Qual é a relação entre uso de anticoncepcional e trombose? Entenda

A pílula anticoncepcional foi aprovada para comercialização em 1960, nos Estados Unidos, e rapidamente se espalhou pelo mundo —no Brasil, chegou às farmácias em 1962. Desde então, uma série de pesquisas têm evidenciado a sua associação com maior risco de trombose e gerado muitas dúvidas: Por que exatamente isso acontece? Todos os tipos de pílulas podem causar essa condição, inclusive as mais modernas? Quem sofre mais risco?

Ao longo desta reportagem vamos responder essas e outras questões. Mas, antes de mais nada, é preciso deixar claro que não é preciso entrar em pânico. Os médicos consultados por VivaBem foram unânimes em afirmar que, apesar da possibilidade de formação de coágulos sanguíneos, o medicamento é considerado segura quando prescrito de forma correta.

Todos nós temos risco de trombose, isso é inerente ao ser humano. Nas mulheres que fazem uso de anticoncepcional hormonal com estrogênio, principalmente o etinilestradiol, o risco aumenta de duas a quatro vezes na comparação com aquelas que não utilizam o método. Silvio Franceschini, ginecologista e professor da FMRP (Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto) da USP

Embora os números pareçam alarmantes, o médico ressalta que eles devem ser interpretados com cautela. "As pessoas podem falar 'Nossa, isso é muito', mas, na verdade, os casos de trombose por causa da pílula, especialmente em mulheres jovens, são baixos, por isso ela é liberada. E, só para fazer uma comparação, na gravidez e no pós-parto, o risco é bem maior: 20 vezes."

Tipos de pílulas

Existem no país dois tipos de pílulas orais anticoncepcionais:

a combinada, que contêm dois hormônios sintéticos, o estrogênio associado ao progestagênio, e é a mais prescrita pelos profissionais de saúde;

e a isolada, produzida apenas com progestagênio.

A que oferece risco aumentado para trombose é a primeira, mesmo as opções mais modernas, que utilizam doses menores de hormônios e hormônios mais adequados e de melhor qualidade.

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A Anvisa aprovou em junho deste ano uma nova droga combinada, que promete ser mais segura. Contudo, Venina Barros, presidente da Comissão Nacional Especializada de Trombose e Hemorragia na Mulher da Febrasgo (Federação Brasileira das Associações de Ginecologia e Obstetrícia), afirma que ainda é preciso cuidado.

"Essa pílula anticoncepcional, que traz na sua composição estetrol [estrogênio natural produzido pelo fígado fetal humano durante a gravidez] combinado com o progestagênico drospirenona, chegou com este marketing, porque nos estudos para aprovação nas agências reguladoras o índice de trombose foi muito pequeno, quase zero. Mas agora precisamos esperar que milhões de mulheres a utilizem para termos a realidade de mercado. Com drogas novas, temos de ter bom senso", observa a médica.

Franceschini complementa que mesmo o estetrol sendo um estrogênio natural continua sendo estrogênio, por isso não dá para cravar que não haja risco para trombose e, também por isso, os critérios de elegibilidade para uso de métodos anticoncepcionais, que são definidos pelo conjunto de características apresentadas pela paciente, não deverão ser alterados.

"O que podemos afirmar é que a pílula que tem só progestagênio tem menor risco de desenvolver coágulos do que qualquer uma que tem estrogênio e progestagênio", destaca o médico.

Por que a pílula com estrogênio pode causar trombose?

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Imagem: iStock

Os anticoncepcionais orais com estrogênio na composição podem causar trombose porque, quando esse hormônio passa pelo fígado, ele estimula substâncias que favorecem a coagulação e que podem aumentar a viscosidade do sangue.

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"Mas é preciso deixar claro que essa interferência com o metabolismo do fígado tem melhorado com os anos, já que as pílulas passaram a ter menores quantidades de hormônios e tanto estrogênio quanto progesterona de melhor qualidade", pontua Barros, da Febrasgo.

Ela destaca que o risco para a formação de trombos nas veias é maior no primeiro ano de uso do medicamento. Depois, com a continuidade, a droga gera uma adaptação e, caso a mulher não tenha desenvolvido a condição nos 12 meses iniciais, a probabilidade de isso acontecer posteriormente cai para quase zero.

Fatores de risco para trombose

A trombose ocorre quando há a formação de um coágulo sanguíneo (ou trombo) no organismo, obstruindo a passagem do sangue.

Em relação às pílulas anticoncepcionais, o tipo mais comum de ocorrer é a trombose venosa profunda, que acomete as veias, sobretudo as da perna esquerda —isso por uma questão anatômica do ser humano.

Como já explicado nesta reportagem, é baixo o número de mulheres que usam a droga e apresentam essa condição.

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Mas é importante salientar que há fatores de risco associados, sendo os principais idade (acima de 35 anos), sobrepeso e obesidade, sedentarismo, tabagismo, histórico de trombose na família e presença de determinadas doenças, como as inflamatórias, as do coração e hipertensão arterial.

"O risco também é maior em pessoas que têm trombofilia, uma condição hereditária ou adquirida que leva a alterações nos mecanismos de coagulação", diz Agostinho Machado, ginecologista e obstetra do HC-UFPE (Hospital das Clínicas da Universidade Federal de Pernambuco) e vice-presidente da Sogope (Associação dos Ginecologistas e Obstetras de Pernambuco).

Diante disso, o especialista afirma que é fundamental que os médicos deem todas essas informações para as pacientes durante as consultas.

Eles também devem conhecer o seu histórico de saúde e entender o seu estilo de vida para, só então, determinar qual o anticoncepcional oral ideal para cada uma.

No caso das que têm mais risco de ter trombose ou das que não se sentem seguras com o uso das pílulas hormonais, Machado indica outros métodos, em especial implante subcutâneo e DIU (dispositivo intrauterino) de cobre ou cobre e prata.

"É importante que as mulheres saibam que existem opções, muitas vezes até mais eficientes e, além disso, com a vantagem de que não precisam ser lembradas de tomar", destaca ele. "É necessário que paciente e médico trabalhem sempre juntos para escolher a melhor. E, independentemente do que for escolhido, que haja um acompanhamento regular para minimizar qualquer risco."

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Trombose é condição perigosa

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Imagem: iStock

A trombose venosa profunda é uma condição perigosa, pois os coágulos ou trombos podem se desprender e seguir na corrente sanguínea até chegar ao pulmão, causando uma embolia pulmonar —muitas vezes fatal.

Um ponto importante para evitar complicações é conhecer não apenas os fatores de risco, mas, também os sintomas. São eles:

  • dor
  • vermelhidão
  • alteração na temperatura (calor) e inchaço na área afetada

Se acometer as pernas, a pessoa ainda pode apresentar dificuldade para andar.

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Em se tratando da embolia pulmonar, os sinais clínicos são:

  • dor no peito
  • falta de ar
  • em alguns casos, tossir sangue

A prevenção da trombose venosa profunda envolve a adoção de um estilo de vida saudável, o que significa não fumar, controlar o peso, praticar exercícios físicos e ter uma alimentação balanceada.

Quando o tratamento é necessário —para evitar a formação dos trombos ou promover a sua dissolução—, ele é feito com o uso de anticoagulantes e deve ser iniciado o quanto antes. Em determinadas situações, também pode ser recomendado cirurgia para remoção dos coágulos.

Errata:

o conteúdo foi alterado

  • Trecho do texto que falava em trombose arterial profunda, na verdade, é trombose venosa. A informação foi corrigida.

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