O que acontece no seu corpo quando você usa Viagra ou Cialis sem precisar

Seguros e eficazes, medicamentos para tratar a disfunção erétil (DE) revolucionaram a vida sexual dos homens, especialmente entre os que já passaram dos 40 anos. Na última década, porém, os cientistas têm observado o uso do "azulzinho" por quem não precisa deles: rapazes jovens e saudáveis.

Essa prática tem como objetivo usufruir dos efeitos do remédio sem necessidade —o que é considerado um uso recreacional— uma espécie de abuso de medicações. Para além disso, a maioria desses consumidores nunca consultou um médico previamente.

Os especialistas já descobriram que o que justifica esse comportamento é a falta de confiança na própria ereção. Mas será que vale a pena ignorar os possíveis riscos dessa medida?

Questões culturais dificultam a busca por aconselhamento e há falha na comunicação com os médicos, que podem não questionar os pacientes sobre a vida sexual.

21,5% de jovens saudáveis de 18 a 30 anos usam esses fármacos de forma recreativa, em geral associados ao álcool ou outras drogas, e sem orientação médica. Dados do The Journal of Sexual Medicine.

Aos 40 anos a probabilidade de ter DE é de cerca de 40%. A cada década posterior o percentual aumenta em 10%.

150 milhões de homens em todo o mundo têm DE. Estima-se que, em 2025, eles somarão 322 milhões.

Os efeitos no seu corpo

O uso desnecessário e indiscriminado desse tipo de fármaco —os mais conhecidos são a sildenafila (Viagra) e a tadalafila (Cialis)— pode ter como resultado as seguintes situações:

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  • Interações medicamentosas
  • Dependência psicológica
  • Intensificação de efeitos colaterais

Você interfere na ação de outros medicamentos

O uso desse tipo de medicação junto a outras, especialmente as à base de nitratos (são exemplos a isossorbida, o nitrato de amila,etc.) —indicados para pessoas que tenham angina, aquele desconforto no peito causado pela falta de entrega de oxigênio para o músculo do coração—, podem levar à severa queda da pressão arterial (hipotensão).

Caso tenha conhecimento desse diagnóstico, antes de usar medicamentos para a DE, consulte um profissional da área da saúde para certificar-se de que é seguro utilizá-los.

Evite a compra de remédios para a DE sem conhecer sua origem. Eles podem ter ingredientes ativos desconhecidos, e podem colocar em risco sua saúde.

Fique longe dele também se já estiver fazendo outro tratamento para DE.

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Você não vai para a cama sem ele

Entre jovens saudáveis, o uso recreativo pode estar relacionado à falta de confiança sexual.

Quando isso ocorre por longo tempo, a consequência pode ser a dependência psicológica, ou seja, o indivíduo tem a percepção de que a ereção e a relação sexual só serão satisfatórias com o uso do remédio.

Na prática clínica observa-se que esse quadro é mais comum no início de relações afetivas: o jovem teme não ter um bom desempenho.

Mesmo que se sinta mais à vontade nessa circunstância, ao longo do tempo não será mais possível livrar-se do remédio, não porque este contenha algum componente que leve à dependência —a questão é psicológica.

Geralmente é nesta hora que o jovem procurará ajuda médica.

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Você acelera os efeitos colaterais

Quem utiliza o remédio por conta própria, exagera na dose e o usa repetidamente, facilita a manifestação de efeitos adversos e ainda mascara doenças que precisam [e devem] ser tratadas, mas são ignoradas.

Os efeitos mais comuns são dor de cabeça na região da testa, rubor facial, congestão nasal, alterações oculares (visão turva, sensibilidade à luz), tontura, azia. Geralmente esses efeitos são transitórios e se resolvem com a suspensão do medicamento.

Uma das mais preocupantes consequências do uso recreacional entre os jovens é o priapismo: uma ereção dolorosa e prolongada que pode levar a danos permanentes no tecido peniano.

Esse risco aumenta quando há consumo concomitante de drogas como cocaína e anfetaminas.

Trata-se de uma emergência médica que, quando não resolvida, pode resultar em DE irreversível, que só se resolverá com uma prótese ou outro tipo de tratamento.

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Os queridinhos

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Imagem: iStock

Usuários recreativos preferem Viagra e Cialis. Para quem tem DE, ou seja, a incapacidade de se obter ou manter uma ereção firme o suficiente para garantir uma atividade sexual satisfatória, eles são tidos como primeira linha de tratamento.

Classificados como inibidores PDE-5, eles atuam aumentando o fluxo sanguíneo no pênis por meio do bloqueio de uma enzima (a PDE-5), que desativa a ereção.

