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'Surto de doença rara me deixou tetraplégica e sem visão do olho direito'

Erika tem neuromielite óptica Imagem: Arquivo pessoal

Bárbara Therrie

Colaboração para VivaBem

21/05/2024 04h05

Diagnosticada com neuromielite óptica, a assistente financeira Erika Lima Cariêllo, 47, sofreu um grave surto da doença que a fez perder os movimentos do corpo e parte da visão do olho direito. Sem poder se mexer e andar por quase dois anos, ela conta que o mais difícil foi não conseguir cuidar das três filhas pequenas na época. Recuperada, ela conta que nasceu de novo e divide sua história:

"O primeiro sintoma foi no olho direito, fiquei com a vista embaçada e não conseguia enxergar nitidamente. Fui ao oftalmologista, ele identificou uma inflamação do nervo óptico, tratou com corticoide e pouco tempo depois minha visão voltou ao normal.

Cerca de um ano depois, tive um outro sintoma que aparentemente não tinha relação com o episódio do olho, mas depois descobri que tinha. Comecei a sentir uma dormência e formigamento na perna e no pé. Fui ao ortopedista, ele disse que era um problema relacionado à coluna, me prescreveu uma medicação e pediu para eu fazer 10 sessões de fisioterapia. Fiz o tratamento, mas não tive melhora.

Um dia estava na casa da minha tia e meus braços e pernas paralisaram, parecia que estava tendo um derrame. Fui ao pronto-socorro, o médico descartou o AVC, mas me orientou a passar com um neurologista.

No dia seguinte consegui uma consulta de encaixe com um neuro e fiz uma ressonância na coluna de emergência. Com o resultado, o exame físico e histórico de sintomas, em 2009 fui diagnosticada aos 33 anos com NMO (neuromielite óptica), uma doença autoimune rara que se manifesta por surtos inflamatórios graves e pode resultar em perda da visão e do movimento.

Imagem: Arquivo pessoal

Iniciei o tratamento com uma neurologista especialista em NMO, mas tive alguns surtos da doença que se intercalaram entre períodos de melhora e piora. Tinha dormência e formigamento nos membros superiores e inferiores, precisava arrastar a perna para conseguir andar e havia momentos que não tinha forças para ficar em pé.

Em um dos surtos mais graves, tive uma inflamação na coluna cervical e perdi os movimentos dos braços, pernas e tronco, fiquei tetraplégica, só mexia a cabeça e perdi a visão do olho direito. Já tinha ficado internada algumas vezes por conta da doença, mas dessa vez fiquei 30 dias hospitalizada e quase dois anos debilitada.

"Não conseguia cuidar das minhas três filhas pequenas"

Imagem: Arquivo pessoal

Perdi minha independência, fiquei acamada, parei de andar e tive que usar cadeira de rodas. Fiquei afastada do trabalho e passei a depender de alguém para fazer coisas básicas como escovar meus dentes, pentear o cabelo, me levar ao banheiro, dar banho, me alimentar. Tive uma grande rede de apoio entre familiares e amigos que se revezavam para ficar comigo.

De tudo o que passei, o mais difícil foi não conseguir cuidar das minhas três filhas que na época tinham 2, 3 e 10 anos. Me sentia impotente de vê-las e não poder ajudar, brincar e pegar no colo. Elas já tinham uma babá, mas tive que contratar uma outra para ficar com elas à noite.

Durante a minha reabilitação, tive que reaprender a andar e a escrever. Foi um processo doloroso que exigiu paciência e dedicação, mas sempre tive fé em Deus que iria vencer. Aos poucos, fui melhorando até recuperar completamente todos os movimentos do corpo.

Tive uma única sequela, perdi cerca de 70% da visão do olho direito. Como a neuromielite óptica não tem cura, sigo fazendo o tratamento e tomo medicação na veia uma vez por ano para evitar as crises e controlar a doença.

Nasci de novo, tenho aproveitado essa segunda chance da melhor maneira possível. Trabalho, faço atividade física e tenho tempo de qualidade com a minha família e amigos."

Erika com as filhas, o marido e a mãe Imagem: Arquivo pessoal

Saiba mais sobre a doença

A NMO é uma doença autoimune na qual os autoanticorpos dirigidos contra uma proteína presente em células do sistema nervoso central, chamadas astrócitos, provocam inflamação preferencialmente nos nervos ópticos e na medula espinhal.

É uma doença rara, sua prevalência é de cerca de até 5 pessoas por 100 mil habitantes. Ela é sete vezes mais comum em mulheres, principalmente nas populações negras e asiáticas.

Os sintomas mais comuns são:

  • embaçamento visual
  • diminuição (ou perda) da visão, que pode afetar um olho ou os dois e relacionados a uma lesão extensa da medula
  • fraqueza nos membros inferiores e superiores
  • perda da sensibilidade em tronco e membros
  • dormência
  • formigamento
  • prejuízo no controle urinário e fecal
  • vômitos e soluços que não cessam

A doença provoca surtos de início rápido com o aparecimento dos sintomas e em poucos dias pode levar a déficits neurológicos moderados a graves.

Durante surto da NMO, Erika ficou quase 2 anos sem se mexer e andar Imagem: Arquivo pessoal

O diagnóstico é feito com base no reconhecimento clínico das principais manifestações e com exames complementares, como ressonância magnética de crânio que mostra alterações no nervo óptico; ressonância magnética de coluna que indica a lesão medular e a pesquisa no sangue do anticorpo anti-AQP4.

O diagnóstico se torna difícil na medida em que os médicos generalistas não conhecem a doença e que muitos exames complementares não são disponibilizados. Além disso, na maioria das vezes, a neuromielite óptica pode ser confundida com a esclerose múltipla na fase inicial da doença.

Atualmente, a Anvisa aprova o uso de três diferentes anticorpos monoclonais para controlar os surtos da doença. Para a fase aguda, é indicado o uso de corticoide venoso em altas doses e/ou a plasmaferese (consiste em filtrar o sangue através de uma máquina para retirar os anticorpos que estão provocando a inflamação).

A NMO não tem cura, mas o controle dos surtos reduz os riscos de morbidade e mortalidade. Vale ressaltar que a doença provoca graves déficits com sequelas que podem ser definitivas e afetar a qualidade de vida dos pacientes.

Dados mostram que 41% dos pacientes podem ficar completamente cegos em ao menos um olho cinco anos após o surgimento da doença. Cerca de 34% podem apresentar uma deficiência motora permanente após seis anos.

Fonte: Cláudia Cristina Ferreira Vasconcelos, neurologista e especialista em doenças desmielinizantes, em especial esclerose múltipla e neuromielite óptica.

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