Forçar para evacuar não é saudável e pode deixar o reto para fora
Você costuma ter dificuldade de ir ao banheiro e, quando vai, precisa fazer muita força para evacuar? Saiba que isso é um dos principais fatores de risco do prolapso retal. Ele ocorre quando a porção final do intestino grosso, o reto, sai além do ânus.
Essa saída pode ser parcial, quando apenas uma pequena parte da mucosa do reto fica exposta, coisa de 2 a 3 cm, ou um prolapso retal total, onde é possível enxergar diferentes camadas do reto do lado de fora do ânus, com alguns chegando a 20 cm de exteriorização.
Mas o esforço evacuatório não é o único desencadeador. O prolapso é gerado por uma série de fatores na maioria dos pacientes, e esses fatores estão todos associados ao enfraquecimento da pelve, um conjunto de músculos responsáveis por sustentar reto, ânus, bexiga, nas mulheres também a vagina e o útero, e nos homens a próstata.
O que gera esse enfraquecimento é o próprio envelhecimento. Além disso, pessoas muito magras geralmente têm a sustentação do assoalho da pelve um pouco mais flácida, assim como pessoas muito constipadas que fazem esforço evacuatório muito grande.
Bruna Vailati, coloproctologista do Hospital Alemão Oswaldo Cruz (SP)
Pessoas que perderam peso de forma acentuada também podem sofrer com a doença por conta da diminuição de coxins gordurosos que ajudam no preenchimento do assoalho pélvico. Por outro lado, a obesidade também pode ser um fator pelo aumento da pressão abdominal.
Mesmo exercícios físicos onde há grande esforço intra-abdominal, como agachamento, podem, diante de cargas muito elevadas, levar ao prolapso retal.
Além disso, fatores genéticos e até predisposições individuais podem desencadear a degeneração dos tecidos elásticos que fixam a mucosa retal e a própria sustentação do reto, o que levaria ao prolapso.
Mulheres são as mais afetadas
A pelve feminina, que é mais larga para facilitação do parto e da presença da vagina anteriormente ao reto, torna as mulheres mais propensas ao prolapso retal.
"A essas condições anatômicas, associa-se o fato de que mulheres que já tiveram partos terão fragilidade da musculatura pélvica e até sequelas obstétricas como desencadeantes da condição", comenta Lêda Telesi Castro, cirurgiã do aparelho digestivo membro da Sociedade Brasileira de Coloproctologia e professora do curso de medicina da Universidade Nove de Julho.
Os partos normais ou de fórceps são os que mais contribuem para o prolapso retal, não só pela flacidez que podem gerar na pelve, mas também pelo esforço que é feito. Mulheres que perdem órgãos da pelve, como útero e ovários, também têm uma chance maior de prolapso retal, já que eles servem de sustentação para os músculos do assoalho pélvico.
Outro ponto é que as mulheres tendem a sofrer de constipação com mais frequência, o que leva a um esforço evacuatório aumentado.
Surgimento é lentamente progressivo
Normalmente, o prolapso retal surge gradualmente e pode levar anos para se manifestar. Raramente se instala de forma abrupta após grande esforço evacuatório de fezes muito compactadas.
Geralmente ele vai aumentando com o passar do tempo. E não necessariamente o indivíduo, principalmente os mais idosos, percebem que tem algum problema. Ele pode ir surgindo aos poucos de modo a ser percebido por um cuidador ou pelo próprio paciente.
Sidney Klajner, cirurgião e coloproctologista do Hospital Albert Einstein (SP)
A pessoa de início vê uma parte pequena do canal anal que é exteriorizada e com o tempo isso vai aumentando de volume.
"Inicialmente, o prolapso se reduz espontaneamente após a evacuação, porém, com a progressão da doença só reduz manualmente até se tornar irredutível. Geralmente nesta fase é comum que o paciente relate a presença de muco nas vestes", aponta Telesi.
Quando a mucosa do reto sai pelo ânus durante o esforço evacuatório, frequentemente a pessoa experimente uma sensação de desconforto, podendo muitas vezes progredir para dor e até sangramento.
Além disso, diante de um reto prolapsado, ocorre uma pressão no ânus, com aumento da vontade de evacuar. Muitas vezes a doença pode levar a incontinência fecal, com perda de controle dos gases e fezes.
Cirurgia é o caminho recomendado
O prolapso retal assintomático é uma condição extremamente inesperada. Essa é uma doença cercada de sintomas incômodos.
Alguns tratamentos paliativos podem aliviar o desconforto, como:
- Fisioterapia pélvica para fortalecer o assoalho da pelve;
- Uso de laxantes acompanhado por uma dieta cheia de fibras e ingestão de muita água para facilitar o fluxo intestinal e diminuir o esforço evacuatório;
- Cuidados locais com uso de pomadas para assadura por conta da borda do ânus sempre suja ou com muco.
Por mais que essas medidas sejam fundamentais e, inclusive, recomendadas depois da cirurgia, não há remissão completa dos sintomas apenas com tratamento clínico. De forma geral, a partir do momento que é feito o diagnostico já há indicação de tratamento cirúrgico.
As opções cirúrgicas incluem extrair parte do reto (comum para pessoas idosas com pouca vitalidade e condição clínica para uma cirurgia abdominal maior) ou reposicioná-lo dentro do corpo por via laparoscópica ou até utilizando robô, fazendo uma ancoragem para evitar recidivas.
"Se o paciente for muito idoso, tiver uma condição clínica delicada ou for um paciente com comorbidade, pode-se tentar não operar e fortalecer a musculatura pélvica, que dá suporte ânus retal. Mas em tese é uma doença habitualmente cirúrgica", esclarece Flávio Feitosa, gastroenterologista do Hospital Aliança (Rede D'Or), de Salvador, e membro titular do Gediib (Grupo de Estudos da Doença Inflamatória Intestinal do Brasil).
Porém, o prolapso retal na infância pode ter uma remissão espontânea, sem necessidade de procedimento cirúrgico em bebês e crianças.
Nesses casos, o médico normalmente prescreve medicamentos para facilitar a evacuação, se for o caso reintroduz manualmente o reto do paciente durante a consulta ou orienta os pais a realizarem manobras simples que ajudam a reverter o quadro.
Alguns sintomas lembram a hemorroida
Como explicado, o prolapso retal é a exteriorização da mucosa do reto através do canal anal. Já as hemorroidas são veias dilatadas e inflamadas na região do ânus que podem acabar se exteriorizando por perda de sustentação devido à degeneração do tecido elástico e aumento do fluxo sanguíneo no chamado plexo hemorroidário.
Diferente do prolapso, o que é exteriorizado no caso de hemorroidas não é a parede do reto e sim veias e artérias.
Como pontos em comum elas têm os sintomas de sangramento anal, eliminação de muco e/ou a presença de uma protuberância fora do ânus no caso de hemorroidas externas.
Além disso, ambas pioram com a força na hora de evacuar. Por isso, pessoas com constipação crônica que possuem fraqueza da pelve têm uma tendência maior às duas doenças.
Tratar a obstipação, seja com atividade física, ingestão de água, de fibras, uso de laxantes, tudo isso vai evitar tanto uma doença quanto a outra. Ter bons hábitos evacuatórios, seja dia sim, dia não, ou diariamente é importante para qualquer pessoa diminuir as chances de aparecimento tanto do prolapso quanto da hemorroida.
Flávio Feitosa, gastroenterologista do Hospital Aliança de Salvador
Como em algumas situações os sintomas são bem parecidos e o prolapso pode não estar evidente, além do exame físico, muitas vezes é necessário exames complementares para definir o diagnóstico.
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