressiva da memória e do raciocínio lógico, além de mudanças drásticas de rotina e aumento de dependência e cuidados, pode elevar o risco de morte do parceiro em até 32%.
Para além da demência, também podem predispor diminuição ou perda da saúde do cônjuge idoso até então em boas condições clínicas, doenças crônicas como insuficiência cardíaca, fratura de fêmur e quadril, doença pulmonar crônica, como enfisema, e câncer. A probabilidade de morte indireta do companheiro nesses casos fica entre 11% e 15%.
"Muitas vezes, o companheiro acaba deixando de lado a sua própria saúde, negligenciando-se, para cuidar do outro, que está adoecido. A gente vê muito isso na prática clínica e quem acaba tendo uma mortalidade maior se ficar viúvo costuma ser o homem —por ser mais carente", comenta Manuela Castro Sales, geriatra e professora da Afya Educação Médica de Fortaleza.
Amar protege a saúde, mas não só...
Relacionamentos amorosos, quando considerados fonte de bem-estar, são um importante fator de proteção da saúde como um todo.
Do ponto de vista mental, casais de longa data apresentam menor índice de depressão e ansiedade e maior senso de humor e de comportamentos emocionais positivos gerais, como afeto, autoaceitação, solidariedade.
Amar (inclusive novamente) ainda ajuda a proteger o sistema cardiovascular de doenças coronarianas e AVCs, cujo risco é maior entre os viúvos.
Quando vivemos com alguém, os sinais de que algo não vai bem são reconhecidos precocemente e normalmente há maior adesão a tratamentos, porque um ajuda o outro e juntos possuem maior segurança financeira e social.
"Se é um idoso mais jovem, entre 60 ou 70 anos, no geral vai ter mais disposição e mais funcionalidade para buscar um novo parceiro", complementa a geriatra Manuela Castro Sales.
Por isso, quando viúvo, passado o luto e a dor, é importante seguir em frente, por nós mesmos e por aqueles que estão aqui e nos querem bem.
Isso inclui se permitir conhecer novas pessoas e cuidar da alimentação, exercitar regularmente corpo e mente, conviver mais com familiares e amigos, diminuir o consumo de cigarro e bebida e ter sempre propósitos de vida. A vantagem de ser mais velho é saber melhor o que queremos e o que nos motiva e dá prazer.
Deixe seu comentário
O autor da mensagem, e não o UOL, é o responsável pelo comentário. Leia as Regras de Uso do UOL.