Viagra também estimula libido de mulheres ou só funciona em homens?

No episódio 7 da terceira temporada da série Sex and the City (agora disponível na Netflix), a personagem Samantha toma Viagra e vive uma noite intensa de sexo e prazer.

O medicamento, cujo princípio ativo é o citrato de sildenafil, foi aprovado pela primeira vez pela FDA, a agência regulatória de alimentos e remédios dos Estados Unidos, em 1998, para tratar a disfunção erétil em homens. Ele aumenta o fluxo sanguíneo para o pênis, facilitando a obtenção e manutenção da ereção. No entanto, a eficácia do famoso comprimido azul no público feminino tem se mostrado inconsistente.

Segundo Rogério Felizi, ginecologista do Hospital Alemão Oswaldo Cruz, não existe comprovação científica para utilização desse medicamento com a mesma finalidade nas mulheres. "O que se supõe é que, por apresentar ação vasodilatadora, favorecendo a circulação sanguínea, pode ter alguma ação também no sistema genital feminino", afirma.

As pesquisas sobre o uso do sildenafil em mulheres apresentam resultados variados. Fabiene Vale, professora do Departamento de Ginecologia e Obstetrícia da Faculdade de Medicina da UFMG (Universidade Federal de Minas Gerais) e presidente da Comissão de Sexologia da Febrasgo (Federação Brasileira das Associações de Ginecologia e Obstetrícia), relata que em um estudo com cerca de 800 mulheres na pré e pós-menopausa com problemas de desejo, excitação, orgasmo e/ou dispareunia (dor durante o ato sexual) e que tomaram doses de 10 a 100 mg de sildenafil por 12 semanas, o medicamento não foi mais eficaz que um placebo em melhorar a função sexual ou aumentar a frequência de encontros sexuais satisfatórios.

Já outros ensaios sugerem benefícios para mulheres que experimentam disfunção sexual como efeito colateral de antidepressivos chamados ISRS (Inibidores Seletivos de Recaptação de Serotonina). "Um estudo com 98 mulheres demonstrou que, após oito semanas, aquelas que tomaram sildenafil tiveram uma melhora significativa na função sexual e na capacidade de atingir o orgasmo, comparadas às que tomaram placebo. No entanto, o medicamento não impactou o desejo sexual nem os níveis hormonais ou medidas de depressão", afirma Vale.

Riscos e efeitos colaterais

Assim como ocorre com os homens, o uso de Viagra por mulheres pode acarretar riscos e efeitos colaterais, como dores de cabeça, rubor facial, congestão nasal, indigestão e alterações na visão. Vale lembrar que o uso por elas não é aprovado pela Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) e sua eficácia e segurança em longo prazo para esse grupo populacional permanecem incertas.

Além disso, existe uma contraindicação muito importante: não se pode usar sildenafil em combinação com nitratos (um tipo de medicamento que pode ser necessário diariamente ou pontualmente em casos cardiológicos). Portanto, é fundamental consultar um profissional de saúde para avaliar cada situação específica.

Estimulante imediato para mulheres é algo complexo

Sobre a possibilidade de um equivalente feminino de estimulante imediato, a ginecologista do Hospital Sírio-Libanês Helga Marquesini afirma que a questão é muito mais complexa. Isso porque, enquanto o Viagra age principalmente na resposta fisiológica masculina, o desejo e a excitação nas mulheres são influenciados por uma complexa interação de fatores físicos, emocionais e relacionais, e o tratamento eficaz muitas vezes requer uma abordagem multifacetada.

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A especialista usa uma metáfora para explicar que, embora possam estar interconectados, a excitação e o desejo são coisas diferentes. "O desejo é a motivação, o querer. Por exemplo: quero comer bolo de chocolate. A excitação seria equivalente à salivação que aconteceu", diz.

Segundo Marquesini, para os homens, a concordância entre desejo e excitação costuma ocorrer de maneira mais alinhada do que para as mulheres, e provavelmente esse foi um motivo chave de o Viagra ter feito grande sucesso com o público masculino, mas não para o feminino.

Embora a percepção das mudanças físicas da excitação possa estimular o desejo sexual, não necessariamente isso irá ocorrer. Nas mulheres, essa não concordância entre desejo e excitação é mais frequente. Pode ocorrer lubrificação genital na mulher por estímulos de toques locais —e isso pode ser facilitado pelo Viagra—, mas a mente divaga por outros assuntos e/ou essa percepção do que ocorre no físico não está muito dentro do radar. "Dessa maneira, a experiência poderá não ter um resultado satisfatório mesmo com o uso da medicação e a presença de ereção do clitóris e de lubrificação", esclarece a ginecologista.

Uma sonhada pílula que provoque estimulação e aumento de libido imediatos para mulheres precisaria agir em várias frentes, com uma ação além da biologia e do jogo de hormônios e neurotransmissores. "Por enquanto, ainda não há uma substância que faça brotar desejo", diz Marquesini.

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