Wegovy, 'irmão' do Ozempic contra obesidade, chega às farmácias em agosto
O Wegovy (semaglutida), "irmão" do Ozempic, chega às prateleiras das farmácias de todo o país no final do mês de agosto de 2024 (sem data específico). O Brasil será o 1º país da América Latina a disponibilizar o Wegovy para o tratamento de obesidade. Ele já está disponível em outros 10 países.
O que aconteceu
A Anvisa aprovou o remédio que trata a obesidade em janeiro de 2023. Em setembro do mesmo ano, ele também foi aprovado para o tratamento de adolescentes com obesidade.
O preço do Wegovy foi definido pela Cmed (Câmara de Regulação do Mercado de Medicamentos). O chamado PMC (preço máximo ao consumidor) varia de R$ 1.034,35 a R$ 2.634,03, a depender da versão do produto.
Os preços máximos ao consumidor, considerando as diferentes alíquotas de impostos estaduais praticadas no Brasil, já foram definidos pela Cmed e publicados em seu site, porém possivelmente não serão os preços encontrados pelos pacientes nos pontos de vendas quando os medicamentos chegarem ao mercado. Nota da Novo Nordisk, fabricante do Wegovy
O que explica a demora entre a aprovação pela Anvisa e a chegada ao consumidor é o excesso de demanda mundial. O medicamento não é fabricado no Brasil, ele é importado da Dinamarca. Trata-se de um remédio tarja vermelha, mas que não fica com a receita retida na farmácia. Ou seja, na teoria, qualquer um pode comprá-lo, no entanto, o uso indiscriminado e sem orientação médica não é recomendado.
A demanda foi além do que a gente esperava. E a obesidade é uma doença que não tem muitas opções terapêuticas disponíveis. Os EUA são um país muito populoso, e foi o primeiro país onde o Wegvoy foi lançado. Então esse aumento de demanda acabou impactando toda a produção. Aí não faz sentido você disponibilizar um medicamento e depois ele entrar em falta. Isso interrompe o tratamento. Priscila Mattar, diretora médica da Novo Nordisk Brasil
Wegovy e Ozempic têm o mesmo princípio ativo: a semaglutida. O Ozempic é um remédio para pessoas com diabetes e tem dosagem máxima de 1 mg. A perda de peso foi uma consequência natural do tratamento e por isso ele passou a ser prescrito para pessoas com obesidade de forma off label (não consta na bula para esse fim). Já o Wegovy tem uma dosagem máxima de 2,4 mg, e os estudos clínicos foram feitos especificamente para checar a sua eficácia e segurança no tratamento da obesidade. Nesse caso, é uma prescrição on label.
Trata-se de uma "injeção" em formato de caneta, disponível em cinco dosagens: 0,25 mg, 0,50 mg, 1 mg, 1,7 mg e 2,4 mg. O uso é semanal, com indicação de escalonar a dose até atingir a máxima.
É recomendado para o tratamento de adultos e crianças com 12 anos ou mais com obesidade, ou seja, IMC maior que 30, ou entre 27 e 30 e com a presença de pelo menos uma comorbidade relacionada ao peso (pré-diabetes, diabetes tipo 2, hipertensão, colesterol alto, apneia obstrutiva do sono ou doença cardiovascular).
A semaglutida simula a ação do GLP-1, hormônio que inibe a fome e regula o nível de açúcar no sangue (glicemia), por isso ele é eficaz tanto no tratamento do diabetes quanto da obesidade.
A semaglutida e os análogos de GLP-1 são medicações revolucionárias. As medicações mais antigas para obesidade tinham um prazo para serem usadas. Já as atuais já foram projetadas para serem utilizadas por períodos prolongados. Outro aspecto muito revolucionário é que o medicamento demonstrou um benefício cardiovascular. Além disso, permitiu uma perda de peso maior, com o Wegovy chega a se perder 15% do peso, com a tirzepatida, que é o Mounjaro [ainda não disponível para venda no Brasil], chega a se perder 20% do peso. São resultados muito superiores àqueles de outras medicações antiobesidade. Ricardo Barroso, diretor da SBEM-SP (Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabologia - Regional São Paulo)
Todo medicamento tem efeitos colaterais e por isso deve ser usado com orientação médica. Do Wegovy, os mais comuns são: problemas gastrointestinais: náuseas, diarreia, vômitos, constipação e dores abdominais; e como a pessoa come menos, é normal ter fadiga, tontura e sensação de falta de energia. Mais estudos sobre as medicações também são necessários para indicar os efeitos de longo prazo.
A semaglutida não deve ser utilizada com outros produtos que contenham a mesma substância ou com a liraglutida, por exemplo, indicada para tratamento do diabetes tipo 2.
Você não pode começar com uma dose terapêutica plena [máxima], tem que começar devagar. E só o médico vai poder orientar. O medicamento é muito potente, mas as mudanças de estilo de vida junto são fundamentais. Você pode ter uma experiência muito ruim se não tiver uma boa orientação desde o início. E aí pode até perder um benefício que seria muito bom, não só no curto prazo, mas no longo prazo. Priscila Mattar, diretora médica da Novo Nordisk Brasil
Os números da obesidade no Brasil
Obesidade é doença. Pela definição da OMS, é o excesso de gordura corporal em quantidade que determine prejuízos à saúde.
