Andar na ponta dos pés e autismo: qual é a relação?

Patrícia Soares, 47, mãe de três filhos com TEA (Transtorno do Espectro Autista) começou a compartilhar no TikTok a rotina de sua família. Recentemente, orientou os seguidores sobre a trajetória de tratamento da chamada "marcha equina" de Pedro, 11, caracterizada pelo andar na ponta dos pés.

"Hoje eu posto um pouco sobre o dia a dia dos meus filhos e a minha vivência como mãe atípica, sendo franca e não romantizando, porque não é nada fácil mesmo. Mas tem uma questão extremamente importante: a aceitação", explica a mãe sobre a gravação dos vídeos.

Pedro apresentou duas características peculiares quando aprendeu a andar: o filho não engatinhou e se levantava caminhando na ponta dos pés. Ele ainda não tinha um diagnóstico fechado, mas a mãe achava estranho e pensava: "Que bonitinho, ele tá começando a andar, mas com o tempo deve aprender a andar normalmente, com os pés plantados no chão", relembrou Patricia.

Ela buscou informações na Apae (Associação de Pais e Amigos dos Excepcionais), e uma fisioterapeuta alertou sobre os prejuízos que ele poderia ter no futuro. Na ocasião, a profissional também passou alguns exercícios que poderiam ser feitos em casa para amenizar o quadro.

Apesar dessa característica não ser suficiente para fechar o diagnóstico de TEA, porque está também presente em outros transtornos, um estudo do Centro Universitário de Patos comprovou que 82% das crianças com autismo analisadas apresentavam dificuldade em manter os pés no chão e preferiam andar na ponta dos pés.

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Imagem: Divulgação

Pedro está usando uma órtese (como a da foto) feita sob medida para seu pé e passando por uma equipe multidisciplinar no tratamento. A mãe afirma ser um processo doloroso, de disciplina e comprometimento para dar certo.

"Não podemos nos esquecer que estamos falando de uma criança com TEA, existem questões bastante relevantes a serem considerados, como hipersensibilidade/hipossensibilidade, a rigidez cognitiva e a quebra de rotina", explica ela.

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As informações sobre o TEA ainda são escassas. Patrícia, até o diagnóstico dos filhos Bruna, Pedro e Manu, não sabia nada sobre o tema. Ela procurou médicos e percebeu sinais em suas crianças que eram parecidos a casos relatados em uma reportagem do médico Drauzio Varella. "O que os pais devem fazer é procurar se informar, principalmente quando se está de frente para uma situação em que você não tem a menor noção", diz.

Encurtamento dos pés está associado ao autismo?

Não exclusivamente. A marcha na ponta dos pés pode estar relacionada com o autismo por uma razão multifatorial, quando relacionado a uma alteração de processamento sensorial, de desenvolvimento neuropsicomotor ou um padrão comportamental adquirido.

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Imagem: Getty Images

O 'encurtamento dos pés' propriamente dito é apenas uma consequência do padrão de marcha alterado, que pode aparecer em crianças com as condições de saúde citadas acima.
Carolina Bustillo, terapeuta ocupacional do Instituto Jô Clemente

Os especialistas chamam a condição de marcha equina, que é quando a pessoa apoia o peso do corpo na parte anterior do pé e não encosta o calcanhar no chão. Ela está associada a várias condições neurológicas e o autismo é uma delas.

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Outro caso é a marcha equina idiopática, que é quando a criança anda apoiando o pé no chão e, com o tempo, altera o passo para não caminhar como antes.

Outros diagnósticos feitos a partir do andar na ponta dos pés:

  • Condições patológicas do neurodesenvolvimento, como a paralisia cerebral: podendo ocasionar distúrbios de postura e movimento.
  • Doenças neuromusculares, como as distrofias musculares: as fibras musculares são propensas a sofrerem danos a longo prazo, ou seja, pode acontecer da criança ter começado a andar com o pé inteiro no chão e depois na ponta dos pés.
  • Encurtamento do Tendão de Aquiles: o calcanhar pode ser impedido de pisar devido o tendão, que liga os músculos da perna. Uma parte do corpo relacionada ao equilíbrio e ao desenvolvimento dos movimentos.
  • Sandal Gap: alargamento do espaço que fica entre o dedão e o segundo dedo do pé, onde se apoia o chinelo. Esse fator também está ligado ao autismo.

Problemas associados

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Imagem: Getty Images

Andar apenas na ponta dos pés pode acarretar problemas no desenvolvimento da criança e dores crônicas a longo prazo. Essa marcha impacta nas articulações entre os joelhos, quadril e coluna, hipertrofia, deformidades nas estruturas ósseas das pontas dos pés, dificuldade para caminhar e dores musculares na região.

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As consequências de não ir atrás de um diagnóstico e tratamento adequado ultrapassam os fatores físicos.

Temos também problemas de ordem social, porque ele é um tipo de marcha que foge do esperado, então é uma coisa que chama atenção e que pode, sim, expor a pessoa socialmente.
Raquel Del Monde, pediatra especialista em transtornos de neurodesenvolvimento

Tratamento adequado

Os especialistas indicam que a partir dos dois anos as crianças não andam mais na ponta dos pés. Nessa fase, é comum os pequenos ainda estarem aprendendo a se equilibrar e adquirindo habilidades psicomotoras e sensoriais.

Depois dessa idade, os pais precisam prestar atenção e procurar um profissional para ter um tratamento recomendado pelos médicos com uma equipe multidisciplinar de fisioterapia, psicologia e terapia ocupacional.

A criança pode ter a necessidade de usar órteses ou gesso para fazer com que o pé volte à postura adequada e toque completamente no chão.

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Em casos mais graves, os profissionais podem indicar intervenções mais invasivas, com a aplicação da toxina botulínica na musculatura e até o tratamento cirúrgico para alongamento do tendão de Aquiles.

Fontes: Carolina Bustillo, terapeuta ocupacional do Setor de Terapias ABA (Applied Behavior Analysis) do Instituto Jô Clemente em São Paulo; José Leandro, médico especialista em neurologia infantil do Ceará e mestre em farmacologia; e Raquel Del Monde, médica pediatra e especialista em autismo, TDAH e outros transtornos de neurodesenvolvimento em São Paulo.

Referência: Avaliação da marcha em ponta de pé em crianças e adolescentes com transtorno do espectro autista.

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