Menina encosta em lagarta e tem grau máximo de dor: 'Vou morrer criança'
Janaína Silva
Colaboração para VivaBem
24/04/2024 04h05
Gabriela Tenorio Barros, 5, participava de uma caça aos ovos de Páscoa, organizada por seu tio no jardim no condomínio em que ele mora, na cidade de São Paulo, quando, sem perceber, tocou em uma lagarta e sentiu uma ardência e dor no local.
"Após passar por muitas pistas e pegadas, ao chegar ao último ovo e afastar uma planta que estava na frente, instantaneamente ela começou a gritar de dor, como nunca vi, desesperada, falando que havia se queimado", conta a mãe da criança, Marcela Tenorio Barros, empresária, em uma postagem no Instagram.
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O desespero tomou conta da menina e de toda a família. Acostumados a fazerem trilhas na natureza, já que residem no litoral paulista, próximos à uma área de floresta, a mãe fala que não imaginavam que, em plena zona urbana, pudessem passar por um acontecimento como esse.
"Estamos sempre alertas aos animais que podem adentrar a casa, varanda e jardim. Então foi uma grande ironia ela ter se queimado na cidade, em um ambiente que parecia ser bem controlado, e não em uma trilha em um lugar remoto, como estivemos tantas e tantas vezes. Acidentes ocorrem em qualquer lugar, e nas trilhas sempre prestamos mais atenção. Acredito que, a partir de agora, ficaremos todos mais atentos aos bichinhos que nos rodeiam na cidade também", detalha a mãe.
A primeira providência foi procurar o bicho que havia queimado a menina e, segundo a mãe, a surpresa foi encontrar uma lagarta peluda, laranja, que parecia muito a lagarta-cachorrinho, que ficou conhecida no episódio com a jornalista Sandra Annenberg, no fim de 2023.
Roberta Piorelli, médica infectologista do Hospital Vital Brazil, do Instituto Butantan, na capital paulista, explica que, ao encostar na lagarta, com a pressão exercida a cerda urticante [espécie de espinho] penetra na pele, libera a toxina e provoca ardência e dor local, muitas vezes, intensa, que pode irradiar para todo o membro.
"Eventualmente, a pessoa sente também coceira, pois as manifestações no local dependem da extensão e da intensidade do contato que houve com a lagarta", completa a médica. Vermelhidão, inchaço e lesões em pontinhos são comuns. Além disso, segundo a infectologista, o surgimento de íngua próxima ao local —infartamento ganglionar— é característico.
Marcela relembra que foi fácil encontrar a lagarta porque a família sabia onde tinha sido. "Em caso de acidente, o ideal é trazer a lagarta ou uma foto. É importante frisar que não é foto de internet e, sim, da que causou o acidente. No entanto, se capturar ou fotografar o animal for oferecer risco naquele momento, não é necessário se arriscar", esclarece a médica.
Após pensar em ligar para amigos biólogos, Marcela telefonou diretamente para o Instituto Butantan e foi orientada a procurar atendimento no pronto-socorro mais próximo de onde estavam. De imediato, os pais colocaram gelo para aliviar a dor e dirigiram-se ao Vital Brazil.
Foram 13 minutos de adrenalina. A Gabi gritava tanto, e a dor dela foi subindo para os braços, ombros e axilas, deixando-nos muito preocupados com a possibilidade de uma hemorragia. Marcela Tenorio Barros
Ao chegarem lá, foram informados de que a lagarta que encostou na Gabi era "prima" da cachorrinho, o acidente foi provocado pela Megalopyge albicollis, mais conhecida como lagarta-de-fogo. De imediato, os atendentes já deram uma luva congelada para ela segurar e, quando viram a foto da lagarta, avisaram que ela sentiria dor por uma hora.
A menina foi anestesiada devido à intensidade da dor, que atingiu 10, pontuação máxima na escala. A mãe lembra que quando ela já estava anestesiada, os médicos perguntaram se os dedos medissem dor, de 1 a 10 dedinhos, quantos dedinhos de dor ela sentia, a resposta foi 3. "E antes da anestesia?", questionaram. "Eu precisaria de mais mãos e mais dedinhos. Acho que uns 5 adultos de dedinhos."
Não consigo imaginar o que é sentir uma dor dessas junto ao medo de morrer. Foi muito triste ver o desespero no chamado dela, que dizia: eu vou morrer criança! Marcela Tenorio Barros
O susto foi grande e, felizmente, não era uma espécie venenosa.
O que fazer em caso de acidentes com lagartas
Ao ser queimado por uma lagarta, que são chamadas popularmente também de taturana, marandová, mandorová, mondrová, ruga, oruga e bicho-peludo, a pessoa deve lavar o local com água fria em abundância na tentativa de remover as espículas que estão na superfície da pele.
Outras dicas que podem ajudar:
Compressas geladas ajudam a aliviar a dor
Não aplicar qualquer outra substância no local
Não fazer curativos nem torniquetes
Pomadas devem ser utilizadas somente sob orientação médica
Em caso de acidente por lagarta ou outros animais peçonhentos, recomenda-se procurar o serviço médico mais próximo, para avaliação do caso e da necessidade de tratamento.
"O serviço médico pode nos contatar por telefone para orientações na condução do caso e na identificação do animal. É possível também dirigir-se ao Hospital Vital Brazil, que funciona 24 horas por dia, 7 dias por semana", indica a infectologista.
Orientações às crianças
Instruir para que não se aproximem nem toquem em animais que não conheçam
Prestar atenção nos detalhes em ambientes naturais, já que os animais se camuflam
Ensinar a pedir auxílio a adultos ao sentir desconforto
Conheça as principais famílias de largartas
O acidente da Gabriela foi provocado pela Megalopyge albicollis, mais conhecida como lagarta-de-fogo, que pertence à família das Megalopygidae, que juntamente com as Saturniidae, Limacodidae e Arctiidae são as mais comuns no Brasil, com diversas espécies causadoras de queimaduras que, por conterem toxinas, são consideradas de importância médica.
Os exemplares da Megalopygidae englobam as chamadas cabeludas, e apresentam longos e sedosos pelos inofensivos que escondem cerdas pontiagudas. A lagarta-cachorrinho também é desta família.
Das mais perigosas. "Até o momento, a lagarta do gênero Lonomia, da família Saturniidae —que compreende as espinhudas—, é a responsável por envenenamento sistêmico, que resulta em um distúrbio de coagulação e deixa o paciente propenso a hemorragias, enquanto as demais provocam apenas reação local", explica Piorelli.
A Lonomia possui cerdas semelhantes a espinhos de cactos ou ramos de alecrim, vivem em bandos, aglomeradas no tronco de árvores frutíferas e descem para as partes mais baixas do tronco antes de se tornarem pupas para então virarem mariposas.
Na região Sul, são comuns nos meses de novembro e dezembro. No Sudeste, de janeiro a abril, e no Norte, aparecem o ano inteiro. Em caso de acidentes, é necessário tratar com soro antilonômico, produzido pelo Butantan.