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Como é dispositivo implantado no cérebro que trata TOC, já usado no Brasil

Paciente no centro cirúrgico para receber o implante cerebral que trata o TOC Imagem: Arquivo pessoal/Wuilker Knoner Campos.

De VivaBem, em São Paulo (SP)

08/02/2024 04h00

Viver em um quarto escuro acreditando estar sendo perseguido o tempo todo. Essa era a condição do paciente que recebeu um implante cerebral que trata o transtorno obsessivo-compulsivo, ou TOC, como é mais conhecido, no Brasil. O procedimento foi realizado no dia 27 de dezembro 2023, no Hospital SOS Cárdio, em Florianópolis (SC).

O TOC faz o paciente ter padrões de pensamentos, imagens e impulsos contra a sua vontade. Ele causa sofrimento na vida cotidiana e, em alguns casos, o afastamento do convívio social.

Mas o novo tratamento, chamado de DBS (Deep Brain Stimulation, ou estimulação cerebral profunda), funciona como um "freio" capaz de ajudar a interromper esses padrões de pensamentos por meio de eletroestimulação nas áreas do cérebro responsáveis por eles.

"A escolha de um paciente para o implante de DBS no tratamento do TOC foi baseada no diagnóstico de TOC grave e crônico que não obteve sucesso com tratamentos convencionais, como medicamentos, terapia e eletroconvulsoterapia (ECT)", conta o neurocirurgião Wuilker Knoner Campos, que aplicou o implante.

Neste caso, o paciente tinha pensamentos obsessivos de perseguição que levam ao sofrimento, medo e ansiedade extrema. Wuilker Knoner Campos, neurocirurgião

Como funciona o implante?

Campos explica que o implante envolve a inserção de eletrodos muito finos em áreas específicas do cérebro que estão associadas aos sintomas do TOC. Esses eletrodos emitem pulsos elétricos controlados que ajudam a normalizar a atividade neural disfuncional relacionada ao transtorno, aliviando os sintomas.

Área que recebe os eletrodos responsáveis pelo eletroestimulação que trata os padrões de pensamentos característicos do TOC Imagem: Arquivo pessoal/Wuilker Knoner Campos.

Na prática, é feita uma abertura no crânio do tamanho de uma moeda para passar os eletrodos, que vão cruzar todos os cortes até o alvo final.

Essa programação cirúrgica do trajeto do eletrodo e o alvo é feita por meio de softwares avançados de reconstruções de imagem baseados na ressonância craniana do paciente. O alvo é atingido graças aos cálculos de GPS de coordenadas cartesianas (X, Y, Z), aquela mesma que aprendemos no 2º grau, porém com ajuda de computação gráfica e aparelhos. Wuilker Knoner Campos, neurocirurgião

O neurocirurgião afirma que o tempo médio de cirurgia é cerca de 4 horas. "O paciente entra no centro cirúrgico para colocação de um arco que se fixa no crânio, com sedação e anestesia local. Depois segue para tomografia computadorizada do crânio. Depois da tomografia, puxa-se as imagens do sistema e fazemos a fusão das imagem com a ressonância do paciente", diz.

Para quem é indicado o implante que trata o TOC?

O cirurgião explica que normalmente a indicação vem da equipe de psiquiatria, recomendando casos em que o tratamento clínico medicamentoso, a terapia e a ECT (eletroconvulsoterapia) falham.

O avanço da medicina é essencial, sobretudo para tratar casos mais complicados. De acordo com o psiquiatra Flávio Henrique UFPI, membro do CPAH (Centro de Pesquisa e Análises Heráclito), existem sintomas do transtorno que podem acometer o autocontrole e gerar riscos.

"Pode ser perigoso, uma vez que pessoas com TOC também podem ter pensamentos intrusivos relacionados a temas sexuais, religiosos ou violentos", afirma o psiquiatra.

Como é o pós-implante? É preciso usar a vida toda?

O TOC não tem cura e precisa ser tratado por toda a vida do paciente. "Assim como alguém com diabetes que precisa da insulina", diz Campos. "No pós-operatório, o paciente segue com equipe de psiquiatria que faz os ajustes junto com equipe técnica do aparelho, através de um tablet que se comunica por bluetooth."

Equipe cirúrgica anestesia paciente para recebimento do implante que trata o TOC Imagem: Arquivo pessoal/Wuilker Knoner Campos

"É feita uma programação no computador e enviada ao aparelho do paciente. Os eletrodos colocados no cérebro se comunicam por cabos com uma bateria (gerador) que fica implantada abaixo da pele no tórax, exatamente igual ao do marca-passo cardíaco, por isso é conhecido também por marca-passo cerebral", continua Campos.

A vida útil desse gerador torácico, que também é implantado no momento da cirurgia, é de cinco a dez anos. Após esse período, é preciso realizar a troca, mas com um procedimento menos invasivo, sem necessidade de novas incisões na cabeça, em que se usa apenas anestesia local e sedação.

Qual o valor? É possível fazer no SUS?

De acordo com Campos, o procedimento custa em média R$ 100 mil, mas o valor é cobrado dos planos de saúde. Tanto na rede privada quanto no SUS, o procedimento de DBS já é realizado, mas para doenças como Parkinson, distonias e epilepsia.

"Neste momento, a indicação para doenças psiquiátricas deverá passar por uma avaliação técnica das equipes de ATS (Avaliação de Tecnologias em Saúde) no Conitec, para o SUS, e na ANS, para planos de saúde", explica o neurocirurgião.

TOC também pode ser tratado com psicoterapia?

Além dos tratamentos medicamentosos, a intervenção com psicoterapia tende a ser uma alternativa geralmente usada nas primeiras abordagens, antes mesmo de recorrer ao uso de fármacos.

"A intervenção é pela via comportamental, onde realizamos técnicas, como a exposição com prevenção de resposta, cujo objetivo é encorajar o paciente a enfrentar seus medos e a diminuir gradualmente seus rituais compulsivos", explica o psicólogo Luís Fernando Zambom, mestre em psicologia clínica pela PUCRS e professor da Famaqui (Faculdade Mário Quintana).

Zambom explica que há um relativo sucesso nos processos terapêuticos, mas lembra que não há cura.

"Há um medidor de sucesso terapêutico, que auxilia o paciente a entender e compreender seus pensamentos obsessivos, e assim diminuir os rituais que acabam gerando ultraje, desconforto, vergonha e evitação social aos que sofrem dessa condição psicológica", afirma o psicólogo.

Errata: este conteúdo foi atualizado
Diferentemente do informado anteriormente, o implante de eletroestimulação já foi usado em recomendações específicas e limitadas em outras instituições, não sendo este retratado em reportagem o primeiro feito no Brasil.

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