Chineses detectam novo vírus capaz de afetar o cérebro humano
Colaboração para VivaBem
13/09/2024 05h30
Um novo nairovírus que adoece o cérebro e provoca graves sintomas foi encontrado em um chinês picado por um carrapato, relataram pesquisadores do Instituto de Microbiologia e Epidemiologia de Pequim e outras instituições associadas, em um artigo publicado no New England Journal of Medicine no dia 4 de setembro.
Batizado de "vírus de zona úmida" ou WELV, ele foi detectado em um paciente de 61 anos, hospitalizado em Jinzhou em junho de 2019 após ter febre, dores de cabeça e vômito cerca de cinco dias após visitar um parque do interior da Mongólia, uma região tradicionalmente quente e úmida que explica o nome. O homem ainda relatou aos médicos que foi picado por carrapatos durante o passeio.
Antibióticos dados ao idoso não surtiram efeito, o que deu aos médicos a pista de que não se tratava de uma infecção por bactéria. Exames de DNA e RNA realizados com o sangue do paciente revelaram o culpado —um tipo antes não identificado do ortonairovírus.
Como é a doença provocada pelo novo vírus?
Após acharem o WELV no primeiro paciente, os pesquisadores decidiram colher exames em todos os pacientes que apresentaram quadros de febre na região e obtiveram outros 20 resultados positivos. Três deles também haviam sido infectados com outras doenças causados por carrapatos ao mesmo tempo.
Assim, os estudiosos puderam determinar um quadro mais completo que pode ser causado pelo WELV: além da febre, das dores de cabeça e do vômito, houve pacientes com mal-estar, dores nas costas, náusea, diarreia, artrite, inchaço de gânglios linfáticos e petéquias — pequenas manchas causadas por hemorragias localizadas. Os exames ainda identificaram coágulos e danos a tecidos em diversos pacientes.
Aquele que desenvolveu o quadro mais grave acabou em coma devido à infecção, além de fluido acumulado ao redor do cérebro e da medula espinhal. Apesar disso, todos foram tratados com sucesso e receberam alta entre 4 e 15 dias após a internação.
Cobaias tiveram infecções letais
Os pesquisadores ainda injetaram o WELV em ratos de laboratório para acompanhar como as infecções se desenvolvem. Os resultados foram preocupantes: algumas cobaias não sobreviveram, com o vírus afetando diversos órgãos — entre eles o cérebro. O estudo conclui que o vírus afeta especialmente o sistema nervoso, no entanto é cuidadoso em admitir que ainda não se conhece muito sobre o patógeno.
"Melhorando a vigilância e detecção dos ortonairovírus que surgem permitirá um melhor entendimento do efeito que estes vírus podem ter na saúde humana", salientam os estudiosos.
De onde veio o WELV?
O time envolvido no projeto ainda tentou localizar o nairovírus em carrapatos e outros animais do Norte da China, inclusive no parque visitado pelo paciente zero. Foram coletados quase 14.600 carrapatos, separados por localização e espécie, que foram analisados.
Cerca de 2% testaram positivo para a presença do material genético do WELV, de cinco espécies diferentes. A que possuiu o maior número de infectados foi a do carrapato Haemaphysalis concinna, que pertence à mesma família do carrapato-estrela que transmite a febre maculosa no Brasil.
O WELV ainda foi encontrado em uma pequena parcela de ovelhas, cavalos e porcos, além do roedor Transbaikal zokor (Myospalax psilurus) — comum na China, Rússia e Mongólia. Cães e gado não se infectam com o vírus, mas alguns deles carregam anticorpos contra o WELV, de acordo com o estudo.
Além dos animais, 12 dos 640 guardas florestais aparentemente saudáveis que foram testados apresentaram anticorpos contra o vírus, o que pode no futuro apresentar um caminho para o combate à doença.
Ainda misterioso, o WELV ainda tem outro "parente" famoso: o vírus que causa a febre hemorrágica da Crimeia-Congo, uma doença rara, mas fatal que infecta seres humanos também através da picada de carrapato ou pela exposição aos fluidos corporais de outro doente.