Doença grave na pele causa dor e feridas enormes: 'Ficava de cama'
Jéssica Tauane, 33, teve os primeiros sintomas de uma doença de pele rara quando era adolescente. Aos 17 anos, a hidradenite supurativa começou a dar os primeiros sinais: nódulos doloridos seguidos de grandes abscessos pelo corpo.
Passei boa parte dos meus 20 e poucos anos na cama. A dor era tanta que não saía da cama. Ficava isolada e sem contato social. Não aguentava viver com tanta dor.
Jéssica Tauane
Diferentemente de outras doenças "silenciosas", a hidradenite supurativa deixa marcas na pele, principalmente quando o diagnóstico demora a ser feito. Jéssica lembrava de quando sonhava em ter uma pele lisa.
Olhava a foto de outras pessoas e pensava: 'Gostaria tanto de ter a pele lisinha'. Nossa pele fica à mostra, então, tive de trabalhar toda a questão de autoestima para me sentir bem com meu corpo. Jéssica Tauane
Abscessos enormes na pele
Durante os mais de 10 anos de diagnóstico, a comunicadora e influenciadora já teve inflamação em mais de cinco lugares, como na região do colo, dos seios (incluindo a parte de baixo), nas axilas, barriga e cabeça (menos comum).
O nódulo gera essa inflamação que pode vir com abscesso, que é como um grande furúnculo, e pode ter pus, cheiro forte, além de dor e muita coceira.
Jéssica Tauane
Depois que a ferida desinflama, o paciente costuma ficar com as marcas, que são cicatrizes grandes na pele.
"Os abscessos demoram para cicatrizar e, quando cicatrizam, ficam em um formato de fístula ['túneis' que se formam dentro da pele]. É algo diferente", conta Jéssica.
5 pontos para entender a hidradenite supurativa
Doença inflamatória e crônica cria espécies de "furúnculos" (nódulos e caroços endurecidos), que podem causar dor e coceira na região. Em casos graves, isso pode progredir para abscesso (com pus e odor desagradável).
Lesões costumam aparecer em regiões específicas: axilas, virilha, parte de baixo dos seios, entre os glúteos, e a região do ânus (perianal) ou entre ânus e a vagina/pênis (perineal).
Causas são multifatoriais: existem componentes genéticos e fatores de risco, como obesidade e tabagismo. Higienização local é fundamental, e drenagem pode ser recomendada para pacientes que têm abscessos com dor.
Sabe-se que ocorre uma inflamação nos folículos pilosos (toda a estrutura do pelo, com raiz e glândulas). Consequentemente, há aumento na quantidade de bactérias na região, formando lesões. As células não conseguem passar pela "renovação" e, num fluxo contínuo, nunca se recuperam.
Lesões são muito recorrentes: podem 'sair' e voltar depois. Esses abscessos ficam indo e voltando, com isso, vão se formando tantas cicatrizes que podem reduzir, inclusive, a mobilidade do paciente. Em alguns casos, as cicatrizes causam deformidades completas em algumas regiões.
Aline Okita, dermatologista
A hidradenite supurativa costuma aparecer após a puberdade e é mais comum em mulheres. Estima-se que 0,4% da população conviva com a doença, de acordo com Aline Okita, dermatologista pela USP e coordenadora do ambulatório de doenças imunomediadas da Universidade de Mogi das Cruzes (SP).
'Não consigo usar sutiã e nem calcinha'
Jéssica se considera "sortuda" porque teve o diagnóstico rapidamente —diferentemente da maioria dos pacientes. Ela cresceu ao lado da mãe e da avó, que também têm a doença. "Sabia do componente genético, então quando cheguei ao dermatologista, contei sobre a hipótese e já diagnosticamos", conta.
A comunicadora logo fez o tratamento inicial pelo SUS, com uso de antibiótico por cerca de 12 semanas até reduzir o número de surtos da doença. Agora, talvez precise de um dos imunobiológicos disponíveis no Brasil —gratuitamente, há apenas o adalimumabe.
Além disso, ela passou a adotar várias medidas para evitar o desconforto que a hidradenite supurativa pode causar.
Não consigo usar roupas com costura 'dura', como jeans. Só consigo usar com tecidos soltinhos porque não causam atrito na pele. Não uso mais sutiã porque o ferro me machuca e causa lesão. Tenho meus seios inflamados. Só uso top sem costura quando preciso e, na parte de baixo, não uso calcinha, mas shorts de algodão.
O clima também afeta o tratamento da doença, já que o suor causa atrito no corpo. "Opto por ficar em ambientes que me causem menor suor. No frio, também é ruim, porque precisamos usar muita roupa e isso acaba me fazendo suar mais."
Criação de grupo
Nas redes sociais, Jéssica costumava falar sobre outros assuntos e, quando citou a doença, outras pessoas acabaram descobrindo ter o mesmo diagnóstico. Criei a comunidade "Nossa Pele HS", há quatro meses, e já temos mais de 3.500 pessoas participando.
No grupo, levamos dicas e fazemos um trabalho de autoestima com a doença, para todos termos orgulho da jornada até agora. Isso é importante para que a gente não se sinto sozinho, principalmente porque não é uma doença comum. É um problema que afeta muito a qualidade de vida. Ter uma comunidade que pode ajudar os pacientes é muito importante.
Jéssica Tauane
Tipos e tratamentos da doença
Leve (estágio 1) - presença de lesões/abscessos, mas sem cicatrizes e fístulas ('túneis' que se formam dentro da pele);
Moderado (estágio 2) - abscesso recorrente único, ou múltiplos, separados, com formação de fístulas e cicatrizes;
Grave (estágio 3) - múltiplas fístulas interconectadas e abscessos.
Tratamento depende do grau da doença. No geral, há medicações tópicas (cremes), orais (antibióticos e imunobiológicos) e, em situações graves, cirurgias para reduzir cicatrizes e abscessos.
Quando perdemos a 'janela de oportunidade' para controlar a doença de forma clínica e o paciente já tem muitas sequelas, com diversas cicatrizes, ou perde a movimentação do corpo, nós precisamos operá-lo.
Aline Okita, dermatologista
Não deixe de procurar um dermatologista se surgirem muitas "bolinhas", que parecem cravos, com muita frequência e desconforto, reforça a especialista. Quanto antes diagnosticado, melhor será o tratamento.
Deixe seu comentário