Língua bifurcada, chifres e mais: qual o perigo das modificações extremas?
Giovanna Arruda*
Colaboração para VivaBem
02/08/2024 05h30
Diferentes cirurgias têm como objetivo alterar de forma drástica a aparência. Implantação de chifres, tatuagens nos olhos e retirada das orelhas são exemplos de intervenções, mas as modificações extremas carregam consigo riscos.
Diabão, Homem-lagarto e Alien Negro são alguns dos adeptos das modificações corporais extremas e famosos por elas. Nesta semana, Andressa Urach virou assunto ao publicar que havia passado por um procedimento para cortar a língua ao meio —a chamada bifurcação lingual, outra intervenção arriscada.
O que aconteceu
Andressa Urach passou por procedimento para cortar a língua ao meio. A atriz tem feito uma espécie de diário em que relata como está sendo o pós-operatório da bifurcação do órgão.
Procedimento causou polêmica e fez com que Andressa recebesse críticas em suas postagens. Nos comentários dos vídeos ilustrando a recuperação de sua língua, Andressa vem sendo duramente criticada pelos internautas, que questionam a necessidade do procedimento e debatem até mesmo um eventual mau hálito causado pela cirurgia.
Os riscos das modificações extremas
Bifurcação da língua
Como Andressa Urach, diversos outros nomes passaram pelo procedimento de partir a língua ao meio. Erik Sprague, conhecido como "homem-lagarto", fez uma série de mudanças para parecer o réptil que está em seu apelido. Além de tatuar todo o corpo com desenhos de escamas verdes e serrar os dentes, Sprague cortou a língua na tentativa de se assemelhar ainda mais a um lagarto.
A bissecção lingual pode provocar hemorragia e causar modificações na fala, respiração, deglutição, no paladar, nos dentes, na gengiva e nos nervos locais. Caso o corte seja malfeito, por um objeto não esterilizado ou a cicatrização não aconteça de maneira satisfatória, são altas as chances de desenvolvimento de infecções que podem causar dor, sangramentos e mau cheiro.
Reverter a bifurcação é possível, mas para a língua fechar totalmente leva tempo, em um processo com muito sofrimento.
Dentes lixados
Um homem lixou os dentes para se assemelhar a um animal: Dennis Avner, conhecido como "homem-gato". Avner tatuou o rosto todo com listras, modificou o formato dos olhos e lábios e desgastou os dentes para que ficassem afiados como presas. Avner morreu em 2012, em Las Vegas, nos Estados Unidos.
Ter toda a dentição afiada pode ferir a boca o tempo todo, além de causar problemas de mastigação, deglutição e digestão (pois os alimentos acabam não sendo triturados da maneira adequada), nos músculos, ossos e nervos (dores crônicas e deformidades). A perda do esmalte prejudica a resistência e a proteção do dente, que amolece e cai.
Chifres, tatuagem nos olhos, retirada de nariz e orelha
Diabão, apelido do tatuador Michel Faro Praddo, é um dos maiores nomes na prática de modificações extremas, sendo adepto de diversos procedimentos arriscados:. Ele também tem a língua bipartida, além de olhos tatuados e orelhas, nariz, mamilos e dedo anelar retirados. Diabão também colocou implantes em forma de chifres em sua testa.
Implantes em diferentes formatos, como os que imitam chifres, formam um alto-relevo e podem ser feitos de silicone, osso ou metal. Existem versões subcutâneas e outras que ficam com uma parte dentro e outra por fora da pele.
Os implantes colocados superficialmente, ou entre gordura e músculo ou osso, podem desencadear inflamações e granulomas ("calombos" que surgem para defender o organismo de um agente prejudicial, formando uma fibrose retirada somente com cirurgia). Caso o implante seja feito em local insalubre, há mais risco de infecção.
Nos Estados Unidos, o método de escurecer o "branco dos olhos" é conhecido por "eyeball tattoo" e consiste em injetar tinta preta no globo ocular, entre a camada conjuntiva e a esclera. Um procedimento perigoso, irreversível e desaconselhado pela SBO (Sociedade Brasileira de Oftalmologia). Além da dor intensa após a aplicação e que faz o paciente chorar por dias lágrimas pretas, o procedimento pode causar inflamação interna e levar à perda de visão.
Retirar o nariz pode levar a um aumento nas infecções respiratórias como a pneumonia. Sem o nariz, não há filtragem de impurezas, de microrganismos e nem o aquecimento do ar que entra nos pulmões. Faringites, acúmulo de secreções, necrose e contaminação por insetos são alguns riscos da intervenção.
Já a retirada das orelhas pode causar problemas auditivos ao longo da vida. As orelhas têm angulação para captar sons que são direcionados para o condutor auditivo (parte interna da orelha, dentro do ouvido), amplificando aquele som. Sem essa capacidade, a audição pode ficar prejudicada.
Outra função muito importante do pavilhão auricular (parte externa da orelha) é ajudar no senso de localização do indivíduo. A capacidade de localização sonora acontece por termos duas orelhas. Segundo Diabão, ele ainda é capaz de ouvir, já que retirou as orelhas, mas não tampou os ouvidos.
Abertura de "segunda boca"
O francês Anthony Loffredo, apelidado de Alien Negro, passa por modificações corporais com o objetivo de parecer um extraterreste. Um dos procedimentos realizados por Loffredo consistiu na abertura na musculatura entre os lábios e o queixo, formando um corte por onde o Alien Negro consegue passar a língua.
As complicações desse tipo de cirurgia são principalmente odontológicas: diminuição na quantidade de saliva, favorecimento do surgimento de cáries, exposição da raiz dos dentes, falta da devida proteção contra infecções, além de dificuldades para se alimentar, já que a comida pode cair pelo buraco.
Reversão é impossível em alguns casos
Alguns dos procedimentos citados podem ser revertidos caso o paciente se arrependa. Outros, como a tatuagem nos olhos, não apresentam possibilidade de reversão total.
Caso haja alguma reversão, todos os riscos de infecção se repetem. Todo e qualquer tipo de modificação corporal extrema deve ser realizada somente por profissionais habilitados e depois de avaliação de todos os possíveis riscos e efeitos colaterais a curto, médio e longo prazo.
*Fontes: David Barros, cirurgião dentista pela EBMSP (Escola Bahiana de Medicina e Saúde Pública), em Salvador; Edson Rodrigues de Paula Neto, cirurgião dentista, diretor da Clínica All Smiles e membro da APCD (Associação Paulista de Cirurgiões Dentistas); Wendell Uguetto, cirurgião plástico do Hospital Israelita Albert Einstein (SP); Leonardo Marculino, oftalmologista do Hospital Cema (SP); Fernão Bevilacqua, otorrinolaringologista do Hospital Albert Sabin, em São Paulo.
*Com informações de matérias publicadas em 13/04/2022, 15/06/2022 e 24/08/2022