Cegueira silenciosa: doenças que ameaçam a visão de milhões são preveníveis

Globalmente, pelo menos 2,2 bilhões de pessoas têm uma deficiência visual ou cegueira, das quais pelo menos 1 bilhão poderia ter sido evitada ou ainda não foi tratada corretamente, segundo dados de 2019 do Relatório Mundial sobre Visão da OMS.

Entre as principais doenças que causam deficiência visual ou cegueira estão a DMRI (degeneração macular relacionada à idade) e a retinopatia diabética.

A DMRI ocorre quando vasos sanguíneos anormais crescem e vazam fluido sob a mácula, a parte do olho responsável pela visão central nítida e pela visualização de detalhes finos. Esse fluido pode danificar e cicatrizar a mácula, causando perda de visão. Cerca de 170 milhões de pessoas no mundo vivem com DMRI e estima-se que esse número aumentará para 288 milhões até 2040.

Como fica a visão de quem tem DMRI
Como fica a visão de quem tem DMRI Imagem: Global data on visual impairments 2010 (2012)/OMS/Reprodução

O edema macular diabético (EMD), que é uma progressão da retinopatia diabética, ocorre quando os níveis elevados de açúcar no sangue levam a vasos sanguíneos danificados no olho que vazam fluido para a mácula. Isso pode levar à perda de visão e, em alguns casos, à cegueira. No mundo, 146 milhões de pessoas atualmente vivem com retinopatia diabética e cerca de 27 milhões de pessoas com EMD.

Uma pesquisa¹ realizada pelo Ipec, a pedido da farmacêutica Bayer, investigou a percepção da população brasileira sobre doenças da retina, diabetes e outras doenças crônicas, e entendeu a visão médica sobre o tratamento de doenças oftalmológicas.

Os principais achados foram:

67% dos pacientes entrevistados nunca ouviram falar de DMRI

8% consideram a idade avançada como a principal causa de cegueira

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Embora 60% reconheçam que o diabetes descontrolado é o principal causador de cegueira, 78% nunca ouviram falar sobre a retinopatia diabética, que causa o EMD

75% dos entrevistados com diabetes associam a falta de controle da doença à cegueira

Os pacientes chegam no consultório dizendo: 'nossa doutora, eu sei que perco o pé, que posso ficar sem escutar, que tenho maior risco de derrame, mas por que o olho? Será que é o grau do óculos que está piorando com a minha idade, que eu já estou com 42 anos e não tô enxergando mais de perto, é isso? O diabetes tá causando isso?' Eles têm esse desconhecimento sim. Tereza Kanadani, oftalmologista especializada em retina

Entre os respondentes com diabetes, que consequentemente têm maior risco de ter a retinopatia, o número chama ainda mais atenção, já que 46% nunca ouviram falar sobre a condição

"A falta de conhecimento do paciente, e muitas vezes a minimização dos sintomas iniciais, como um leve desconforto ocular, pode levar a diagnósticos tardios, aumentando a frequência das intervenções necessárias e o risco de perda de visão", afirma a médica, que também é chefe do programa de fellowship do Retina Instituto.

E o tratamento?

Imagem de uma retina saudável, no caso, da jornalista que escreve este texto
Imagem de uma retina saudável, no caso, da jornalista que escreve este texto Imagem: Reprodução/Eyer

Os tratamentos existentes atualmente para as várias doenças da retina, entre elas DMRI e EMD, incluem aplicações de laser intraocular, implante de corticoides de liberação lenta, além dos mais modernos, os chamados anti-VEGF —medicamentos antiangiogênicos—, padrão-ouro, que são injeções intraoculares dadas com uma certa frequência, podendo ser mensais ou, dependendo da resposta do paciente, até semestrais.

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Dados da OMS apontam que regimes de tratamento mais simples e com menos frequências de administração
podem aumentar a adesão dos pacientes. Entre a população entrevistada na pesquisa, mais de 40% sentiram-se incentivados a aderir ou continuar algum tratamento médico com maior intervalo entre as aplicações, com esse número subindo para 50% entre quem tem diabetes.

