'Meu bebê foi diagnosticado com câncer uma semana depois do nascimento'

A empreendedora Caroline Malta, de 29 anos, teve um pré-natal tranquilo na gravidez do segundo filho, o Vicente. Após o nascimento dele, a família foi para casa, em Porto Alegre, e a adaptação do bebê aconteceu sem problemas.

Cinco dias depois que Vicente nasceu, Caroline foi orientada por uma enfermeira a procurar a maternidade porque ele tinha dificuldades para respirar. O diagnóstico de um câncer raro e sem cura chegou em menos de uma semana.

Ao VivaBem, Caroline conta sobre os três meses que viveu na UTI com o filho, e como foi a descoberta de uma doença já em estágio grave, sem chance de tratamento, em um bebê tão pequeno.

'Tudo começou a desandar'

"Vicente nasceu no dia 11 de julho de 2018. É meu segundo filho: antes dele, tive o Antônio, que hoje tem nove anos. Tive uma gravidez completamente tranquila, sem intercorrência, fiz todas as ecografias e ele estava perfeito.

Ele nasceu de mais de 40 semanas, de parto normal e tivemos alta para ir para casa, mas, cinco dias depois, tudo começou a desandar. A primeira coisa que achei estranha, como eu já tinha tido um filho antes, era que ele mamava muito pouco.

O pequeno Vicente
O pequeno Vicente Imagem: Arquivo Pessoal

Isso me assustava um pouco, porque meu primeiro filho mamava demais, o tempo inteiro. O Vicente dormia muito, mamava pouco e era bem gordo. A gente achava que ele devia ter uma boa reserva, porque tinha poucos dias de nascido.

No dia 16 de julho, a gente o levou para fazer o teste do pezinho. A enfermeira falou para irmos correndo ao hospital porque ele tinha alguma dificuldade respiratória grande, que poderia ser pneumonia.

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Fomos correndo para onde ele nasceu e fizeram mil e uma perguntas sobre se tinha acontecido alguma coisa em casa —porque ele saiu do hospital super bem. Internaram e começaram a procurar.

Não achavam nada: a tomografia dele estava limpa, outros exames estavam normais. Foi quando uma médica pediu uma tomografia da cabeça. Durante o exame, resolveram fazer uma ressonância para enxergar melhor o que estava acontecendo.

Era um tumor muito grande para o tamanho da cabeça dele —tinha o tamanho de um limão. Por causa da localização, não tinha como fazer biópsia. Ele já foi para a cirurgia para retirá-lo e só depois soubemos qual tumor era.

O Vicente teve um tumor teratoide rabdoide atípico. Eles conseguiram retirar 95% dele, mas ficou um pedaço. Não tinha tratamento, então entraram com uma quimioterapia paliativa apenas para ele não sentir dor.

Não tinha mais o que fazer: a única cura possível seria retirar o tumor inteiro, mas, quando foram refazer a ressonância, no domingo [11 dias depois do nascimento], já tinha metástase na coluna. Era tudo muito rápido.

O médico pegou todas as ecografias que eu tinha feito [no pré-natal] e estava tudo perfeito. Não tinha sinal nenhum de câncer, de tumor, nem na coluna e nem no cérebro. Ele disse que era como se o Vicente tivesse nascido e alguém tivesse colocado o tumor nele com a mão.

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'Sabíamos que não teria cura'

Ele fez três ciclos de quimioterapia, mas a gente já sabia que não teria cura.

Tive de tirar forças não sei de onde para lidar com essa situação. Ficava seis horas em casa e o resto do tempo na UTI com ele. Eu tirava leite, mas ele nunca mais conseguiu mamar —a última vez foi em casa. Depois, foi apenas a alimentação parenteral [na corrente sanguínea].

Vivia um dia após o outro. Perto do Dia das Crianças, os médicos nos deram alta. O Vicente tinha traqueostomia e me ensinaram como aspirar. A alta, antes do terceiro ciclo de quimioterapia, foi para a gente ficar em casa e se despedir.

A coluna dele já estava tomada com a metástase. Trouxemos ele para casa com o respirador, morfina. Fiz tudo por ele, virei uma enfermeira. Lidei do jeito que eu nem imaginava que sabia lidar com uma criança que precisava de cuidados especiais.