É uma doença multifatorial, são diversos fatores envolvidos na sua causa, não é apenas uma consequência da ingestão de calorias. O componente genético é importante, uma vez que muitas pessoas sem excesso de peso (e até mesmo magras) comem mal e não fazem exercícios físicos. Outros fatores podem influenciar, como a quantidade de horas de sono (pouco sono aumenta os hormônios que dão fome e reduz os que dão saciedade); o uso de alguns remédios (como antidepressivos); estresse, entre outros.
Com base nas tendências atuais, 48% dos adultos brasileiros terão obesidade até 2044 e 27% terão sobrepeso —assim, em 20 anos, 3/4 dos adultos brasileiros (75%) terão obesidade ou sobrepeso. Hoje, 56% dos adultos brasileiros têm obesidade ou sobrepeso hoje (34% com obesidade e 22% com sobrepeso). O estudo será apresentado hoje no Congresso Internacional de Obesidade 2024, que acontece em São Paulo.
Daqui a 20 anos, 130 milhões de adultos brasileiros viverão com sobrepeso ou obesidade (83 milhões com obesidade e 47 milhões com sobrepeso).
Esses dados são alarmantes e deixam claro que precisamos focar em políticas de prevenção e nos afastar do discurso 'conveniente' de que a obesidade é uma questão de hábitos e escolhas. Se não unificarmos esforços com governo e sociedade civil estaremos, ano após ano, congresso após congresso, apenas divulgando novos dados assustadores. Bruno Halpern, presidente da Abeso (Associação Brasileira para Estudo da Obesidade e Síndrome Metabólica)
O que a obesidade causa no organismo
A obesidade é uma doença crônica que está associada a 195 outras doenças, incluindo infarto, câncer e AVC.
No sistema cardiovascular: doença coronariana, arritmias, insuficiência cardíaca, hipertensão e AVC.
No sistema respiratório: apneia do sono, piora da asma e risco aumentado de pneumonia.
Na parte digestiva: refluxo, esofagite e gordura no fígado que pode evoluir para cirrose.
A obesidade também aumenta o risco de diabetes tipo 2, doença de Alzheimer e demência precoce.
Vários cânceres são mais frequentes em pessoas com obesidade, como os de útero, de vesícula biliar, de mama, de próstata, de ovário e de cólon.
Outro benefício muito interessante já verificado do Wegovy é redução de desfecho renal, de doença renal, que também é uma coisa prevalente entre as pessoas com obesidade. Priscila Mattar, diretora médica da Novo Nordisk Brasil
O ''boom'' das canetas emagrecedoras
Fatores como a perda rápida de peso, os efeitos colaterais "leves", a facilidade para comprá-las e, principalmente, o sucesso nas redes sociais impulsionaram o uso estético das canetas emagrecedoras no mundo todo.
Médicos dizem receber pacientes, em sua maioria mulheres, cada vez mais informadas e já pedindo pelas medicações na expectativa de perderem poucos quilos o mais rápido possível. Segundo especialistas, a única barreira contra o uso estético ainda mais desenfreado é o alto custo dos remédios.
Entidades médicas criticam o uso estético. A Abeso (Associação Brasileira para o Estudo da Obesidade e Síndrome Metabólica) e a SBEM (Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabologia) afirmam que a aplicação por quem não é obeso expõe pessoas sem indicação de uso aos efeitos colaterais; contribui para a escassez dos remédios, aumenta o estigma do tratamento de obesidade e sobrepeso para quem já sofre preconceitos.
O uso estético pode potencializar a perda de massa magra, sobretudo se a pessoa for sedentária. Pessoas já magras e que buscam com frequência métodos para perder peso podem ter transtornos de imagem e/ou alimentares.
As pessoas acham que usar somente a medicação vai resolver a questão da obesidade, não vai. A obesidade é uma doença multifatorial que exige um tratamento da mesma forma, multidisciplinar. Essa questão de você ter que mudar hábitos é imprescindível no tratamento com a semaglutida. Não é só um remédio milagroso. Um dos efeitos colaterais que o Wegovy pode dar é a perda de massa magra, então tentar atenuar esse efeito é imprescindível para um tratamento eficaz. Ricardo Barroso, diretor da SBEM-SP (Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabologia - Regional São Paulo)
Ao parar com os remédios, o impulso para diminuir o apetite cessa e as respostas de saciedade voltam ao normal entre semanas e meses. Se a pessoa não ajustou a dieta e não faz exercício, a tendência é que retome as escolhas pouco saudáveis de antes e ganhe peso.
'Quando que eu vou poder parar?' Não é incomum o paciente chegar no consultório e perguntar isso. Quando a gente perde peso, tem uma adaptação metabólica, mas o seu organismo sempre vai tentar voltar para o peso original e o maior peso. Se aumenta a fome, então libera na circulação hormônios de fome e o seu metabolismo cai. Existem até alguns medicamentos em desenvolvimento que tentam atenuar essa resposta metabólica que é muito cruel. Priscila Mattar, diretora médica da Novo Nordisk Brasil
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