EMDR: terapia que trata traumas com ajuda do movimento dos olhos funciona?
Uma terapia que o estimule a pensar no passado não é novidade. Mas imagine que, enquanto isso, você também tenha que interagir com imagens, sons ou sensações. O terapeuta irá pedir para que você acompanhe o dedo dele, que se moverá de um lado para o outro, dê tapinhas no corpo ou escute um bipe no ouvido esquerdo e direito, alternadamente. Assim é EMDR, terapia voltada para quem sofre com transtorno de estresse pós-traumático, ou TEPT, mas que vem sendo usada para tratar uma variedade de transtornos emocionais, incluindo ansiedade, depressão, fobias e vícios.
Apesar de parecer estranha, a ideia é que o paciente recorde o passado e enfrente o trauma enquanto o cérebro é estimulado no presente. Ao final da sessão, a memória não teria o mesmo poder que antes.
O que é EMDR e como surgiu?
Essa técnica foi descoberta pela psicóloga norte-americana Francine Shapiro, no final da década de 1980. Ela diz que estava caminhando por um parque e se deu conta de que os fatos ruins que vieram à sua cabeça perderam a carga negativa quando seus olhos se mexeram. Aí, começou a fazer experimentos com amigos e parentes, dedicou-se a pesquisas com veteranos da guerra do Vietnã e publicou os primeiros estudos em 1989.
EMDR, abreviação para eye movement desensitization and reprocessing, ou dessensibilização e reprocessamento por meio de movimento ocular, em tradução livre, foi originalmente concebida para tratar o transtorno de estresse pós-traumático. Sua aplicação, entretanto, expandiu-se para abranger uma variedade de distúrbios emocionais, incluindo ansiedade, depressão, fobias e vícios.
Segundo os especialistas consultados por VivaBem, os movimentos oculares focados na memória traumática reduzem o impacto emocional dessa lembrança, ressignificando, mudando a maneira como ela é armazenada no cérebro e como impacta a vida do paciente.
Como funciona?
Traumas e lembranças dolorosas são armazenados no cérebro. A técnica reprocessa tais lembranças que mantêm a pessoa presa ao passado, integrando informações que se encontram separadas nos dois hemisférios cerebrais.
De forma acelerada, o método "imita" o que acontece com as pessoas durante a etapa do sono REM (Rapid Eye Movement, ou Movimento Rápido Ocular), momento em que o cérebro processa a informação e a arquiva ao passado.
O terapeuta pede para que o paciente siga seus dedos de um lado para o outro do campo visual, enquanto a pessoa deve pensar na situação que causa a perturbação. O fato de ela acompanhar os dedos dá o arranque para o cérebro reprocessar a lembrança.
É possível, ainda, usar outras formas de estímulos bilaterais, a auditiva e a tátil, para alcançar o mesmo resultado: aparelhos que fazem bipe em cada ouvido, ou toque em uma mão e depois na outra, enquanto o indivíduo relembra o passado.
Quando EMDR é uma opção
Diagnóstico de estresse pós-traumático;
Traumas ou eventos traumáticos;
Fobias e ansiedade;
Depressão relacionada a algum trauma.
É eficaz?
A OMS (Organização Mundial de Saúde) e a Associação Americana de Psicologia recomendam o método para pessoas com TEPT. Na Inglaterra, o Instituto Nacional para Saúde e Cuidados de Excelência indica EMDR para adultos que enfrentam trauma e crianças que não reagiram à terapia cognitiva comportamental focada em tratar o trauma.
Mas cientistas ainda discutem se a terapia é mais eficaz que outros métodos para a mesma finalidade. Sobre o uso para tratar depressão, por exemplo, uma análise de nove estudos, publicada em abril de 2021 no periódico European Journal of Psychotraumatology, concluiu que EMDR "pode ser considerado um tratamento eficaz para melhorar os sintomas da depressão, com efeitos comparáveis a outros tratamentos ativos". No entanto, segundo os autores, "os resultados precisam ser interpretados à luz do número limitado de estudos e de sua qualidade".
De acordo com o estudo, mais pesquisas são necessárias para compreender os efeitos de longo prazo de EMDR no tratamento da depressão e na prevenção do transtorno.
Segundo especialistas consultados por VivaBem, a resposta à terapia EMDR pode variar substancialmente de pessoa para pessoa. Não é uma solução universal para todos os tipos de trauma ou para todos os indivíduos. A eficácia pode depender da natureza do trauma, resiliência do paciente e qualidade do terapeuta.
Existem alguns cuidados para aplicação e restrições na indicação, principalmente em pessoas que apresentam bipolaridade, já que estas necessitam estar medicadas e acompanhadas por psiquiatras.
Para obter bons resultados, eles reforçam que a terapia seja administrada por terapeutas qualificados e treinados.
Fontes: Ana Lúcia Gomes Castello, psicóloga clínica, trainer de EMDR, e presidente da Associação Brasileira de EMDR; Nicole Randazzo, psicóloga formada pela Pontifícia Universidade Católica do Paraná, especialista na técnica EMDR; Francisleine Rezende Machado, psicóloga clínica, terapeuta certificada em EMDR e pós-graduada em concepção sistêmica.
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