Ele teve câncer de pele aos 31 anos: 'Era normal ficar vermelho e ardendo'
Bárbara Therrie
Colaboração para VivaBem
21/01/2024 04h05
Na família de Guilherme Bueno Sansone Garcia, 37, era "normal" ficar com a pele queimada, vermelha, ardendo e descascando após um dia de sol na praia. O excesso de exposição solar ao longo de sua vida sem a adequada proteção, porém, o levou a ser diagnosticado com câncer de pele aos 31 anos. A seguir, o diretor comercial conta como a gestação da esposa em meio ao tratamento lhe deu forças para lutar contra a doença.
"Aos 18 anos, passei com um dermatologista porque estava com muita acne e queria fazer um tratamento. O médico examinou o meu corpo todo, tenho muitas pintas, mas ele identificou uma pinta no meio das costas que lhe chamou atenção. Ela media cerca de 5 cm, tinha algumas partes marrons, outras pretas, e apresentava uma textura diferente.
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O médico recomendou que eu fizesse uma cirurgia para retirá-la porque havia a chance de ser um tumor maligno. Fiz o procedimento no mesmo dia no consultório, com anestesia local, e fui para casa. Algumas semanas depois o resultado da biópsia deu inconclusivo. O dermatologista disse para eu não me preocupar e pediu para eu observar caso aparecesse outra pinta diferente.
Segui minha vida normalmente, mas 13 anos depois começou a crescer um caroço bem durinho entre o meu pescoço e o ombro esquerdo. Ele não doía, mas passei a ter dificuldades para fazer alguns exercícios na academia e sentia um incômodo quando colocava o cinto de segurança para dirigir.
Depois de adiar minha ida ao médico por alguns meses e de muita insistência da minha esposa, a Marcela, fui à dermatologista. Fiz um ultrassom do pescoço, mas o resultado deu inconclusivo.
A médica me encaminhou para um especialista em cabeça e pescoço. Havia duas hipóteses: linfoma ou tuberculose, mas as doenças foram descartadas ao fazer alguns exames.
Fui submetido a uma punção no caroço e, posteriormente, fiz uma cirurgia para retirada parcial —tirei 5 cm dos 7 cm porque ele estava em uma região delicada e havia o risco de eu perder o movimento do braço esquerdo se mexesse muito.
Após duas biópsias, fui diagnosticado com um tipo de câncer de pele, o melanoma metastático, com mutação BRAF. O tumor de origem estava localizado entre o pescoço e o ombro esquerdo, e os outros menores na pele da garganta e do peito direito.
O médico explicou que uma das causas foi devido ao excesso de exposição solar ao longo da minha vida sem a adequada proteção. Meus pais não tinham o hábito de aplicar protetor solar com frequência em mim quando eu era criança, não havia esse tipo de preocupação.
A gente ia para a praia e era 'normal', quase cultural, ficar com a pele queimada, vermelha, ardendo e descascando.
Peguei insolação várias vezes, mas lembro de uma que foi tão forte que nem o Caladryl adiantou e fiquei 30 minutos no banho gelado para tentar aliviar a dor.
Na adolescência também abusei do sol. Quando ia à praia, passava o dia inteiro jogando futebol com os meus amigos, praticamente sem nenhuma proteção solar. Segundo o médico, um outro fator de risco para ter desencadeado o melanoma deve ter sido a pinta que retirei havia 13 anos.
Fiquei assustado com o diagnóstico, afinal tinha 31 anos na época e fazia alguns meses que minha mãe tinha falecido de câncer no colo do útero.
Por outro lado, sou uma pessoa prática, procurei uma oncologista e dei entrada na documentação para participar de um estudo clínico com pacientes com melanoma metastático que fazem o uso de terapia alvo e imunoterapia.
O processo demorou quatro meses, nesse tempo, o tumor voltou a crescer, chegando a ficar maior do que antes da cirurgia. Fiquei angustiado, mas no final deu tudo certo. Iniciei o tratamento em março de 2018, tomo quatro comprimidos diariamente e a cada 15 dias faço a imunoterapia por meio de infusão venosa no hospital.
A resposta inicial foi bem rápida, o tumor diminuiu consideravelmente de tamanho em dois dias, mas sofri com vários efeitos até ajustarem a dose. Um deles foram as dores articulares, sentia muita dor para sentar e levantar. Também tive alteração no paladar —água tinha gosto doce—, além de aftas, inflamação no olho e uma pneumonia medicamentosa.
Após o período de adaptação e de ajuste da dose, hoje em dia só fico um pouco cansado no dia seguinte à imunoterapia, mas de forma geral me sinto bem, consigo trabalhar, me exercitar e ter uma vida normal.
Antes de entrar para o estudo clínico congelei o sêmen porque a médica explicou que as medicações poderiam afetar minha fertilidade. Durante o tratamento, eu e a minha esposa fizemos uma fertilização in vitro.
A gestação, o apoio incondicional da Marcela e o sonho de me tornar pai foi o que mais me fortaleceu para lutar contra o câncer. Precisava sobreviver, estar vivo para poder segurar meu filho, o João Gabriel, no colo, brincar e cuidar dele. Além disso, sou uma pessoa de fé, mantive minha cabeça boa e não deixei me abater.
Estou com o quadro estável, continuo fazendo o tratamento e tomo todos os cuidados em relação ao sol. Evito me expor aos raios solares por muito tempo, aplico o protetor solar duas vezes ao dia mesmo em dias nublados.