Ele faleceu no dia 2 de novembro de 2018. Enquanto ainda estava vivo, fizemos um exame que mostrou que o câncer dele era genético. E, na nossa família, muita gente morreu de câncer. Fez sentido.

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'Não estava curada ainda'

Meses depois, eu engravidei do Otávio, no auge da loucura. Não era esperado, eu não estava curada ainda, mas precisava ter uma criança viva nos meus braços e era só isso o que eu pensava: queria ter um filho de novo.

Durante a gravidez, eu estava anestesiada, não pensava muito, mas quando ele nasceu eu fiquei com muito medo. Chorei por um mês. Ele nasceu em dezembro de 2019, muito pequenininho, mas saudável.

'Precisava conversar'

Comecei a dividir a história do Vicente na pandemia, quando fiz um canal no YouTube. Quando o Otávio nasceu, eu precisava conversar com alguém. Meu marido trabalha viajando e eu ficava em casa sozinha com os dois. Não tinha como dividir o que eu sentia com os pequenininhos porque eles não entenderiam.

Quando comecei a falar sobre o assunto na internet, o vídeo viralizou e muitas mães começavam a ficar preocupadas —o que também me deixava preocupada. Será que estou colocando medo nas mulheres grávidas?

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Mas outras achavam legal eu compartilhar, porque nunca tinham ouvido falar de algo assim. Foi uma coisa muito rápida e tudo muito intenso, marcante. Acho que algum propósito teve para me acontecer isso.

Muitas mães de bebês que tiveram o mesmo tumor do Vicente me procuraram porque não tinham com quem falar sobre isso, já que é um tumor raro. Então, trocamos figurinhas sobre nossas histórias."

O que é teratoide rabdoide atípico

Câncer no cérebro. O tumor teratoide rabnoide atípico é um câncer agressivo e raro que atinge o sistema nervoso central e tem frequência mais comum em bebês e crianças de até 3 anos. Apesar dos avanços da oncologia pediátrica, a cura ainda é considerada um desafio.

[É um tumor com] um prognóstico bem difícil. É muito difícil que a gente consiga realmente ter uma cura completa dos pacientes que tenham esse diagnóstico.
Viviane Sonaglio, líder do Centro de Referência de Tumores Pediátricos do A.C.Camargo Cancer Center

Crescimento rápido. Em geral, o tumor aparece na região onde fica o cerebelo e o tronco cerebral. Em casos de metástase, ele pode se disseminar para a coluna ou para a parte superior da cabeça.

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Diagnóstico complicado. "Por mais que a gente esteja diante de um pediatra muito experiente, os sinais iniciais do câncer infantil são discretos. Conforme a doença vai avançando, se torna mais claro o quadro clínico e mais fácil o diagnóstico", avalia a profissional.

Tamanho da cabeça pode ajudar a identificar tumor. Segundo a oncologista, existe um padrão de crescimento da circunferência da cabeça. "A cabeça da criança vai crescer um centímetro por mês. Se estiver fugindo desse padrão, é preciso fazer uma investigação."

E quando a criança é maior? "Quando uma criança já tem o crânio fechado, qualquer aumento de volume pode causar uma manifestação clínica, como dor de cabeça, alteração visual, vômito, porque há pouco espaço para expandir [dentro do crânio]", explica Viviane.

Diagnóstico no pré-natal é possível? Segundo a profissional, o diagnóstico antes do nascimento pode acontecer, mas não é uma regra. Isso vai depender do tamanho e localização do tumor. "Às vezes, você consegue visualizar o tumor no bebê dentro da barriga da mãe e, às vezes, vê sinais indiretos de que alguma coisa não está normal. E aí, sim, é feita uma investigação."

Tratamentos disponíveis. A oncologista afirma que a primeira abordagem diante deste tipo de tumor é cirúrgica, e a possibilidade de o tumor ser ressecado neste momento é um ponto importante no tratamento. Depois, diferentes protocolos podem ser seguidos, a depender do paciente. Eles incluem quimioterapia e até transplante de medula autólogo.

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