TDAH diagnosticado na vida adulta aumenta risco para demência, diz estudo

Ter um diagnóstico de TDAH (transtorno do déficit de atenção e hiperatividade) na vida adulta pode aumentar o risco para desenvolver demência na velhice. É o que sugere um estudo publicado em outubro de 2023 no periódico JAMA Open Network.

Com a permissão de uma organização sem fins lucrativos de serviços médicos israelense, os pesquisadores avaliaram os registros médicos de mais de 109 mil pessoas, com idade entre 51 e 70 anos, que entraram no banco de dados a partir de 2003 sem ter diagnóstico prévio de demência ou TDAH.

Ao longo do estudo, alguns pacientes receberam o diagnóstico de TDAH e também demência. Depois de considerarem fatores como idade, sexo, condição socioeconômica e outros dados associados às condições de saúde, o time de especialistas concluiu que aqueles que foram diagnosticados com TDAH durante o período analisado tiveram um risco quase três vezes maior de também serem diagnosticados com demência.

Por outro lado, não houve aumento do risco de demência associada com TDAH na vida adulta entre os participantes que receberam o diagnóstico e foram tratados com medicamentos específicos para o problema.

O que significa esse resultado?

Antes de tudo, é importante deixar claro que o estudo não estabelece uma relação de causa e efeito, ou seja, não é porque alguém descobriu o TDAH na vida adulta que obrigatoriamente irá desenvolver demência na velhice.

Por outro lado, mesmo sem estabelecer uma relação direta, o trabalho é interessante pois evidencia algo que os médicos já sabem: a importância do tratamento de transtornos psiquiátricos para a prevenção de processos demenciais ao longo da vida.

"Embora não esteja claro em qual fase da vida, o reconhecimento precoce de condições psiquiátricas e o tratamento adequado delas muito possivelmente ajudam, sim, a prevenir processos demenciais", acredita Diogo Haddad, neurologista do Hospital Nove de Julho, em São Paulo.

Os próprios autores do estudo consideram essa hipótese e dizem que é plausível que o TDAH cause no cérebro uma redução na sua capacidade de compensar os efeitos dos processos neurodegenerativos.

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Cuidar da saúde mental é uma forma de preservar a reserva cognitiva, uma espécie de "poupança" que formamos ao longo da vida, por meio de estímulos para a geração de sinapses e conexões cerebrais, e que nos permite encontrar formas alternativas de realizar tarefas.

Doenças como depressão e transtornos de humor (como a bipolaridade), por exemplo, causam danos à estrutura do cérebro que, ao longo dos anos, podem levar ao surgimento de processos demenciais, afirma Danielle H. Admoni, psiquiatra geral e da infância e adolescência, supervisora na residência da Unifesp e especialista pela ABP (Associação Brasileira de Psiquiatria).

Nesse sentido, já existem estudos mostrando que pacientes com depressão não tratada podem ter uma perda acentuada de reserva cognitiva ao longo da vida —o que, por sua vez, aumenta o risco de desenvolver demência nos anos finais da vida. O mesmo ocorre com o transtorno de ansiedade, que também pode causar esses mesmos prejuízos se não for tratado adequadamente.

Quais os prejuízos provocados pelo TDAH?

O TDAH é um transtorno do neurodesenvolvimento que consiste na dificuldade de manter ou sustentar a atenção, além de provocar impulsividade e inquietação. Mas os médicos ainda não sabem exatamente quais são os neurotransmissores envolvidos nessa condição e também não há evidências de como ou de que forma ele altera a estrutura do cérebro.

"No entanto, sabemos que não tratar esse problema pode, sim, provocar prejuízos enormes em diversos aspectos da vida, como relacionamentos, escola e trabalho, o que muito possivelmente terá impactos negativos importantes no futuro da vida desse indivíduo", pondera a psiquiatra.

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É comum, por exemplo, que adultos com TDAH relatem que passaram a infância se sentindo incapazes na escola, ou se envolviam em confusões por serem impulsivos demais. Há até relatos de abuso de substâncias na adolescência, em uma tentativa de melhorar os sintomas do problema. Por isso, não é incomum que adultos com o transtorno também tenham depressão, ansiedade e outras condições mentais associadas.

Os especialistas concordam que o principal destaque do estudo é justamente reforçar a importância do tratamento do TDAH, mesmo que ele seja descoberto na vida adulta. "O adulto que recebe o diagnóstico já terá um processo adaptativo cerebral, portanto o tratamento dele é diferente do que seria com uma criança", explica a médica.

"Respeitando isso e também levando-se em conta as necessidades específicas do paciente, o tratamento é importante no desenvolvimento de vida dessa pessoa e especialmente durante o processo de envelhecimento, que é quando ele se torna mais suscetível aos quadros de demência", afirma.

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