O que acontece no seu corpo quando você bebe de estômago vazio
Se beber, não exagere. Essa é a regra de ouro ditada pelas autoridades de saúde de todo o mundo. A razão para isso é que não existe dose segura para uma substância tóxica que possui efeitos psicoativos, pode gerar dependência e é conhecida entre nós como álcool.
Além disso, cada pessoa processa as bebidas alcoólicas de forma individualizada, o que ainda é influenciado por fatores como a idade, o peso e até o uso de medicamentos.
Para minimizar prejuízos, a recomendação é manter-se bem nutrido nessas situações. Mas o que esperar quando se decide pular refeições, por exemplo, para compensar as calorias consumidas em um dia de excessos alcoólicos?
O consumo anual de álcool no Brasil está acima da média das Américas (7,5 litros)
Entre 2010 e 2019, porém, houve redução de 10% do consumo per capita.
Já o uso abusivo cresceu de 18% (2010) para cerca de 21% (2023). Dados Vigitel 2023.
Homens de 35 a 54 anos integram o grupo com maior índice de internação pelo álcool.
1 em cada 3 internações atribuíveis ao álcool ocorreram entre pessoas com mais de 55 anos em 2023.
A população preta tem as maiores taxas de óbitos associados ao álcool. Dados do CISA.
O trajeto do álcool pelo corpo
Ao ser ingerido, ele é absorvido por meio do estômago, intestino e fígado, órgão no qual ele sofrerá a ação de enzimas [majoritariamente, o álcool desidrogenase (ADH) e a aldeído desidrogenase (ALDH)] que ajudarão na quebra e excreção [metabolização] da substância.
Os efeitos no organismo podem ser observados por meio dos limites de concentração de álcool no sangue. O problema é que, ainda que duas pessoas tenham consumido o mesmo volume de bebida alcoólica, essa taxa pode variar. Isso porque a concentração sanguínea do álcool é também influenciada pelos seguintes fatores:
Sexo
Idade
Composição corporal
Fase do ciclo menstrual
Exposição prévia ao álcool
Tipo e volume da bebida consumida
Uso de determinados medicamentos (cimetidina, anti-histamímicos, fenotiazina)
Presença de doenças crônicas
Tolerância (perfil genético da metabolização)
Os efeitos no seu corpo
Embora existam variações de uma pessoa a outra, beber com o estômago vazio, em geral, pode ter como resultado os seguintes quadros:
Absorção acelerada
Sintomas de intoxicação
Aumento do risco para tumores
Tudo acontece em ritmo acelerado
Os efeitos que o álcool provoca no organismo dependem da velocidade com a qual ocorrem as suas absorção, metabolização e excreção. Estar em jejum pode acelerar a absorção, especialmente quando a bebida ingerida possui teor alcoólico entre 20% a 30% ou é gaseificada como os espumantes.
Forrar o estômago, principalmente com carboidratos, pode lentificar essa absorção. A comida impede a passagem do álcool para o duodeno, onde ele seria mais rapidamente absorvido.
Essa "barreira" evita que ocorram altos picos de álcool na circulação sanguínea.
Nessas circunstâncias, estima-se que a concentração de álcool no sangue não atinja nem ¼ daquela obtida com o órgão vazio.
O pico da concentração alcoólica acontece cerca de 1 hora após a ingestão da bebida, mas pode ocorrer antes, a depender da quantidade de álcool ingerida.
Consumir qualquer tipo de nutriente (proteína, carboidrato, gordura) durante o consumo de álcool parece também acelerar a sua eliminação em 25% a 45%.
Mas atenção, apesar da redução desses efeitos no curto prazo, os especialistas advertem: ter o estômago cheio não autoriza o consumo abusivo do álcool e nem minimiza seus efeitos ao longo do tempo. Dados publicados pelo periódico médico Journal of Public Health.
Sintomas aparecem em cascata
Como o álcool pode se espalhar por todas as células e tecidos do seu corpo, logo podem ser observados sintomas de intoxicação, como náuseas, vômito, diarreia e dor abdominal, especialmente entre pessoas com gastrite.
Além disso, podem estar presentes:
Mudanças comportamentais e psicológicas, caracterizadas pela liberação de comportamentos mais instintivos, como a sexualidade e a agressividade, alterações de humor, redução da capacidade de julgamento e de interação social.
Alterações na fala, falta de coordenação, perda do equilíbrio, entre outros, e até o coma, são outras possíveis manifestações.
Repetir a prática facilita para as doenças
Estudo recente concluiu que beber em jejum é fator que aumenta a possibilidade do aparecimento de variados tumores do trato gastrointestinal (estômago, fígado, colorretal), com manifestações precoces, especialmente entre os jovens.
