'Aos 21, descobri tumor de 6 cm e a médica falou que eu viveria só 6 meses'
Giulianna Nardini, 26, sentia dores nos seios, mas acreditava que eram da TPM. Até que percebeu um caroço e procurou um médico. Ela tinha esperança de não ser nada grave, mas o resultado da biópsia assustou: era um câncer agressivo —e o tumor tinha seis centímetros de diâmetro.
Em sua busca de tratamento, chegou a escutar de uma médica que estava com os dias contados. "Ela olhou meu exame, pegou na minha mão e falou: 'Você vai viver uns seis meses'. Fiquei em choque", disse a VivaBem. Veja o relato:
'Lágrima escorreu e percebi que era grave'
"Sentia muita dor na mama esquerda. No banho, quando a água caía, por exemplo, doía. Achava estranho, mas acreditava ser da TPM. Quando continuou doendo fora desse período, estranhei.
Certo dia, saindo do banho, senti ao me secar algo muito grande em meu seio, o que me assustou. Pedi para meu namorado sentir, para confirmar minha suspeita: ele colocou o dedo e arregalou os olhos. O interrompi porque não queria falar sobre aquilo.
Esperei uma semana até minha mãe voltar para casa e disse que tinha algo errado comigo. Ela imediatamente marcou uma consulta com o mastologista, que me examinou, viu um caroço no meu seio, mas quis me acalmar, dizendo que poderia não ser nada.
O médico me pediu uma biópsia para termos certeza.
Peguei o resultado, não abri, mas marquei uma consulta e voltei ao médico. Conforme ele lia, sua expressão foi ficando mais séria. Chegou a escorrer uma lágrima do seu olho e foi aí que percebi que era um problema grave. Eu tinha 21 anos na época.
'Você vai viver seis meses'
Ele me falou que eu estava com um câncer triplo-negativo e muito avançado. O tumor já tinha seis centímetros. Ficamos em choque.
Imediatamente, o médico ligou para um amigo oncologista, porque não tínhamos tempo a perder, e fui direto a outro consultório.
A oncologista me atendeu e perguntou se eu queria ter filhos, pois o tratamento poderia me deixar estéril. Precisava congelar óvulos naquele momento e teria de começar a estimulação naquele dia.
Ela acreditava nas minhas chances de cura, mas decidi procurar uma segunda opinião, porque queria ver se me indicavam tratamentos diferentes.
A segunda médica olhou meu exame, pegou na minha mão e falou: 'Você vai viver uns seis meses'. Eu fiquei em choque olhando para ela, que continuou dizendo que podíamos fazer o tratamento, mas que eu não aguentaria.
Era uma profissional de referência, mas não acho certo dizer para ninguém quanto tempo aquela pessoa tem de vida. Não acredito que médico tenha de nos dar prazo de validade. Eu nem tinha terminado de chorar ainda quando escutei isso, sabia do meu diagnóstico só há dois dias.
Fiquei em choque e comecei a achar que a médica era maluca. Não queria acreditar que o que ela dizia era verdade. Falei para minha mãe que com ela não queria me tratar. Não colocaria minha vida na mão de alguém que não acreditava na minha sobrevivência.
'Tumor crescia rápido'
Resolvi me tratar com o oncologista da minha mãe. Em menos de 15 dias, fiz todo o procedimento para congelar óvulos e, antes de começar o tratamento contra o câncer, fui induzida à menopausa com medicamentos e sofri todos os efeitos colaterais.
Começamos a quimioterapia, porque seria necessário o tumor diminuir antes da operação. Foram muitas sessões de químio e 25 de radioterapia —em algumas semanas, minha imunidade estava tão baixa que tínhamos de esperar para seguir o tratamento.
Mesmo com os remédios, uma mastectomia bilateral (a retirada dos dois seios) era indispensável. Não tinha metástase no meu tumor, mas ele era grande e crescia rápido.
