'Viciada, tinha 12 frascos de descongestionante em casa para não ficar sem'

Larissa Soares, 27, de Belo Horizonte, usou um frasco de descongestionante nasal a cada dois dias por dois anos. O uso da medicação era tão excessivo que ela mantinha o produto até debaixo do travesseiro. Em 2017, acordou assustada e surda de um ouvido após um rompimento no tímpano direito. A VivaBem, ela conta o que aconteceu.

"Convivo com a rinite alérgica desde a infância e é algo que me incomoda bastante. No início dos anos 2000, morava no subsolo da casa dos meus avós, era um local que acumulava poeira.

Não nos faltava nada, mas não tínhamos condição financeira que nos permitisse pagar um tratamento. Dessa forma, meu nariz ficava constantemente entupido e com bastante secreção, principalmente em períodos de seca.

Meu tímpano direito foi rompido em 2017. Tinha ido a um show aqui em Belo Horizonte e quando cheguei em casa, usei descongestionante nasal, como já era de costume, e dormi.

Durante a madrugada, acordei com uma dor absurda no ouvido direito. Acordei com sangue no travesseiro e muita dor. Não estava ouvindo do lado direito. Após alguns exames feitos por um médico otorrinolaringologista, houve a confirmação do rompimento total do meu tímpano direito.

Ele me disse ainda que demoraria de quatro a sete meses para que o meu tímpano se regenerasse por completo e que não teria sequelas posteriores. A suspeita inicial era que o rompimento tivesse ocorrido por conta do som.

Porém, meu rompimento de tímpano foi causado pela rinite medicamentosa, um efeito reverso do descongestionante nasal [vasoconstritor tópico nasal de cloridrato de nafazolina], segundo o que me foi dito pelo especialista na época.

Larissa Soares é médica veterinária
Larissa Soares é médica veterinária Imagem: Arquivo pessoal

Aos 20 anos, tinha uma rotina de uso bem caótica com o descongestionante nasal. Usava um frasco dele a cada dois dias e tinha 12 embalagens espalhadas pela minha casa, bolsa e embaixo do travesseiro, para garantir que não ficaria sem em nenhum momento.

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Tive esse vício no descongestionante nasal por dois anos. Meu nariz desentupia, mas logo congestionava de novo. O rompimento do tímpano direito impactou minha vida porque fiquei surda de um ouvido por três meses.

A audição voltou aos poucos, começou a acontecer no segundo mês desde o rompimento. Ouvia tudo extremamente abafado, como se estivesse debaixo d'água. Apenas depois de quatro meses, comecei a ouvir tudo perfeitamente.

Esse período de surdez ocorreu quando estava finalizando um semestre da faculdade. Sou médica veterinária de formação e isso dificultou muito minha vida, principalmente na apresentação dos trabalhos e em conseguir ouvir os professores nas aulas.

Ter que interromper de forma brusca o uso do descongestionante nasal foi a parte mais complexa do meu vício, porque me foram passados outros medicamentos, que não tinham aquele efeito imediato, entre eles um colírio cicatrizante pro tímpano.

Também usei limpador nasal e fiz inalação nesse processo de cura. Esse tratamento em si não me causava dor ou incômodo. O maior desafio na verdade foi entender esse vício e respeitar o tempo necessário para voltar a ouvir.

Desde que tratei a rinite medicamentosa, não usei mais descongestionantes nasais e recomendo que cada um que queira usar, consulte com um médico otorrinolaringologista para saber se é o tratamento mais adequado."

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Descongestionantes nasais são perigosos?

Como qualquer medicamento, os descongestionantes nasais têm contraindicações. As principais complicações do uso deles são:

  • taquicardia
  • palpitação no coração
  • tontura
  • agitação
  • ansiedade
  • náusea

Descongestionantes nasais são vasoconstritores, ou seja, são medicamentos que contraem os vasos sanguíneos. De acordo com Luciano Gregório, médico otorrinolaringologista do Hospital Israelita Albert Einstein (SP), temos no coração os mesmos receptores do nariz.

Isso significa que quando o paciente utiliza um descongestionante nasal para respirar melhor, o coração também vai sentir o efeito desse medicamento. Luciano Gregório, otorrinolaringologista

O médico acrescenta ainda que o uso eventual de descongestionantes nasais para pacientes não cardiopatas é benéfico, principalmente nos casos de gripe, resfriado, sinusite aguda, mas o uso deve ser recomendado por um médico otorrinolaringologista e sempre deve ser acompanhado.