Evidências emergentes também revelam que beber com o estômago vazio está relacionado a efeitos adversos, e eles independem do volume do álcool consumido, e isso inclui mortalidade por todas as causas, inclusive doenças cardiovasculares e o câncer. Dados publicados pela revista Gastroenterology.
Bebedeira, dose a dose
As consequências nocivas do excesso de álcool podem aparecer no curto e longo prazos. As situações a seguir descritas consideram indivíduos com tolerância normal à bebida.
Pessoas que, naturalmente, têm maior tolerância, precisarão de doses cada vez maiores para ter o mesmo efeito. Confira:
1 ou 2 unidades de álcool - aumento da frequência cardíaca, dilatação dos vasos sanguíneos e aquela leve sensação de relaxamento, euforia e prazer.
4 a 6 unidades - cérebro e sistema nervoso central são afetados. A capacidade de julgamento e de tomar decisões fica reduzida, e a pessoa se torna mais imprudente e desinibida. Reflexos e coordenação sofrem alterações.
8 a 10 unidades - a perda de reflexos piora, a fala fica arrastada e a visão é alterada; o fígado perde a capacidade de metabolizar o álcool, aumentando a probabilidade de ressaca.
10 a 12 unidades - todos os sintomas descritos serão ainda mais fortes e haverá sonolência, o que aumenta o risco para acidentes. Níveis tóxicos do álcool levam à desidratação e à ressaca. Com sobrecarga para o sistema digestivo, náuseas e vômitos aparecem.
Mais de 12 unidades - Letargia profunda, inconsciência, estado de sedação, parada respiratória, coma.
Quando procurar ajuda
O melhor momento é antes que os prejuízos comecem a aparecer. Isso significa que ao notar que seu hábito de beber extrapola os limites de segurança, já é hora de procurar uma avaliação médica.
Beber meia garrafa de vinho sozinho, todos os dias, já merece atenção. A prática é considerada sinal de alerta de que algo precisa ser feito antes do aparecimento de problemas de saúde mental e comportamentais relacionados ao álcool.
Se você deseja prevenir ou reduzir os efeitos do consumo de bebidas alcoólicas, adote as seguintes medidas:
Conte quantas doses consome a cada semana e vá reduzindo gradualmente, até conseguir não exceder os limites que representam menor risco para a sua saúde e a vida de terceiros.
Quando estiver bebendo, beba mais devagar.
Ingira água enquanto bebe. Isso não corta nem atenua os efeitos do álcool, inclusive a ressaca, mas garante que o corpo se manterá hidratado. Se tiver de beber, para cada dose de bebida alcoólica, tome outra sem álcool.
Onde procurar ajuda
Toda a rede do SUS (Sistema Único de Saúde), por meio dos CAPS (Centros de Atenção Psicossocial) e das UBSs (Unidades Básicas de Saúde), oferece atendimento para enfermidades relacionadas à saúde mental e, em São Paulo, existe área especializada em Álcool e Drogas (CAPS AD).
A Prefeitura de São Paulo esclarece que a política de atendimento é promover o acesso aos serviços de suas unidades, por isso, não é necessário agendamento prévio, nem encaminhamento.
Encontre o CAPS AD mais próximo de sua residência (em São Paulo) aqui:
https://www.prefeitura.sp.gov.br/cidade/secretarias/saude/atencao_basica/index.php?p=204204
O grupo de apoio AA tem promovido encontros on-line. Para participar, basta entrar na seção Sala de Reuniões do site: https://www.aaonline.com.br/.
Fontes: Aristóteles Cardona Jr., médico de família e comunidade, professor da Univasf (Universidade Federal do Vale do São Francisco), em Petrolina (PE) e gerente de atenção da saúde do Hospital Universitário da mesma instituição, que integra a rede Ebserh (Empresa Brasileira de Serviços Hospitalares); Roberta Chaves Araújo, gastroenterologista e professora da FMRP (Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto) da USP, vinculada ao Departamento de Clínica Médica; e Sérgio Alexandre Liblik, gastroenterologista, professor da Escola de Medicina da PUC-PR. Revisão técnica: Sérgio Alexandre Liblik.
Referências: CISA (Centro de Informações sobre Saúde e Álcool), Álcool e Saúde dos Brasileiros - Panorama 2024.
Shi M et al. Alcohol Drinking Without Meals Is Associated With Risk of Gastrointestinal Cancers, Including Early-Onset Cases. Gastroenterology. 2024. Disponível em https://doi.org/10.1053/j.gastro.2023.11.012
Ramsbottom A, Petticrew M, Huber A, van Schalkwyk MCI. Drinking on an empty stomach: a scoping review of the evidence on how consuming food with alcohol affects short-term outcomes. J Public Health (Oxf). 2023. Disponível em https://doi.org/10.1093/pubmed/fdac117
Cederbaum AI. Alcohol metabolism. Clin Liver Dis. 2012. Disponível em https://doi.org/10.1016/j.cld.2012.08.002
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