Dependência e ereção 'eterna': uso recreativo de Viagra e 'tadala' preocupa

As redes sociais e os espaços de propaganda dos mais diversos sites estão repletos de anúncios que oferecem acesso fácil a medicamentos de disfunção erétil como Viagra, Cialis e seus equivalentes. Muitos homens veem nesses fármacos a esperança de melhorar o desempenho sexual, mas o uso recreativo dessas drogas pode trazer sérios riscos à saúde física e mental.

Os medicamentos para o tratamento da disfunção erétil pertencem à classe dos inibidores da fosfodiesterase tipo 5, ou IPDE5. No Brasil, além do sildenafil (princípio ativo do Viagra), temos também o tadalafila (Cialis), vardenafila (Levitra), lodenafila (Helleva) e udenafila (Zydena).

Todos eles têm o objetivo de causar uma vasodilatação das artérias do pênis e corpo cavernoso, promovendo a manutenção da ereção. As principais diferenças entre essas drogas são a dose, o tempo para início da ação e duração do efeito. A questão é que os medicamentos não são de venda controlada, ou seja, podem ser comprados sem receita médica —e aí é que está o perigo.

Se você consegue ter uma ereção boa o suficiente para permitir a penetração, provavelmente não tem disfunção erétil e não precisa de medicamentos. Mas muitos homens acabam utilizando como forma de compensar o uso de álcool ou drogas, para permitir sessões mais longas ou várias delas e também para aumentar a confiança.

Perigo de dependência psicológica

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Usar medicamentos de disfunção erétil para aumentar a confiança pode levar muitos homens a se preocuparem em só fazer sexo se tiverem tomado o comprimido. Essa ansiedade excessiva quando não se usa o medicamento pode induzir a um problema que a pessoa não tinha.

O uso indiscriminado dessas medicações, sem a correta indicação, pode gerar uma dependência psicológica nos usuários, de forma que um indivíduo normal passe a ter dificuldades em ter ereções e relações sexuais sem o uso do comprimido. Arie Carneiro, urologista do Hospital Israelita Albert Einstein

Por isso, não é recomendável que pessoas que não têm disfunção erétil utilizem esses medicamentos de maneira indiscriminada. "Em caso de dificuldade em manter ereções ou outros sintomas sexuais, os homens devem procurar consulta com urologista para uma correta avaliação das possíveis causas. O médico também irá recomendar um tratamento adequado e estruturado que possa reverter os sintomas e restabelecer uma qualidade de vida sexual com segurança", aconselha Carneiro.

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Mistura com álcool e drogas

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Apesar de não haver interação direta descrita com o uso de álcool, ele pode ter efeito depressor no sistema nervoso, tornando-se a causa da disfunção erétil ou piorando o problema.

"Alguns dos medicamentos são menos eficazes ou pior absorvidos no trato digestivo quando combinados com álcool. Portanto, é recomendado que sejam ingeridos longe das refeições e sem o consumo de bebida alcoólica", orienta Frederico Mascarenhas, coordenador do Departamento de Urologia do Hospital São Rafael e do Departamento de Cirurgia Robótica do Hospital Aliança, de Salvador.

Já a mistura com outras drogas ilícitas que tenham efeito estimulante ou vasodilatador pode interagir negativamente com os inibidores da fosfodiesterase tipo 5 e potencializar seus efeitos, gerando consequências graves e risco à saúde.

"Misturar com outras drogas estimulantes pode potencializar demais o efeito, causando o priapismo (excesso de ereção com prejuízo ao órgão)", sinaliza Julio Bissoli, responsável pelo Setor de Urologia Reconstrutiva do Hospital das Clínicas da USP.

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O priapismo, inclusive, é um dos possíveis e mais graves efeitos colaterais dos medicamentos de disfunção erétil. Trata-se de uma ereção involuntária persistente que precisa de ajuda médica urgente. "Se não for revertido em pouco tempo pode levar a uma perda definitiva da função erétil", explica Arie Carneiro.

Outros efeitos colaterais desses medicamentos são:

  • Dor de cabeça;
  • Dor muscular e nas costas;
  • Tontura;
  • Dispepsia (desconforto digestivo);
  • Vermelhidão na face;
  • Congestão nasal.

Uso para atividade física

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O uso dessa classe de medicamentos, especialmente a tadalafila (que ficou conhecida como "tadala"), também ganhou espaço entre os atletas das academias.

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Essas medicações causam uma vasodilatação que ajuda o sangue a chegar e se manter no pênis, sustentando uma melhor ereção. A ideia por parte desses atletas amadores é causar essa mesma vasodilatação nos músculos do corpo, supostamente melhorando o desempenho dos treinos e ganhando mais massa muscular.

Essa nova moda alavancou as vendas da tadalafila. Em 2023 foram vendidas 43,1 milhões de unidades do medicamento no Brasil, número 38,9% maior em relação ao ano anterior, conforme dados da Close-UP International. Isso a colocou em segundo lugar em valor de venda, atrás apenas do Ozempic.

"O fato é que essas medicações não foram desenvolvidas nem estudadas para esse fim. Portanto, os riscos desse uso rotineiro associado à atividade física intensa são incalculáveis, podendo gerar efeitos colaterais graves, problemas cardiovasculares e até causar a própria disfunção erétil pela dependência psicológica já mencionada", diz Carneiro.

Perigo com interações medicamentosas

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Os inibidores da fosfodiesterase tipo 5 são potentes vasodilatadores e, portanto, não devem ser usados concomitantemente com medicamentos à base de nitrato, que também são drogas vasodilatadoras geralmente indicadas para pacientes que sofreram infarto. Eles podem ter um efeito sinérgico potencializando e gerar uma vasodilatação exacerbada.

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Por isso, Frederico Mascarenhas faz um alerta para quem faz uso regular de medicamentos de disfunção erétil: "Pacientes que eventualmente tiverem um problema cardiovascular, como um infarto agudo do miocárdio, precisam informar que estão em uso de medicamento de disfunção erétil, pois não podem utilizar medicações à base de nitrato, como isordil, monocordil e sustrate, que muitas vezes são utilizados para dilatar as artérias coronárias".

Usar qualquer medicamento sem entender seus perigos é potencialmente grave. Até porque, o declínio na função erétil pode estar mascarando um problema de saúde muito maior, como diabetes, colesterol elevado, problemas cardíacos e de pressão arterial, ou mesmo níveis baixos de testosterona e problemas neurológicos.

"Por isso a recomendação básica é sempre buscar e seguir orientação de profissional qualificado", recomenda o urologista Julio Bissoli.

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