Influenciador relembra depressão e pânico em livro: 'Sentia medo de morrer'
Foi na pior fase da vida que o influenciador Gustavo Tubarão, 24, começou a gravar vídeos para as redes sociais. Eles serviam como fuga das crises de ansiedade e dos ataques de pânico intensos que o fizeram ficar preso no quarto por dois anos.
"Tinha medo de sair para qualquer lugar e alguém me matar. Até de ir na cozinha tomar água. Parecia que eu estava sem alma, é o pior sentimento do mundo", contou em entrevista ao VivaBem. Gustavo narra esse e outros momentos no livro "O Trem Tá Feio: Como me Curei da Depressão" (Editora Citadel), lançado em janeiro.
O influenciador tem mais de 20 milhões de seguidores e faz sucesso mostrando o dia a dia em Cana Verde, município do interior de Minas Gerais com 5 mil habitantes.
Contar a sua história e escrever sobre saúde mental eram desejos antigos. "Quando estava vivendo essa loucura de pensamentos, eu falava para a minha mãe que ia escrever um livro sobre tudo, e ela sem entender, porque eu nunca fui muito estudioso, inteligente para escrever um livro", diz.
Depressão
Gustavo foi diagnosticado com depressão aos 17 anos, após um forte ataque de pânico, em que acreditou estar morrendo. "Não conseguia respirar, meu corpo inteiro formigou, os músculos atrofiaram. Não conseguia pensar e tudo foi ficando escuro. Minha garganta ficou muito seca e eu não conseguia engolir", recorda.
Na época, ele lidava com o luto após a morte de um amigo e com incertezas comuns no fim da adolescência: qual curso escolher na faculdade? Serei feliz na profissão? Tudo se intensificava porque queria fazer teatro, mas não tinha apoio dos pais. "A família pensava que eu ia passar fome, porque uma irmã minha é advogada, e a outra fazia faculdade federal. Eu meio que era o mais burrinho da família, por não gostar de estudar mesmo", diz.
Após o ataque de pânico, Gustavo entrou em um sofrimento intenso. Tinha muito medo de que crises iguais ou piores acontecessem, o que desencadeava ansiedade e pânico. Isso o deixou recluso. "Foram praticamente dois anos trancado no quarto e, no começo, tendo quatro, cinco crises por dia."
Não tinha mais vontade de fazer nada e só sentia medo de morrer. Gustavo Tubarão
"Mãe, estou delirando"
Gustavo soube nomear o que sentia aos 17 anos, depois de aprender o que era depressão, ansiedade e pânico. Então, percebeu que convivia com alguns desses sentimentos desde a infância. "Eu parei de dormir com a minha mãe aos 12 anos e isso é muito retrato de como foi a minha infância, sofri alguns traumas", conta.
Quando ele tinha 4 anos, os pais moraram em São Paulo por seis meses, para acompanhar o tratamento de um das filhas, que precisou operar o coração após um problema grave. "Eu fiquei com a minha avó e descobri na terapia que achava ter sido rejeitado pelos meus pais por causa disso, mas não fui. Só que entrou na cabecinha de criança e a partir disso foi desencadeando algumas sensações", explica.
Com 5, 6 anos, lembro de falar direitinho: 'Mãe, estou delirando'. E ela não entendia. Até uns 15 anos me dava algo que eu esquecia onde estava, meu nome, um delírio mesmo. Acho que eram ataques de pânico.
Volta à vida
Após o diagnóstico de depressão, Gustavo teve acompanhamento psiquiátrico e fazia terapia. No início, eram cinco sessões na semana, de segunda a sexta. Depois de um ano, os encontros passaram para três vezes, até chegarem em duas. Aos poucos, ele criou segurança para sair de casa. Se os sintomas da crise surgissem, ele voltava.
Como distração para os momentos recluso, Gustavo buscava dicas na internet para gravar e editar vídeos, e isso virou um hobby. "Sempre quis fazer, mas nunca tinha coragem por medo da zoação. Virou meio que uma terapiazinha", diz.
Depois de dois anos, mais seguro, ele começou a cursar direito —por pressão da família. "Até consegui entrar na faculdade, mas meu pai tinha que me buscar quando dava ataque [de pânico]", comenta.
Sem motivação no curso, a rotina ficou pesada. Após um ano e meio, ele criou coragem para falar aos pais que deixaria a faculdade. "Eu estava meio que em um estado muito ruim e fazer algo que não gostava piorava", explica.
O momento coincidiu com o início do sucesso na internet, incentivo que precisava para se dedicar ao teatro e às redes sociais. Os pais, no entanto, tinham receios naturais por não entenderem como isso viraria uma profissão.