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"Costumamos recomendar o uso de descongestionantes nasais por dois a três dias, no período noturno, para o paciente ter um conforto ao dormir. O uso recorrente é realmente perigoso e pode causar efeitos cardíacos ou ansiedade", detalha Gregório.

Tanto ele quanto o também médico otorrinolaringologista Olavo Mion, do Hospital Sírio-Libanês (SP), disseram que o uso isolado de descongestionante nasal dificilmente causará um rompimento de tímpano.

Para eles, o descongestionante nasal não necessariamente foi a causa do rompimento de tímpano, mas um fator contribuinte para algo externo ou condição pré-existente. Como exemplo, é possível citar a rinite, pois desequilibra a pressão do ouvido.

"O uso descontrolado do descongestionante nasal causa um efeito rebote [taquifilaxia]. Quanto mais o paciente aplica no nariz, menos a medicação vai fazer efeito. O paciente vai querer usar mais, mas vai ficar com o nariz cada vez mais entupido", diz Gregório.

O tímpano pode ser perfurado por som alto, introdução de objetos (como hastes flexíveis e grampos), aumento de pressão contra a membrana timpânica, ou até mesmo alguma infecção de repetição no ouvido, que aumenta o fluido e a inflamação na região.

Infecções virais ou bacterianas, como resfriados e sinusites, também podem se espalhar para o ouvido e romper o tímpano.

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Também há perfurações que acontecem por conta do uso da lavagem nasal, quando a água chega à tuba auditiva.

"A perfuração timpânica ocorre após um trauma na região ou uma variação de pressão alta o suficiente para isso. É comum após a introdução de objetos no canal auditivo ou após um tapa no ouvido, uma queda na água, por exemplo", relata Gregório.

Solução nasal é diferente de descongestionante? É mais seguro?

Olavio Mion destaca que toda solução nasal limpa o nariz, mas não necessariamente é categorizada como um descongestionante nasal. O uso de soro fisiológico para lavagem nasal é importante para a saúde.

"O uso do soro auxilia a limpeza do nariz ao fazer com que a mucosa fique livre de agentes como poluição, fumaça, ou algum causador de rinite como ácaros, pólen e pelos de cão e gato. O nariz agradece e todos respiram melhor", tranquiliza.

Ao comprar um produto para aliviar a congestão nasal com aplicação em gotas ou sprays, é importante avaliar se há composição de nafazolina ou oximetazolina.

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O soro fisiológico por si só (cloreto de sódio) não apresenta riscos, pois não causa efeito rebote.

O uso do soro para lavagem nasal pode ser feito de diversas formas. Em gotas, sprays, seringas ou dispositivos de alto volume, conhecidos como garrafinhas. Só haverá risco se a pessoa fizer o procedimento de alto volume de modo incorreto.

"Quando se usa uma lavagem nasal com alto volume, como com os frascos grandes (garrafinhas) ou seringas, e com alta pressão, o líquido pode atingir a região da tuba auditiva, causando inflamação local, o que gera dor de ouvido (otalgia) e pode até gerar otite (infecção do ouvido) em alguns casos", afirma Mion.

Entre os riscos da lavagem nasal inadequada estão dor e ardor nas narinas, sangramento nasal e dor de ouvido. Já os descongestionantes nasais reduzem o edema da mucosa nasal e diminuem a formação de muco nessas áreas, temporariamente.

"Pode-se usar o soro fisiológico em aplicação em spray ou gotas. No caso das seringas e garrafinhas, preferencialmente após a indicação médica. Siga as orientações médicas e da bula. Quanto menos pressão e menos volume, mais segura é a limpeza", conclui o médico.

O que fazer após o rompimento do tímpano?

Quando o tímpano é rompido, é essencial que o ouvido se mantenha o mais seco possível. Proteja o canal auditivo durante o banho, evitando que a água entre e não mergulhe numa piscina ou no mar. É possível ainda usar protetores auriculares.

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"Além disso, procure imediatamente um médico otorrinolaringologista e não coloque nada no ouvido. Também não use qualquer medicação. Apenas um especialista saberá avaliar o caso e indicar a melhor conduta", alerta Mion.

Como funciona o tratamento contra a rinite medicamentosa?

O tratamento contra a rinite medicamentosa envolve a interrupção gradual do uso de descongestionantes nasais sob a supervisão de um médico otorrinolaringologista. Ele também pode indicar corticosteroides nasais e anti-histamínicos.

Também são opções de tratamento a lavagem nasal com soro fisiológico, para remover substâncias irritantes e reduzir a congestão e a inalação de vapor para alívio temporário da congestão nasal. O tempo de tratamento depende do caso.

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