'Fui ao oftalmo e tive alta uma semana depois com cirurgia no cérebro'
A estudante Iara Chrestan Souza, de 24 anos, já tinha se acostumado com uma crise de enxaqueca que não passava nunca. A dor até aliviava, mas não ia embora. Quando começou a ter a visão afetada, ela decidiu buscar um oftalmologista.
Na consulta, a médica identificou um tumor no seu cérebro e a encaminhou para um neurologista. Em menos de uma semana, ela passou por cirurgia.
A VivaBem, a jovem de Campinas (SP) conta sua história.
'Efeito passava, dor voltava'
"Em maio, eu trabalhava como vendedora e comecei a ter muitas crises de enxaqueca. Todos os dias eu sentia muita dor, acordava e ia dormir assim. Até passei por alguns médicos na época, e eles só receitavam remédios e davam atestados.
Quando eu pedi demissão, fui atrás de fazer um check-up com um clínico geral. Fiz vários exames e não deu alteração em nada, estava tudo ótimo. Eu estava tomando remédio para enxaqueca e a médica me receitou um que era um pouco mais forte. Melhorou, mas não fiquei 100% ainda.
Quando o efeito passava, a crise voltava. Um tempo depois, já em agosto, toda vez que eu levantava da cama eu perdia a visão do olho direito e parte do esquerdo. Eu estava com os olhos abertos, mas ficava tudo preto e me dava tontura.
Tinha que me segurar e esperar passar para eu continuar a fazer minhas atividades. Isso também acontecia quando eu mexia a cabeça muito forte. Fiquei assim, com dor de cabeça e esses apagões por mais ou menos um mês, até que decidi marcar uma consulta com um oftalmologista.
'Doutora, você está me assustando'
No dia 5 de outubro, fui à clínica para a consulta. A médica me colocou em uma máquina para ver o fundo do olho e se assustou. Eu até falei: 'Doutora, você está me assustando'. Ela explicou que tinha um inchaço atrás do meu olho direito, que iria me encaminhar para um hospital público da cidade e que meu caso poderia ser urgente.
Ela disse que não podia me dar nenhum diagnóstico ali porque eu deveria passar com um neurologista. Saí de lá direto para o hospital. Passei pelo clínico geral, que entrou em contato com um neuro, e me pediram uma tomografia.
Naquele dia, não tinha neuro de plantão. Então, eu deveria fazer o exame, ficar internada e passar com o especialista no dia seguinte. Fiz uma primeira tomografia e, depois, a enfermeira me avisou que eu teria que fazer outra, agora com contraste.
Foi nessa hora que pensei que poderia ser algo mais sério. Como eu estava fisicamente bem, quis voltar para a casa e prometi que voltaria para a consulta na sexta-feira. Nessas horas que fiquei em casa, minha irmã mandou as fotos dos meus exames para uma amiga dela que é neuro, e ela disse que eu estava com um tumor empurrando meu cérebro e olho.
Segundo ela, eu tinha que operar o mais rápido possível. Foi um choque. Eu estava bem e, de uma hora para a outra, descobri um tumor na cabeça. No dia seguinte, já no hospital de novo, a médica confirmou tudo o que a gente já sabia: era um tumor e eu precisava operar com urgência.
Como naquele hospital que eu estava não tinha neurocirurgião, fui transferida de ambulância para um outro, também em Campinas. Assim que cheguei já conversei com a especialista e ela explicou que teria que fazer uma ressonância magnética.
'Foi tudo muito rápido'
No domingo à noite, o enfermeiro falou que eu deveria ficar em jejum porque a cirurgia seria no dia seguinte de manhã. Mandei mensagem no grupo da família e meus parentes foram ficar comigo. Eles foram responsáveis por eu ter calma, porque foi tudo muito rápido.
Para mim, foi tudo tão rápido: em quatro dias, fui para uma consulta de rotina e agora estava me preparando para uma cirurgia. Um padre, amigo da família, foi ao hospital e fez uma oração. Isso me acalmou bastante, porque eu estava chorando muito.
