'Sem eles, não estaria aqui': como séries coreanas ajudam a superar luto?

Assistir a dramas asiáticos tornou-se uma forma terapêutica de lidar com a saúde mental para muitas pessoas. Mas o que diferencia essas séries das outras?

Nem toda terapia envolve um divã ou um consultório. Atividades como exercícios físicos, meditação e viagens para se desconectar são consideradas formas de cuidar da saúde mental. Entre essas práticas, assistir a doramas ganhou destaque.

Originalmente, a palavra "doramas" refere-se a dramas japoneses, mas hoje é usada para descrever todas as produções asiáticas do gênero, incluindo os populares K-dramas coreanos. A Netflix, por exemplo, viu a visualização de K-dramas aumentar seis vezes entre 2019 e 2022, levando a plataforma a investir fortemente no gênero, que frequentemente aparece entre os títulos mais assistidos.

Terapia em forma de série

Kássia Soraia
Kássia Soraia Imagem: Arquivo pessoal/Divulgação

Kássia Soraia, 39, encontrou nos doramas uma nova paixão e criou uma página no Instagram dedicada ao tema. "Estava passando por um momento de forte depressão e não tinha mais vontade de fazer nada. Quando comecei a assistir séries asiáticas, voltei a sentir um gosto pela vida", conta Kássia, coordenadora administrativa.

Eliana Andrade, 61, teve uma experiência semelhante. Após descobrir os doramas, ela notou uma melhora nos sintomas de depressão desencadeados por um luto. "São histórias da vida real e servem como bons exemplos. Falam sobre vida, morte, família e respeito. Quando estou vendo doramas, me sinto bem", compartilha Eliana.

Eliana Andrade
Eliana Andrade Imagem: Arquivo pessoal/Divulgação
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A psicóloga Eduarda de Oliveira e Silva, com graduação e mestrado na UEL (Universidade Estadual de Londrina), explica que, em momentos de fragilidade, evitamos atividades desafiadoras.

Ficar na cama e ver TV é um comportamento que exige menos e não é prejudicial, desde que a pessoa não esteja abrindo mão de outras atividades diárias importantes. Eduarda de Oliveira e Silva, psicóloga

Para Eduarda, os doramas abordam assuntos sérios, como o luto, de uma maneira sensível, o que faz as pessoas se sentirem abraçadas.

Embora as fases do luto propostas por Elisabeth Kübler-Ross tenham se popularizado (negação, raiva, negociação, depressão e aceitação), ela restringe bastante a complexidade da experiência, como explica Ana Clara Bastos, psicóloga especializada em perdas e lutos pela UCSal (Universidade Católica do Salvador).

Não devemos falar do luto como um problema a ser resolvido ou combatido. Ele é uma reação normal diante de uma perda significativa e é também um processo que nos mantém vinculados e conectados àquela pessoa. O luto é permanente, mas ele se transforma ao longo do tempo. Ana Clara Bastos, psicóloga

Uma luz no fim do túnel

Giovanna Martins, 25, administradora e estudante de gastronomia, começou a ver K-dramas em 2022, após a morte da mãe. "Estava passando por um momento crítico, perdida, sem saber como seguir em frente. Os problemas não desapareceram, mas ficaram mais leves", diz Giovanna.

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Amanda Ilheo, 30, bacharel em direito, encontrou apoio nos K-dramas após a morte do pai. "Depois de mais de um ano enfrentando a depressão, a dor e a saudade, vi uma série chamada Death's Game que me ajudou a entender o que estava acontecendo dentro de mim. Sem os dramas coreanos, não estaria aqui agora", revela Amanda.

Amanda Ilheo
Amanda Ilheo Imagem: Arquivo pessoal/Divulgação

Uma parte do todo

Os doramas, apelido carinhoso para os dramas asiáticos, têm ajudado muitas pessoas, inclusive a mim. Em 2022, enfrentei um dos piores anos da minha vida e fui diagnosticada com início de depressão. Foi então que comecei a assistir à série Tudo Bem Não Ser Normal, que mistura realidade com elementos de contos de fadas, e me senti acolhida como nunca antes.

"A sociedade apresenta regras de como o enlutado deve se comportar, mas é fundamental que o enlutado tenha uma rede de apoio, pois o luto é um dos momentos mais estressantes que uma pessoa pode viver", alerta Juliana Sato, psicóloga integrante do Núcleo de Intervenções Psicológicas em Emergências e Desastres. Ela reforça a importância de buscar ajuda profissional em casos de luto prolongado ou depressão.

Por fim, se você estiver se sentindo sozinho, sem ânimo para viver, ou com sintomas que afetam sua qualidade de vida, busque ajuda psicológica. O CVV (Centro de Valorização à Vida) oferece suporte emocional pelo número 188 funcionando todos os dias.

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