As medicações só agem quando o homem se sente estimulado.

Elas não aumentam o desejo (libido), nem a ejaculação ou a fertilidade. Além disso, não melhoram ereções normais.

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Alguns desses medicamentos têm ação prolongada (tadalafila), portanto são preferidos por quem faz o uso recreacional.

Funcionar, funciona - mas não é para todos

Os especialistas consultados afirmam que antes de iniciar o uso dessa classe de medicamentos, é melhor passar por uma avaliação médica porque eles não funcionam e nem são recomendados para todos os casos de DE.

Confira os grupos que devem estar mais atentos e evitar a automedicação:

Pessoas com insuficiência hepática e hipotensão (pressão baixa).

Homens com quadros de deformações na anatomia do pênis: angulações ou fibrose, como a doença de Peyronie, caracterizada pelo desenvolvimento de uma placa fibrosa no interior do pênis e que leva a uma curvatura.

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Pessoas com predisposição ao priapismo: portadores de anemia falciforme, mieloma múltiplo ou leucemia.

Indivíduos com doenças cardiovasculares; que tiveram infarto ou AVC (acidente vascular cerebral) recentemente, ou tenham arritmia não controlada.

Presença de doenças oculares como retinite pigmentosa.

Diabetes e hipertensão descontrolados.

Conselho médico

Procure por ajuda especializada caso observe dificuldade persistente para obter ou manter uma ereção.

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Isso pode indicar a presença de alguma outra condição de saúde que precisa ser diagnosticada e tratada.

Evite a automedicação de modo geral.

Uma visita ao médico antes de começar a usar determinado medicamento pode evitar surpresas e ainda traz a segurança de obter rápida intervenção, caso você apresente algum efeito colateral indesejável.

Para prevenir, comece por aqui

Para prevenir-se, invista em um estilo de vida saudável que garante não só saúde sexual, mas a saúde como um todo. Além disso, coloque em prática as seguintes medidas:

Pare de fumar.

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Limite o consumo de álcool (não mais que 2 doses diárias).

Fique longe de substâncias ilícitas.

Aprenda técnicas de relaxamento e tenha horas adequadas de sono e descanso.

Mantenha o peso adequado para você.

Exercite-se e priorize uma dieta equilibrada e pobre em gorduras para colaborar com a circulação sanguínea.

Mantenha o diabetes e a pressão sob controle.

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Converse abertamente sobre a vida sexual com sua/seu parceira/parceiro, e procure ajuda especializada caso observe que algo não vai bem.

Fontes: Amouni Mourad, farmacêutica, assessora técnica do CRF-SP (Conselho Regional de Farmácia do Estado de São Paulo) e coordenadora do curso de farmácia da Universidade Presbiteriana Mackenzie; Fernando Meyer, professor titular da disciplina de urologia e cirurgia minimamente invasiva da PUC-PR (Pontifícia Universidade Católica do Paraná); Henrique Donizetti Bianchi Florindo, chefe dos Ambulatórios de Andrologia e Cirurgia Reconstrutiva Uretral do HCFMRP (Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto) da USP, professor membro da SBU (Sociedade Brasileira de Urologia) da disciplina de reprodução do Departamento de Andrologia, Reprodução e Medicina Sexual; Marcelo Polacow, farmacêutico, mestre e doutor em farmacologia pela Unicamp (Universidade Estadual de Campinas) e presidente do CRF-SP (Conselho Regional de Farmácia em São Paulo). Revisão técnica: Henrique Donizetti Bianchi Florindo.

Referências: SBU (Sociedade Brasileira de Urologia); BAUS (British Association of Urological Surgeons).

Leslie SW, Sooriyamoorthy T. Erectile Dysfunction. [Atualizado em 2024 Jan 9]. In: StatPearls [Internet]. Treasure Island (FL): StatPearls Publishing; 2024 Jan-. Disponível em: https://www.ncbi.nlm.nih.gov/books/NBK562253/

Almannie R., et al. Recreational use of oral erectile dysfunction medications among male physicians - A cross-sectional study. Urol Ann. 2023. Disponível em 10.4103/ua.ua_33_22

Ferrini MG, Gonzalez-Cadavid NF, Rajfer J. Aging related erectile dysfunction-potential mechanism to halt or delay its onset. Transl Androl Urol. 2017. Disponível em
https://doi.org/10.21037/tau.2016.11.18

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Bechara, A. et al. Recreational Use of Phosphodiesterase Type 5 Inhibitors by Healthy Young Men, The Journal of Sexual Medicine, Volume 7, Issue 11, 2010. Disponível em https://doi.org/10.1111/j.1743-6109.2010.01965.x

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