@_iarach1/3 O dia que fui em uma consulta no oftalmologista e sai com uma cirurgia na cabeça! *voz alterada por aceleração do vídeo
? som original - Iara Chrestan
Lembro de entrar na sala de cirurgia e apagar com a anestesia. Acordei na UTI bem grogue, e vi minha mãe e minha irmã. Não consigo lembrar muito bem. Fiquei lá até quarta, depois fui para o quarto e na quinta-feira tive alta.
Minha mãe me contou que, antes da cirurgia, um médico conversou com ela sobre possíveis complicações. Eu poderia ficar cega, perder movimentos do corpo e até morrer. Quando soube disso, me deu um choque. Entrei na cirurgia achando que era algo muito mais simples.
Que bom que eu só soube disso depois, porque antes eu ficaria emocionalmente pior.
Eu não tinha noção de como seria a cirurgia, não sabia que iriam raspar meu cabelo — ele é responsável por boa parte da minha autoestima e isso mexeu muito comigo.
Eu sei que vai crescer, que o importante é eu estar aqui, viva, sem sequelas. Mas é uma coisa que não tem como passar sem ir para o psicológico. Passei muito tempo deitada, tomando remédios, e precisei de fisioterapia para andar de novo.
'Tumor do tamanho de uma laranja'
Agora estou conseguindo andar quase 100%, só às vezes me dá tontura ou eu tropeço. Do lado que foi a cirurgia, perto do olho, eu sinto que está um pouco mais fundo. Mas é normal, porque atrofia o músculo. Com o tempo vai voltando.
Os médicos falam que eu estou tendo uma recuperação muito boa. No começo, eu não conseguia tocar na cicatriz e não me via sem o curativo. Minha mãe e minhas irmãs que me ajudavam a lavar e trocar o curativo.
A primeira vez que me vi com a cabeça raspada foi um choque muito grande, me dava crise de choro toda vez que me olhava no espelho. Passavam muitas coisas na minha cabeça, porque mudou minha vida. Eu tenho uma vida antes da cirurgia e outra depois. Agora, estou muito melhor comigo mesma, já consigo falar sobre isso nas redes sociais e postar fotos.
Meu tumor era do tamanho de uma laranja, em formato oval. Ele é benigno, mas é considerado grau 2, o que significa que ele pode voltar. Passei com o oncologista e vou fazer radioterapia por precaução, para que ele não cresça de novo.
Ainda estou apreensiva, tentando raciocinar tudo. Eu não estou trabalhando, pensava em voltar no ano que vem, mas agora preciso esperar. Não sei se o tratamento vai me deixar impossibilitada por um período, se terei reações. Estou vivendo um dia de cada vez e pensando no agora.
Tem dias que estou muito bem, outros nem tanto. Foi a primeira vez que fiquei internada, primeira vez que fiz uma cirurgia. E tudo aconteceu em exatamente uma semana: fui à consulta com o oftalmo em uma quinta, na quinta seguinte tive alta da cirurgia. Quero começar a fazer terapia para lidar com isso."
Médico explica tumor
Tumor de Iara se chama meningioma (porque atinge a meninge), e é classificado como grau 2. Isso significa que, apesar de não ser maligno, ele exige maiores cuidados do que tumor grau 1.
Em geral, tumores benignos são grau 1. O grau 2 pode ter um comportamento mais agressivo, por isso temos que encaminhar para oncologia para tratamento.
Michel Figueiredo, médico residente da neurocirurgia da PUC-Campinas, um dos responsáveis pelo caso da Iara
Meningiomas podem atingir qualquer pessoa, mas podem ser mais comuns em mulheres. Michel Figueiredo explica que alguns tumores deste tipo têm receptores de hormônios como estrogênio e progesterona - o que pode justificar essa maior incidência.
Tratamento multidisciplinar. Iara vai fazer radioterapia e terá acompanhamento com a neurocirurgia e oncologia ao longo dos próximos meses. A resposta do organismo dela que vai definir os próximos passos do tratamento.
Ela vai fazer outra ressonância e vamos acompanhar. O tempo de acompanhamento muda dependendo da localização do tumor e varia de paciente para paciente.
Michel Figueiredo, médico residente da neurocirurgia da PUC-Campinas, um dos responsáveis pelo caso da Iara
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