'Uso traqueostomia desde 2016 e reabilitação me ajudou a voltar a falar'

A operadora de máquinas Mirian Dutra, 38, teve um mal súbito indo para o trabalho há oito anos e foi parar no hospital. Desde então sua vida não foi mais a mesma. Após uma parada respiratória e a descoberta de uma pneumonia grave nos dois pulmões, os médicos viram a necessidade de colocar nela uma traqueostomia (cânula inserida na região da traqueia) para auxiliar na respiração.

Ela faz uso do aparelho desde então. Não de forma contínua, mas por alguns períodos. Às vezes, sua respiração piora e ela precisa voltar a usar a traqueo. Quando melhora, retira. Contudo, durante o uso, a vida de Mirian sofre com as limitações. "Jogava bola e treinava futebol. Precisei interromper por causa do aparelho. Não conseguia falar com rapidez e precisei adaptar minha dieta", conta a VivaBem.

Ela começou a fazer um trabalho de reabilitação no Hospital Universitário Cajuru, em Curitiba, que a ajuda a enfrentar os momentos com traqueostomia. À reportagem, a operadora de máquinas conta sua história:

"Em dezembro de 2016, sofri uma parada respiratória a caminho do trabalho. Comecei a sentir tontura, falta de ar e muito sono. Fui imediatamente levada para o hospital. Lá, fui diagnosticada com parada respiratória e pneumonia nos dois pulmões. Precisei ser intubada e passei um mês na UTI.

Saí do tratamento intensivo fazendo uso de ventilação mecânica. Tentamos por várias vezes me desconectar dela, mas sem sucesso. Ainda precisava de ajuda para respirar. Foi necessário quase um mês para que conseguisse retirar o ventilador. Sem ele, ainda tive que permanecer com o traqueo.

A traqueo foi colocada para me ajudar na respiração. Me sentia mais segura com ela, ainda mais depois de ter sido retirada da ventilação mecânica.

No final do mês de janeiro de 2017, tive alta do hospital, mas não do uso da traqueo. Precisava voltar ao médico de 15 em 15 dias para fazermos a revisão sobre a minha necessidade de usar o aparelho. No final de fevereiro, pude retirá-lo.

Seis meses após essa alta, em agosto de 2017, fui parar no hospital novamente. Estava de novo com pneumonia e fui diagnosticada com síndrome de Arnold-Chiari, que é quando uma parte do nosso crânio é pequena demais ou sofre com alguma deformidade. Mais uma vez fiquei dois meses internada.

Os médicos colocaram a traqueo de novo porque minha saturação de oxigênio não estava boa. Meu corpo estava retendo muito gás carbônico.

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As internações se repetiram todos os anos até que, em 2019, fiz uma cirurgia para a correção do meu crânio. Foi um sucesso. Tive alta em 15 dias e pude voltar para casa normalmente.

Novos desafios de saúde

Em meio ao ápice da pandemia, em setembro de 2020, fui parar no hospital mais uma vez. Os sintomas eram queda na minha saturação de oxigênio e trombose. Foi minha pior experiência em internação médica. Essa trombose afetou meus pulmões, tive acúmulo de água na região e precisei voltar a ser intubada e fazer uso de ventilação mecânica.

Precisei ficar seis meses com o tubo de traqueostomia. Isso impactou minha vida.

Jogava bola e treinava futebol. Precisei interromper por causa do aparelho. A traqueostomia exige muito cuidado para não machucar ou causar sangramentos —tomo também anticoagulantes.

Não conseguia mais falar com rapidez, por exemplo. Algo que fazia sem problema algum antes, agora me deixava cansada. Precisei também me adaptar em relação aquilo que eu consumia. Precisava mastigar bem a comida e limpar o tubo a cada três horas.

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A surpresa veio três anos após esse quadro. Em setembro de 2023, fui refazer a cirurgia da cabeça por conta da síndrome de Arnold-Chiari. Os problemas já começaram durante o preparatório para o procedimento: tive uma parada respiratória e convulsões.

Fui reanimada e fiquei intubada na UTI por sete dias —e mais 27 dias no quarto tratando a trombose.

Dois meses depois, já recuperada, passei pela cirurgia. Minha recuperação foi tão boa que pude vir para casa sem o uso de aparelho para a respiração mecânica, mas ainda estou com a traqueostomia —e só devo retirá-la em torno de julho deste ano.

Tratamento com a fonoaudióloga

O tratamento com a fono foi fundamental para o meu dia a dia. Conseguia falar melhor, perdi o medo de comer e ela me mostrou que poderia levar uma vida normal, com cuidados. Hoje, por exemplo, não tenho nenhuma restrição alimentar, mesmo com a traqueostomia.

Fiz o tratamento com a fonoaudióloga em casa, todos os dias, por 15 dias. Após esse período, recebi alta e continuei fazendo a higienização do tubo e os exercícios que ela me receitou sozinha. A cada dia, minha fala está melhor.

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Precisei pagar para fazer uma ressonância magnética, mas quando comecei o tratamento no Hospital Universitário Cajuru, em Curitiba, nunca mais tive problemas com atendimento. Nem esperar mais. Só tenho a agradecer ao hospital e ao SUS."

Traqueostomia x reabilitação

Segundo Franciele Savaris Sória, coordenadora do setor de fonoaudiologia dos hospitais universitários Cajuru e São Marcelino Champagnat, ambos em Curitiba, a traqueostomia é utilizada em pacientes que ficaram muito tempo intubados ou que têm problemas pulmonares.

"A fonoaudiologia vai ajudar a reabilitar esse paciente quando ele já estiver consciente e respondendo aos exercícios", explica Sória. E isso pode acontecer até mesmo quando a pessoa ainda estiver ligada ao respirador mecânico, como foi o caso da Mirian.

Existem diferentes tipos de tubos de traqueostomia, o que muda a maneira como se deve cuidar daquele paciente. "Tem as de plástico, que ficam insufladas como um balão na garganta, e a de metal, que impede que o usuário faça a reprodução da sua voz", explica a fonoaudióloga.

Ela conta que, na reabilitação de Mirian, foi utilizado uma válvula acoplada a traqueostomia que fazia o papel das cordas vocais. Foi isso que a ajudou a voltar a falar e comer. Entre os exercícios indicados pela especialista para essa melhora estão, por exemplo, os movimentos de deglutição.

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"A necessidade de cada paciente vai depender da avaliação dos profissionais. Não é preciso estar internado para isso, há exercícios diários que pode-se fazer em casa e que é possível fazer a repetição sem acompanhamento", explica Sória.

Segundo a fonoaudióloga, os hospitais onde trabalha atendem cerca de 300 pacientes por ano para reabilitação.

Errata:

o conteúdo foi alterado

  • Diferente do informado, Franciele Savaris Sória é fonoaudióloga, e não médica. A informação foi corrigida.

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