Pensa no paciente diabético, ele não tem só o endócrino. Se ele tem pé diabético, tem o neurologista, tem o nutricionista para cuidar da dieta. Ele tem o oftalmo, o cardiologista, porque às vezes ele também tem problema cardíaco e muitas das vezes também o nefrologista porque faz diálise. Então ele tem, em média, aquele paciente diabético descontrolado, de 16 a 25 consultas anuais. Então, se ele tem um tratamento oftalmológico que ele tem que ir mensalmente, são mais 12 consultas além das 25. Então, o paciente diabético, pra mim, é o que mais se beneficia da redução desse fardo do tratamento. Tereza Kanadani, oftalmologista especializada em retina

Como fica a visão de quem tem retinopatia diabética
Como fica a visão de quem tem retinopatia diabética Imagem: Singh A, Stewart JM. Int Ophthalmol Clin 2009;49(2):1-11/Reprodução

Entre os oftalmologistas entrevistados:

65% acreditam que pacientes com doença da retina abandonam o tratamento quando observam uma melhora

Embora percebam que 97% dão importância ao tratamento

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75% acreditam que um maior intervalo entre as doses de medicação incentivaria significativamente os pacientes a aderirem ou continuarem o tratamento

Os principais obstáculos do tratamento contínuo foram apontados como:

custo do medicamento/tratamento: 89%

frequência que precisa ir até o hospital/clínica/consultório: 45%

tempo de espera no sistema de saúde: 44%

paciente vê melhora e resolve parar: 35%

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distância de casa/deslocamento: 32%

medo: 24%

efeitos colaterais: 14%

dor/incômodo: 12%

outro motivo: 2%

"Na prática clínica vemos que existem diversos fatores que podem comprometer a aderência ao tratamento, a duração com doses frequentes em ambas as doenças consideradas crônicas, consequentemente, a frequência que precisam se deslocar para e exames de acompanhamento da visão; e a melhora já no início do tratamento, que pode criar a falsa percepção no paciente de que não há necessidade continuar. E o mais controverso, na minha opinião, é que alguns deles não fazem o tratamento por medo de perderem a visão, sendo que é exatamente o contrário, já que ao não se tratar da forma adequada, esse é um risco que pode chegar a 100% em alguns casos", explica a oftalmologista.

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Nova versão de medicamento aprovada no Brasil

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Imagem: Getty Images

Atualmente, o tratamento padrão ouro para EMD e DMRI é o anti-VEGF, já com algumas opções no mercado brasileiro, como os medicamentos aflibercepte e ranibizumabe —ambos nos SUS— e faricimabe.

Em abril deste ano, a Anvisa aprovou a versão de 8 mg do medicamento aflibercepte —cuja versão de 2 mg já está no SUS desde 2021, e, segundo sua bula, tem uma frequência de aplicação média de 8 semanas, podendo estender os intervalos de aplicação para até 16 semanas.

Entre os benefícios da nova versão de 8 mg, está o aumento do intervalo entre as aplicações, que pode chegar a 20 semanas (ou 5 meses), —inclusive alguns estudos apresentados no Congresso Euretina, em Barcelona (Espanha), mostraram que este intervalo pode ser estendido para até 6 meses— ainda com segurança e eficácia semelhante ao do aflibercepte 2 mg.

"O aflibercepte 8 mg está sendo comercializado desde agosto deste ano e seu uso já é coberto pelos planos de
saúde. Para que todos os pacientes brasileiros possam ter acesso à essa inovação, já estamos trabalhando nos trâmites burocráticos junto ao Ministério da Saúde para que ele possa ser incorporado o mais breve possível ao SUS", diz Tiago Dias, diretor da área terapêutica de especialidades da Bayer.

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Também no Congresso Euretina, foram apresentadas pesquisas iniciais sobre opções de novos tratamentos para DMRI, como terapia gênica e CRISPR (técnica de edição genética).

¹ A pesquisa ouviu por telefone 2.000 pessoas com uma amostra representativa da população internauta para levantar a incidência de pessoas com diabetes em cada país. Em um segundo momento, foram feitas entrevistas buscando pacientes com diabetes para alcançar a amostra de 300 pessoas com a doença; homens e mulheres, com faixa etária a partir dos 16 anos de todas as classes sociais. Para amostra total, a margem de erro é de 2 pontos percentuais com nível de confiança de 95% e para amostra de pessoas com diabetes, a margem de erro é de 6 pontos percentuais com nível de confiança de 95%. A data de campo da pesquisa no Brasil é abril de 2024.

*A jornalista viajou a convite da Bayer.

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