'Parte mais linda dele', diz mãe de menino com pés em forma de coração
Maurício Businari
Colaboração para o UOL
09/08/2024 05h30
Com apenas um ano, o pequeno Matteo vem chamando a atenção na internet porque seus pés possuem uma característica única: são formados de maneira que se assemelham a corações. Para muitos, essa singularidade pode parecer apenas uma peculiaridade, mas para a mãe do menino a descoberta desse detalhe gerou uma profunda mudança na maneira como ela vê a vida de seu filho.
O que aconteceu
A jornada de Matteo começou com um diagnóstico de ectrodactilia, que abalou profundamente a mãe, a dona-de-casa Letícia Landim, 36. A criança havia nascido com uma condição que faz com que os dedos das mãos e dos pés se desenvolvam de forma incomum. Ela conta que, ao saber da condição do filho, ficou desesperada. "Chorei muito, passei mal. Eu fiquei aterrorizada", disse em entrevista a VivaBem.
Matteo também nasceu com displasia renal bilateral, uma condição grave que afeta o funcionamento dos rins. "O maior desafio foi a condição renal dele. Receber a notícia de que ele poderia não sobreviver foi devastador", conta Letícia, visivelmente emocionada. "O medo de perder meu filho foi o que mais me consumiu".
O engenheiro de segurança do trabalho Renan Barboza, 40, pai do menino, e a irmã, Nicolly, 10, também foram impactados com os diagnósticos. Porém, contam que, ao longo do tempo, o sorriso cativante e a vontade de viver de Matteo encheu seus corações de esperança e amor.
Quando recebi a notícia sobre o problema congênito do meu filho, foi como se o chão tivesse desaparecido sob meus pés. Lembro-me claramente daquele momento - o consultório médico, o som abafado dos equipamentos, e a voz do médico explicando algo que parecia surreal. Senti uma onda de frustração e desespero, uma surpresa indesejada que tomou conta de mim. Era difícil processar que meu filho, tão pequeno e vulnerável, já tinha um obstáculo tão grande a enfrentar.
Renan Barboza
Renan conta que, passado o choque inicial, algo dentro dele mudou. Ele diz que percebeu que, apesar das suas limitações humanas, ele tinha uma escolha: deixar a frustração o consumir ou transformá-la em uma força motriz.
Escolhi a segunda opção. Usei essa energia ruim como combustível para agir e fazer o que era necessário. Comecei a buscar informações, consultar especialistas, e me preparar para os desafios que viriam. Cada pequena vitória, cada novo passo no tratamento do meu filho, era um lembrete de que essa energia transformada estava valendo a pena. Aprendi a apreciar cada conquista, por menor que fosse, e a ver o mundo através dos olhos dele, cheio de coragem e determinação.
Renan Barboza
Nicolly, irmã de Matteo, concorda com o pai e afirma que a força de vontade do irmão a fez enxergar a situação com positividade. Ela diz que não se incomodou com a má-formação das mãos e pés do irmão. Mas ficou assustada quando soube da displasia renal.
Quando eu descobri da mãozinha e do pezinho dele, eu vi o formatinho, eu me senti mais apaixonada, eu nunca senti um amor tão grande como o que sinto por ele. Quando descobri sobre o rim dele, fiquei muito preocupada, fiquei com medo de ele não aguentar. Toda vez que eu me lembrava, chorava, não aguentava. Mas percebi que se eu tivesse fé ele ia sobreviver. Aí comecei a acreditar que ele ia sobreviver.
Nicolly Barboza
Apoio, conexão e modelagem
Na tentativa de encontrar apoio e conectar-se com outras famílias em situações semelhantes, Letícia criou um perfil no Instagram para Matteo. "Eu queria encontrar pessoas que pudessem compartilhar experiências semelhantes. No início, a ideia era que eu pudesse aprender com elas e encontrar um pouco de conforto", explica.
O perfil, com mais de 26 mil seguidores, não só permitiu a Letícia descobrir uma rede de apoio, como também revelou um aspecto fascinante: a comparação dos pés de Matteo com corações. Essa observação veio de sua irmã Jéssica, a primeira a notar a semelhança. "Ela disse: 'O pezinho dele parece um coração.' Quando eu finalmente pude ver isso, concordei. Era realmente um coração, e isso trouxe um novo sentido para nós", lembra Letícia.
Acompanhado de um sorriso constante, Matteo desafiou as expectativas iniciais de Letícia. "Ele supera todas as expectativas que eu tinha. A preocupação que eu tinha antes foi em vão. Ele é uma criança incrível e tem me surpreendido a cada dia", afirma com um sorriso de orgulho.
A situação de Matteo também trouxe mudanças significativas para a família. Com as internações frequentes e os desafios médicos, Letícia e sua família passaram por momentos de intenso sofrimento e apoio mútuo. "Era um apoiando o outro, todos precisando de apoio. Emocionalmente, foi muito difícil para todos nós", revela.
Com o tempo, a necessidade de um transplante renal tornou-se iminente, e a família se preparou para mais uma etapa na jornada de Matteo. "Ele está prestes a entrar na fila para o transplante, e apesar de todas as dificuldades, eu confio plenamente nele. Sei que ele vai superar isso também", diz Letícia com esperança renovada.
A última reviravolta na vida de Matteo veio por meio de uma inesperada oportunidade no mundo da moda. Uma agência de modelos entrou em contato com Letícia após ver o perfil de Matteo no Instagram.
Eu estava cética no início, mas decidi dar uma chance. E, para minha surpresa, Matteo começou a trabalhar como modelo. Foi um orgulho imenso ver que as pessoas enxergam a beleza que eu sempre vi nele. Eu dizia para mim: 'já pensou se realmente dá certo as pessoas terem conhecimento desse coraçãozinho que ele tem no pé?' Eu sinto o maior orgulho, eu acho que é a parte mais linda do Matheu
Letícia Landim
Ausência congênita
A ectrodactilia é considerada uma característica rara, estima-se que acometa cerca de um a cada 90 mil a 150 mil nascidos.
É uma forma de ausência congênita [desde o nascimento] de um ou mais dedos que envolve os raios centrais do pé e da mão e faz parte do grupo de síndromes denominadas 'malformações mão-pé divididas.
Como se faz diagnóstico e tratamento?
Com casos de ectrodactilia ou de outras síndromes autossômicas dominantes na família (de Goltz, Rapp-Hodgkin, Hay-Wells), o mapeamento genético é indicado, e sendo gestante, um acompanhamento pré-natal.
O exame de ultrassonografia obstétrica ajuda a diagnosticar malformações e anomalias congênitas associadas no primeiro trimestre de gestação e permite também um envolvimento precoce de uma equipe multidisciplinar no cuidado da criança.
Logo após o nascimento deve ser realizado um exame físico, especialmente na apresentação sindrômica da doença, e de imagem (o mais solicitado costuma ser a radiografia), para nortear a equipe médica e, eventualmente, intervenções. Na maioria das vezes, a reabilitação é o principal tratamento, pois não há possibilidade de reversão completa da deficiência.
Com informações de reportagem publicada em 16/11/2023.