"A preocupação deles não era para o lado mal, mas o de medo, porque na minha região ninguém nunca viveu de internet. Eu fui muito ousado de não escutar as pessoas e seguir o meu sonho. Graças a Deus, hoje eu dou muito orgulho para os meus pais e pude mudar o pensamento deles", comemora.
O teatro mudou a minha vida, minha percepção. Abriu a minha cabeça, porque vim de um interior de 5 mil habitantes, onde eu não cruzava nem a perna, achando que era errado homem fazer isso. Foi muito terapêutico.
"Pré-overdose" e borderline
No livro, Gustavo narra o uso de drogas durante a adolescência. Ele começou a fumar maconha aos 13, usar ecstasy aos 15 e cheirar cocaína aos 16. A última vez que usou qualquer uma delas foi em 2017, quando teve uma crise intensa, que define como "pré-overdose", causada pelo excesso das substâncias. Isso aconteceu meses antes do ataque de pânico que o levou à depressão.
Eu usei, em menos de 24 horas, seis balas [ecstasy], cheirei pó de hora em hora e bebida alcoólica.
Gustavo estava em uma festa e, sem querer ir embora ao final, procurou outro evento com um amigo. "Estávamos muito drogados e aí tomamos outro LSD. Passou 15 minutos, não fez efeito, óbvio, porque demora mais. Mas tomamos mais um", explica. "Não tinha mais festa na cidade, porque era uma segunda-feira de manhã. Fomos para a kitnet do meu amigo e começou a bater [o efeito da droga], lá era um lugar muito apertado e me deu um ataque de pânico."
A crise foi tão forte que, em desespero, Gustavo pensou em se jogar da sacada, mas foi impedido pelo amigo.
Comecei a orar, jogar drogas pela janela e dizer: 'Deus, se eu sobreviver aqui hoje, eu prometo nunca mais usar droga na vida'. Meu corpo ia parando, mas a minha mente ainda estava acelerada, eu desmaiava e voltava. A pior sensação da minha vida.
Gustavo diz não saber por que começou a usar drogas, mas crê que a compulsão associada ao transtorno de personalidade borderline, que descobriu no ano passado, ajudam a explicar o comportamento. "Se eu não tivesse usado droga na minha adolescência, e eu não me orgulho disso, tenho certeza que eu ia usar hoje por causa da minha compulsão." O borderline é caracterizado pela hipersensibilidade nas relações e um medo intenso de abandono.
"Hoje eu tenha medo de droga, pavor. Pode ser que você não vicie na droga, mas ela tem um poder grande de acabar com o seu emocional. É um pico muito grande de felicidade e, no outro dia, um pico muito grande de tristeza. Droga é droga mesmo", diz.
"Fazer uma limpa" nas emoções
Buscar conhecimento e encontrar o que lhe desse motivação foram essenciais para Gustavo se fortalecer e ficar bem. Crises aparecem, não tão frequentes quanto antes, mas agora ele tem recursos para lidar com elas. Informações confiáveis, de quem estuda saúde mental, inclusive, deram a paz para ele entender que um ataque de pânico tem tempo limitado —e dura de 15 a 30 minutos, em média.
Antigamente, eu tinha certeza absoluta que eu ia morrer [durante um ataque de pânico]. Eu acho que podia vir Jesus Cristo e dizer que não, mas eu ia pensar o contrário. Com conhecimento, você ainda tem a certeza de que vai morrer, mas existe uma luz no fim do túnel.
Mesmo após revisitar a sua história, o influenciador tem dificuldade em explicar o que sentiu. "Nem dá para pôr em palavras o tanto que era ruim, um vazio, a sensação de morte." Escrever o livro foi como "fazer uma limpa" nas emoções, conta. Seu desejo agora é se manter bem para ajudar pessoas em situações parecidas.
Tiveram crises em que eu chorava em posição fetal e falava: 'Deus, se eu sair disso, eu vou tentar ajudar o máximo de pessoas que eu conseguir'. Eu não desejo isso nem para o pior inimigo. A pessoa pode ser má o quanto quiser comigo, mas eu não desejo para ela 30 segundos numa crise de pânico, porque é desumano.
Procure ajuda
Caso você tenha pensamentos suicidas, procure ajuda especializada como o CVV (www.cvv.org.br) e os Caps (Centros de Atenção Psicossocial) da sua cidade. O CVV funciona 24 horas por dia (inclusive aos feriados) pelo telefone 188, e também atende por e-mail, chat e pessoalmente. São mais de 120 postos de atendimento em todo o Brasil.
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