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O que acontece no seu corpo quando você toma remédio vencido

Imagem: iStock

Cristina Almeida

Colaboração para VivaBem

20/02/2024 04h05

Boa parte das pessoas possui uma farmácia caseira que é sempre útil na hora de fazer um curativo e até mesmo domar a dor de cabeça. Porém, na pressa de resolver esses incômodos, um detalhe importante pode ser ignorado: o prazo de validade do medicamento.

Vencido é todo remédio que ultrapassou o espaço de tempo no qual exerce seu potencial máximo de ação terapêutica com o mínimo de reações adversas.

Isso significa que, até a data indicada na embalagem, o fabricante garante as suas características químicas, físicas e farmacológicas. Mas atenção: essa garantia só vale se você seguir corretamente as instruções de conservação do produto contidas na bula.

A cada ano, 50 mil crianças são admitidas no pronto-socorro por causas relacionadas ao uso de medicamentos sem a supervisão de um adulto. Dados dos EUA.

Em 2021, mais de 3.000 pontos de coleta de medicamentos vencidos e não vencidos foram implantados no Brasil. 53 toneladas de remédios deixaram de ser descartadas de forma inadequada.

Como seu organismo reage?

As especialistas consultadas afirmam que é sempre arriscado tomar um medicamento vencido porque não é possível saber qual seria o efeito para a pessoa que o utiliza, sobretudo entre aquelas que possuem doenças crônicas e fazem uso contínuo de outros remédios.

Outra coisa a se pensar é que descuidar do prazo de validade das medicações resulta no aumento de demandas pelos serviços de saúde, além de prejuízos econômicos para os já limitados recursos financeiros do sistema de saúde.

Confira as possíveis consequências no seu corpo dessa prática:

  • Intoxicação
  • Resistência bacteriana

O remédio pode virar veneno

Embora nem a embalagem e nem o medicamento possam não apresentar sinais físicos de deterioração, alguns componentes de sua fórmula podem ter se degradado ou estar em processo de degradação.

Nessas situações, uma substância química que antes tinha efeito terapêutico, pode se transformar em tóxica.

Entre os medicamentos de uso oral os efeitos são imprevisíveis. No entanto, náuseas, vômitos, lesões gástricas (e até úlceras) podem sinalizar um quadro de intoxicação.

Mais raramente, pessoas alérgicas a determinado ingrediente da fórmula podem ter um choque anafilático.

Ao se dar conta de que algum sintoma diferente apareceu após ter tomado um remédio vencido, procure o pronto-socorro. Leve consigo a embalagem do medicamento para que o profissional possa identificar as possíveis causas do mal-estar.

Os microrganismos podem "crescer"

Uma das maiores preocupações dos profissionais da área da saúde é o mau uso ou o uso abusivo de antibióticos. A razão para isso é a resistência bacteriana, ou seja, esses medicamentos deixam de fazer efeito quando eles são realmente necessários.

Tomar um antibiótico vencido pode impedir a eliminação total de uma infecção. Ela progride e as bactérias ficam mais resistentes ao remédio.

Alguns antibióticos são comercializados no formato em pó (liofilizado), que é reconstituído com água após aberto.

Essa suspensão oral se mantém estável por até 14 dias —desde que conservada na forma indicada pelo fabricante. Isso significa que o prazo indicado na caixa deve ser desconsiderado, e o reuso do antibiótico pode ter consequências indesejadas.

Uma vez finalizado o tratamento com esse tipo de medicação, o melhor a ser feito é o descarte adequado do medicamento.

Saiba como se calcula a data de validade

Imagem: iStock

A Anvisa estabelece por lei as boas práticas da fabricação de medicamentos. Uma delas é a realização de estudos de estabilidade, cujos resultados devem ser apresentados pelos laboratórios já no momento do registro do remédio.

Esses testes são feitos em laboratório e visam expor o remédio e suas embalagens a condições ambientais extremas, como temperatura, umidade, exposição à luz, etc..

Tais situações devem se adequar às condições climáticas do país no qual a medicação será comercializada.

No Brasil, a temperatura utilizada é a de 30°C, associada à umidade relativa do ar de 75% (medicamentos armazenáveis em temperatura ambiente).

É a partir do resultado desses estudos que os cientistas estimam o prazo de validade, ou seja, o limite de tempo que o composto conservará sua qualidade, eficácia e segurança.