Eu não tinha esse apego com meus seios, então não me abalou. Desde o começo meu médico já tinha explicado que existiria a necessidade —e que ele nem sabia se eu conseguiria colocar uma prótese no pós-tratamento, então, eu estava preparada.
Na cirurgia, o médico conseguiu colocar uma prótese expansora —que pode aumentar com o tempo. Fiquei feliz quando saí da cirurgia e soube que deu para colocar.
A recuperação não foi das mais fáceis. Fazer fisioterapia e não conseguir mexer os braços era muito ruim, mas era o melhor que eu podia fazer por mim, e o importante era sobreviver.
Quando terminei a radioterapia, ainda precisei passar por outros procedimentos. Fiz algumas pequenas cirurgias simples, como para tirar a válvula do silicone. E, claro, interrompi a medicação que me colocou na menopausa.
'Meu sonho é seguir a vida livre'
Meu tratamento durou cerca de três anos e não parei a faculdade. Era a única atividade que me fazia sentir que eu ainda era eu. Estudando, eu era aluna, não paciente. Conversamos com reitores e professores, pois eu conseguia ir presencialmente só uma vez por semana.
Percebi que estava conseguindo ganhar da doença quando o tumor começou a diminuir. Depois de dois meses de quimioterapia, quase não conseguia mais senti-lo no meu seio. E ele foi diminuindo, diminuindo, até não ter mais nenhuma atividade e eu poder retirá-lo de forma cirúrgica.
Depois de seis meses, os médicos me garantiram que daquele câncer eu não morreria. Eu não estava 100% curada, mas sabia que minhas chances estavam mais altas do que nunca. Foi a melhor notícia que recebi durante todo o tratamento [hoje, os exames de Giulianna estão normais, não detectam sinais de câncer].
Passei a usar minhas redes para falar abertamente sobre a doença. Quando comecei a quimioterapia, compartilhava o que estava passando como um diário. Uma amiga me contou que foi ao médico ao sentir um carocinho no seio por causa da minha história. E isso me deu um estalo: queria usar aquela ferramenta para ajudar as pessoas a prestarem atenção em seus corpos.
Brinco que não é fácil fazer planos a longo prazo depois de passar por essa doença. Acho que meu sonho é seguir a vida me sentindo livre, sem o medo constante do câncer, de ele voltar e eu ter de passar por tudo isso de novo.
Existe muito mais vida em torno de um câncer do que a gente consegue ver."
Teste e triplo-negativo
O fato de o câncer de Giulianna Nardini ser triplo-negativo o torna raro e agressivo. Significa que ele é negativo para os três biomarcadores mais importantes na definição do tratamento: receptor de estrógeno, receptor de progesterona e HER2.
O triplo-negativo é difícil de combater porque não reage aos três interruptores de divisão celular mais conhecidos. "Não conseguimos descobrir tratamento para o que não estamos vendo. É como se existisse um curto-circuito em uma parede e não conseguíssemos saber onde desligar", diz Fabiana Makdissi, líder do Centro de Referência em Tumores da Mama do A.C.Camargo Cancer Center.
Esse tipo de tumor é mais comum em pessoas que têm outros casos de câncer na família. Por isso, é importante uma testagem genética no paciente com triplo-negativo —e em seus filhos. Essa análise pode ser feita a partir dos 18 anos. No Brasil, isso ocorre apenas na rede privada.
Nos Estados Unidos, é recomendado que qualquer paciente que tenha um tumor triplo-negativo, de qualquer idade, faça um teste genético. Tendo isso em mãos, os médicos podem tratar de forma diferenciada toda a família.
Fabiana Makdissi
Há também a necessidade de começar um check-up mais cedo em pacientes com casos de triplo-negativo na família. "Se sua mãe teve câncer [do tipo triplo-negativo] aos 45, você precisaria, por exemplo, fazer sua primeira mamografia aos 35", diz Makdissi.
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