'Divertida Mente 2': quatro lições do filme sobre a ansiedade
Uma década após o primeiro filme, a sequência de Divertida Mente chegou aos cinemas brasileiros nesta semana, na quinta-feira (20).
A animação leva os espectadores novamente à mente de Riley, agora uma adolescente de 13 anos que enfrenta a montanha-russa emocional da puberdade.
Entre as novas emoções desta etapa, uma é a protagonista: a ansiedade. "Oie, sou a ansiedade, onde ponho isso?", pergunta a nova emoção ao aparecer no filme pela primeira vez, carregada de bagagens.
Na trama, a nova emoção chega para proteger Riley dos perigos futuros, mas acaba intensificando preocupações e medos.
A adolescente vai participar de um acampamento de hóquei que pode trazer boas oportunidades e conhecer novas amizades na escola. E é aí que a ansiedade começa a controlar suas decisões, recalcando as emoções que já conhecemos no primeiro filme da franquia.
Ela é retratada de maneira intensa e até assustadora. Ela reconfigura as convicções de Riley e altera a percepção da menina de si mesma. As outras emoções, como a alegria, são reprimidas quando a ansiedade ganha espaço.
Veja algumas lições que "Divertida Mente 2" ensina sobre equilíbrio emocional para crianças (e adultos também):
1. Ansiedade é natural e pode ser útil --quando não é um transtorno
A ansiedade é uma emoção natural que desempenha um papel importante na nossa sobrevivência, ajudando-nos a preparar e reagir a possíveis ameaças.
Em pequenas doses, ela pode ser útil e nos ajudar a manter a segurança e a produtividade, preparando-nos para enfrentar desafios futuros. É o que explica a psiquiatra Danielle Admoni, pesquisadora e supervisora na residência de Psiquiatria da Universidade Federal de São Paulo.
"Existe ansiedade normal, um sintoma que a gente tem que ter, por exemplo, tem uma prova. Se eu não ficar ansiosa, eu não vou me esforçar. Não vou me empenhar, ela tem uma função que é um motorzinho, fazer a gente se mexer, se empenhar para as coisas", diz.
O problema é quando esse sentimento passa a dominar as outras emoções, como é visto no filme da Pixar. "Quando começa a incomodar o tempo todo, como uma sensação ruim, já falamos em algo patológico", explica a médica.
Falamos em transtorno de ansiedade quando existe prejuízo clinicamente significativo, ou seja, essa ansiedade começa a atrapalhar a vida da pessoa Danielle Admoni, psiquiatra
Embora exista uma confusão com o medo, o psiquiatra Fernando Asbahr, coordenador do Programa de Ansiedade na infância e adolescência do Instituto de Psiquiatria do Hospital das Clínicas da USP, afirma que a ansiedade está mais relacionada à antecipação.
"Todo mundo antecipa as coisas, todo mundo pode ter sensação de ansiedade. Por exemplo, se você está em frente a um leão ,você vai sentir sintomas físicos de ansiedade, sensações parecidas com uma crise de pânico. O problema é você sentir algo super intenso como uma crise de pânico em uma situação que não tem nenhum perigo", diz o especialista.
O que diferencia uma ansiedade que é problemática e considerada patológica de uma considerada normal, é o grau de influência que essa ansiedade tem na vida da pessoa. O quanto ela leva a pessoa a uma dificuldade de funcionamento no dia a dia Fernando Asbahr, psiquiatra
2. A ansiedade distorce nossas percepções
A ansiedade pode distorcer percepções e influenciar comportamentos, levando a crenças falsas e ações impulsivas, como Riley é levada a acreditar no filme. "Não sou boa o bastante", a jovem repete durante algumas cenas.
Danielle Admoni diz que o sentimento pode levar a uma percepções ruins e a uma autocrítica exagerada de si e, consequentemente, dos outros também.
"É uma busca pelo perfeccionismo. De maneira inconsciente, acho que, se as coisas saírem do meu jeito, tudo ficará certo. É lógico que isso é uma fantasia, não controlamos nada. Mas, quando as coisas saem do controle, o ansioso se desorganiza", diz a psiquiatra.
3. Crianças também podem ter crises de ansiedade
Crises de ansiedade podem acontecer em qualquer faixa etária. De acordo com o psiquiatra Fernando Asbahr, os transtornos de ansiedade estão relacionados a fatores multifatoriais: desde fatores externos ligados ao meio ambiente, como situações de estresse, que podem intensificar estados ansiosos; a questões individuais, como características biológicas.
"Atendi um menino de 5 anos de idade em São Paulo que tinha uma grande preocupação por causa das chuvas no Rio Grande do Sul. Ele mora em um prédio, mas estava com grande receio de que a enchente chegasse em São Paulo e invadiria a casa dele, um apartamento. É um nível de preocupação absolutamente exagerado para aquela criança, naquela idade", relata o médico.
Os sintomas de um transtorno de ansiedade na infância e na adolescência se expressam da mesma forma que em um adulto. "A criança fica tão ansiosa que não consegue fazer a prova ou comer, vomita antes de fazer alguma coisa importante. Ou seja, começa a me trazer problemas, me trazer prejuízo clinicamente significativo."
Em crianças, é especialmente importante observar mudanças de comportamento, aponta o psiquiatra. Comumente, ela está ligada a uma ansiedade de separação ou social.
"Pode haver um transtorno ansioso mais precoce na vida, como o transtorno de ansiedade de separação, por exemplo, aquela criança que não fica na escolinha de jeito nenhum, não consegue ficar longe da mãe, mesmo depois do período de adaptação. Ou quando é uma criança maior e é convidada para passar o fim de semana na casa dos amiguinhos, mas antecipa questões como não conseguir dormir, então decide que não vai", explica.
"Também pode haver alteração de sono e, às vezes, uma das queixas é que a criança está cansada, deita, mas não consegue dormir por pensar em coisas como uma prova", diz.
O que é importante é se atentar a mudanças de comportamento que são as normais daquela criança. Essa é uma grande dica para os pais que, na dúvida, deve procurar uma avaliação especializada. Fernando Asbahr, psiquiatra
4. Acolhimento é essencial para controlar a ansiedade
Por fim, o filme aborda a importância de manter o equilíbrio entre as emoções, permitindo que cada uma desempenhe seu papel sem dominar as demais.
O enredo também destaca a importância de nomear e reconhecer os sentimentos para reduzir sua intensidade.
Técnicas de relaxamento, autoconhecimento e estratégias de enfrentamento podem ajudar a manter a ansiedade sob controle. E não menos importante: falar francamente sobre o assunto.
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