Uso roupas e acessórios com proteção UV, e utilizo um protetor de pescoço em dias muito ensolarados. Minha mensagem final é para que as pessoas se conscientizem sobre a importância de se prevenir contra o sol para evitar ter um câncer de pele no futuro. Para os que estão em tratamento, tenham fé e força sempre."
Saiba mais sobre o câncer de pele
O câncer de pele é o tipo mais frequente de câncer no ser humano, tanto no Brasil como no mundo.
Ele surge a partir de uma alteração genética que acomete as células da pele, causada por diversos fatores, dentre eles a radiação solar, formando um tumor. É dividido em melanoma e não melanoma.
O melanoma pode ocorrer em toda a pele (incluindo palmas e plantas) e mucosas. É o tipo menos frequente entre os cânceres de pele, no entanto, é o mais agressivo, de pior prognóstico e maior índice de morbimortalidade devido à alta possibilidade de provocar metástases, isto é, a disseminação do câncer para outros órgãos, como pulmões, fígado e cérebro.
"Estudos apontam que, em média, o melanoma leva a uma perda de 15 anos de vida por morte prematura. No Brasil, esse número chega a 20 anos de vida perdidos. Felizmente, graças aos novos tratamentos e disseminação do conhecimento sobre a doença, a mortalidade tem caído nas últimas décadas", explica Mirella Nardo, oncologista do Icesp (Instituto do Câncer do Estado de São Paulo), ligado ao Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da USP e da Oncologia D'Or.
Já o não melanoma surge mais frequentemente na pele de rosto e braços por serem áreas mais expostas ao sol. É o tipo de câncer de pele mais prevalente no mundo, mas de menor mortalidade, com altos percentuais de cura se detectado e tratado precocemente. É representado pelo carcinoma basocelular (CBC) e pelo carcinoma espinocelular (CEC).
Os principais fatores de risco para o câncer de pele são:
- exposição prolongada e repetida ao sol, em que a pessoa fica com a pele queimada, vermelha e com bolhas
- histórico pessoal e familiar de câncer de pele
- realização de bronzeamento artificial
- presença de pintas e manchas da pele
- cor da pele mais clara, quando associada a olhos e cabelos claros
- uso de medicamentos que diminuem o sistema imune
- algumas síndromes hereditárias com predisposição ao câncer
De acordo com Carlos Baptista Barcaui, dermatologista, vice-presidente da SBD (Sociedade Brasileira de Dermatologia) e coordenador da campanha Dezembro Laranja, o câncer de pele pode ser assintomático, mas é importante ficar atento a feridas que não cicatrizam; manchas que coçam, sangram ou descamam; dor ou ardência; sinais de nascença ou pintas que mudam de tamanho, forma ou cor e o surgimento de novas manchas, pintas e sinais.
Pessoas com mais pintas pelo corpo apresentam maior risco de terem a doença. Em caso de dúvidas, o indivíduo pode fazer um autoexame conhecido como regra do "ABCDE" que se refere às principais características de lesões malignas suspeitas.
"A" significa assimetria da pinta ou mancha
"B" equivale à presença de bordas irregulares
"C" traduz a presença de diferentes cores na lesão, como preto, marrom, bege, branco, cinza, vermelho e azul
"D" reforça sobre o diâmetro (lesões acima de meio centímetro já são de maior risco)
"E" corresponde à evolução da pinta ou mancha nas últimas semanas ou meses, qualquer mudança deve levantar a suspeita
"Vale reforçar que somente o autoexame não é suficiente para ajudar no diagnóstico precoce do melanoma, por isso, é importante consultar o médico dermatologista para a avaliação geral e regular da pele", pondera a oncologista, que é especialista no tratamento de sarcomas e melanomas.
Tratamento pode incluir imunoterapia em casos graves
O tratamento para câncer de pele dependerá do tipo, estágio, localização, tamanho e profundidade do tumor, além das condições gerais de saúde geral e história clínica do indivíduo.
"Na maioria dos casos, o tratamento consiste na remoção cirúrgica completa da lesão, que pode curar o câncer se detectado precocemente", afirma Barcaui, vice-presidente da SBD.
Para os pacientes com doença avançada ou metastática em que a cirurgia não é mais uma opção curativa, é possível indicar a terapia alvo (pílulas que podem ser utilizadas por pacientes com um subtipo especial de melanoma, com a mutação de BRAF) ou a imunoterapia.
"A imunoterapia funciona estimulando o sistema imune que consegue lutar contra o câncer. É como se o sistema imune tivesse uma catraca para a sua ativação que por vezes pode prendê-lo para evitar reações contra o próprio corpo. A imunoterapia anula essa catraca, permitindo a ativação das nossas células de defesa", explica a oncologista.
Veja dicas para se prevenir contra a doença
Use protetor solar 15 minutos antes da exposição ao sol, e reaplique a cada duas horas ou após longos períodos de imersão na água ou suor.
Aplique duas camadas do produto ou use a regra da colher de chá, na qual se considera a aplicação de 1 colher de chá para o rosto/cabeça/pescoço, 1 colher de chá para cada braço/antebraço, 2 colheres de chá para o tronco e 2 colheres de chá para cada uma das pernas.
Use fator de proteção solar igual ou maior a 30.
Evite se expor ao sol no período de maior risco, entre 10h e 16h.
Use barreiras físicas com o objetivo de bloquear a radiação ultravioleta, como roupas, chapéus, óculos de sol, e sombras naturais (coberturas de árvores) ou artificiais (guarda-sóis, tendas e coberturas de edifícios).
Use equipamentos de proteção individual se for um profissional que se expõe ao sol durante o trabalho.
Realize o autoexame da pele e faça acompanhamento com dermatologista.