Os campeões entre os vencidos

Um estudo realizado por pesquisadoras da UFSJ (Universidade Federal de São João del-Rei) concluiu que os MIPs (medicamentos isentos de prescrição), indicados para o tratamento da dor aguda ou crônica (dipirona, paracetamol, ibuprofeno, etc.) são os campeões entre os remédios vencidos estocados em farmácias caseiras.

Por serem muito usados por automedicação, eles podem ser consumidos sem que sejam avaliados os possíveis riscos.

Outro exemplo são os colírios. A recomendação é que, uma vez que tenham sido abertos, eles devem ser utilizados dentro de um prazo máximo de 30 dias. O perigo, aqui, é a contaminação por microrganismos, como as bactérias.

Nesse último caso, a validade da embalagem deve ser considerada somente quando o frasco estiver fechado. Após aberto, o que conta é o que está escrito na bula.

Como armazenar

Para sua segurança e a de sua família, guarde os medicamentos de forma adequada. Fique atento ao fato de que, a depender do tipo de medicação, as condições de conservação são diferentes. Confira as recomendações gerais:

Antes de definir como armazená-los, leia com atenção as instruções do fabricante.

Fale com um farmacêutico caso tenha dúvidas sobre as orientações de conservação da bula.

Mantenha todas as medicações longe do alcance de crianças e dos pets —isso vale para os MIPs e também para os demais remédios vendidos sob prescrição médica, independente da apresentação (adesivos, cremes, loções, comprimidos, suspensões, etc.).

Evite deixar produtos no banheiro ou em ambientes úmidos como a cozinha, assim como em cima do micro-ondas em funcionamento e da geladeira.

Respeite as orientações médicas sobre o tempo de uso e dosagens, e evite o quanto possível a automedicação.

Descarte corretamente

O descarte inadequado de sobras de medicamentos, vencidos ou não, provoca a contaminação do meio ambiente e, por consequência, afeta a saúde da comunidade. Para descartá-los de forma segura, coloque em prática as seguintes medidas:

Verifique a data de vencimento de medicamentos que você tem em casa. Separe os vencidos e os que não serão mais usados.

Informe-se sobre os pontos de coleta disponíveis na sua região. Um programa chamado Descarte Consciente permite a consulta da coleta mais próxima. Basta inserir seu CEP: https://www.descarteconsciente.com.br/.

Outra opção são as UBSs (Unidades Básicas de Saúde) e farmácias públicas ou privadas.

Evite o descarte no lixo da cozinha, no vaso sanitário ou na pia. Algumas substâncias não são degradadas pela natureza e elas podem prejudicar a água, os peixes, a vida marinha e ainda acabaria na água distribuída para as residências.

De acordo com o Ministério da Saúde, desde 2020 as farmácias têm de disponibilizar e manter pelo menos um ponto fixo para coleta de medicamentos vencidos a cada 10 mil habitantes.

No prazo de 2 anos, todas as capitais do Brasil e os municípios com população superior a 500 mil habitantes serão contemplados; e em até cinco anos, os municípios com população superior a 100 mil moradores também.

Fontes: Aline Araújo Lopes Morais, farmacêutica e bioquímica, especialista em Gestão de Assistência Farmacêutica, mestra em ciências pelo programa de mestrado profissional em gestão de organizações de saúde da FMRP-USP (Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo), responsável técnica pela farmácia da Unidade de Emergência do Hospital das Clínicas da mesma instituição; Amouni Mourad, farmacêutica e assessora técnica do CRF-SP (Conselho Regional de Farmácia do Estado de São Paulo); Patrícia Moriel, coordenadora do Comitê de Farmacovigilância do CRF-SP; e Máyra Rodrigues Fernandes, mestranda em ciências farmacêuticas na UFSJ (Universidade Federal de São João del-Rei), especialista no cuidado humanizado da criança e do adolescente pelo Programa de Residência Multiprofissional Integrada em Saúde no HC-UFMG (Hospital das Clínicas da Universidade Federal de Minas Gerais), membro fundadora da Liga Acadêmica de Farmácia Clínica da UFSJ. Revisão técnica: Amouni Mourad.

Referências:

Ministério da Saúde

Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária)

FDA (US Food and Drug Administration)

CDC (Centers for Disease Control and Prevention)

Fernandes MR, Figueiredo RC, Silva LG, Rocha RS, Baldoni AO. Armazenamento e descarte dos medicamentos vencidos em farmácias caseiras: problemas emergentes para a saúde pública. Einstein (São Paulo). 2020. Disponível em https://doi.org/10.31744/einstein_journal/2020AO5066.

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