'Não conseguia fazer nada': veja relação entre dor nas costas e depressão
Um dia, enquanto faxinava a casa, Mariana Pinho, 58, de São Paulo, sentiu uma forte dor no final das costas. Por achar que era apenas um mau jeito, tomou um analgésico e aguardou melhorar. No entanto, a dor não passou e se tornou cada vez mais intensa. Foi quando Mariana decidiu procurar um ortopedista e descobriu, em 2016, que tinha uma hérnia de disco lombar.
Num primeiro momento tratei com fisioterapia e medicamentos para dor, mas não resolveu e minha qualidade de vida decaiu muito. Sentia dores 24 horas e não conseguia fazer quase nada. Com o desespero somado aos sentimentos de inutilidade e falta de esperança, perdi o interesse pelo que gostava, me isolei e comecei a ter pensamentos de morte. Mariana Pinho
Ortopedista e especialista em coluna pelo Hospital Albert Einstein (SP), Alberto Gotfryd explica que as dores crônicas, em especial na região lombar (lombalgia), geram sintomas depressivos e ansiosos e até propriamente transtornos, além de atrapalharem diversas atividades cotidianas.
"[As dores] afetam humor, concentração, interação social, sono, disposição para produzir", diz o médico. São sinais que, ao surgirem, merecem investigação, mas que, por falta de tempo e conhecimento, o paulistano Carlos Vanucci, 69, negligenciou. Em 2010, ele achava estar apenas em uma fase difícil e que iria passar. Mas isso não só não ocorreu como agravou e afetou seu corpo e sua qualidade de vida. Carlos não procurou ajuda médica e desenvolveu dores constantes na coluna e pescoço.
Sofri três anos com isso, até que um dia tive uma crise tão forte que me impediu de trabalhar. Fazia exames, mas não acusava nada de tão significativo que pudesse me causar dores naquela proporção toda. Carlos Vanucci
Depois de passar por vários especialistas, testar diferentes remédios, ele então recebeu o diagnóstico de que a causa de seu sofrimento era a depressão.
Luiz Scocca, psiquiatra pelo HC-FMUSP (Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo), informa que esse tipo de situação experimentada por Carlos é bastante recorrente. "As pessoas não correlacionam, mas dor nas costas é um sintoma muito comum de depressão, sobretudo a grave, por ser uma doença inflamatória e que pode atingir não apenas ossos e músculos, como o sistema gastrointestinal e a imunidade", diz o médico.
Círculo vicioso e de incertezas
Nem todo mundo tem uma dor nas costas que pode se tornar um fator de risco para depressão, ou depressão que pode ser uma das causas de dor nas costas. Mas, além de ser possível, há quem ainda tenha as duas condições simultaneamente e, para piorar, uma retroalimentando a outra, causando limitações físicas, emocionais e sociais e a adoção de hábitos prejudiciais à saúde.
Isso mostra o quanto a dor sentida pelo paciente pode ter origem complexa e multifatorial. Quando as duas condições coexistem, igualmente os sintomas se tornam mais sérios e a intensidade da dor pode ser desproporcional, mesmo na ausência de uma lesão perceptível. Fora que o prejuízo de ambas na qualidade do sono também pode agravar a dor, ocorrendo assim um ciclo. Lucas Alves Pereira, psiquiatra do Hospital Português, em Salvador
Pereira continua que sobrepeso ou obesidade e sedentarismo igualmente são fatores de risco para lesões ortopédicas e síndromes psiquiátricas, sendo muitas vezes difícil estabelecer qual é o mais importante para a origem da dor. Além disso, falta de ânimo ou desistência para praticar atividades físicas mais o excesso de tensão e ansiedade fazem as complicações aumentarem, predispondo enfraquecimento, redução motora, osteoporose, artrite, tudo o que provoca dor.
Na dúvida, a revisão é geral
Carlos somente conseguiu dar fim às suas dores após ter consultado um psiquiatra e feito uma revisão de hábitos, enquanto Mariana precisou de cirurgia na coluna e meses de fisioterapia e psicoterapia para se sentir melhor. "Sem tratar meu emocional e psicológico, os sintomas poderiam persistir e eu teria que usar remédios com risco de dependência", relata ela, em conformidade com os médicos, que citam os opioides, anti-inflamatórios e antidepressivos.
"Muitas vezes, tratamos os problemas de forma conjunta e interdisciplinar, entre ortopedista, psiquiatra, psicólogo, reumatologista, especialista em dor crônica, fisioterapeuta e envolvendo várias medidas, comportamentais, medicamentosas, posturais, alimentares, aliadas à prática de exercícios regulares, pois geram bem-estar e melhoram dores ortopédicas e psíquicas", informa Gotfryd.
Além disso, algumas medidas podem ajudar a prevenir ou aliviar os sintomas de dor nas costas, como realizar atividades relaxantes (meditação, ioga, massagem) e se divertir nas horas livres; evitar o consumo de álcool e cigarro; no trabalho, ajustar a ergonomia de sua cadeira, fazer pausas frequentes e se movimentar, levantando-se a cada meia hora e se alongando. Em casa, se seu sofá e colchão estiverem deformados e com afundamentos, devem ser trocados logo.
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