Veja se sua profissão está entre as mais atreladas a transtornos mentais

Considerada a terceira causa que mais afasta empregados do trabalho, os transtornos mentais são cada vez mais comuns dentro das empresas brasileiras. Dados do Ministério da Previdência Social mostram que apenas no ano passado, mais de 288 mil trabalhadores precisaram se afastar do trabalho por conta de problemas de saúde mental —uma média de 33 afastamentos por hora.

Na lista dos mais comuns, os transtornos de ansiedade e depressão aparecem nas primeiras colocações. Não por acaso, estudo da OMS (Organização Mundial da Saúde) aponta que o Brasil tem a população com a maior prevalência de ansiedade no mundo. Para se ter uma ideia, aproximadamente 9,3% dos brasileiros sofrem de ansiedade patológica.

Similarmente, outro estudo da OMS também revela que cerca de 5,8% da população brasileira sofre de depressão —maior prevalência em um país da América Latina.

Manuella Rodrigues de Almeida Lima, médica psiquiatra da Área de Promoção da Saúde do SIASS (Subsistema Integrado de Atenção à Saúde do Servidor) da UFG (Universidade Federal de Goiás), explica que este alto índice de transtornos mentais e comportamentais entre os trabalhadores brasileiros pode ser explicado por três fatores:

  1. Desigualdade e insegurança no emprego: a insegurança no emprego e as desigualdades salariais podem aumentar o estresse e a sensação de impotência entre os trabalhadores, o que a longo prazo pode desencadear transtornos mentais.
  2. Pressão e estresse no ambiente organizacional: a pressão por resultados e a alta carga de trabalho podem levar ao estresse crônico, que é um fator de risco significativo para o desenvolvimento de transtornos depressivos.
  3. Mudanças na dinâmica do trabalho: a transformação do mercado de trabalho, com a ascensão do trabalho remoto e a crescente digitalização, trouxe novos desafios aos empregados, levando muitos profissionais ao isolamento social, a dificuldade em estabelecer limites entre o trabalho e a vida pessoal e a sensação de desconexão, o que consequentemente tem gerado mais problemas de saúde mental.

Profissões mais afetadas

Enfermeiros, professores, policiais, atendentes de telemarketing, agentes carcereiros e jornalistas são apontados por especialistas ouvidos pelo VivaBem como as profissões com maior tendência de causar de transtornos mentais e comportamentais.

"É cada vez maior o número de profissionais da enfermagem adoecendo por depressão. Isso porque eles são agredidos cotidianamente no contexto hospitalar, seja pelos próprios pacientes ou até familiares desses pacientes. E isso muitas vezes é um desencadeador da depressão", ressalta Thiago Dias Costa, professor da faculdade de psicologia da UFPA (Universidade Federal do Pará).

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Imagem: iStock
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No entanto, especialistas apontam que apesar de alguns profissionais terem riscos maiores de desenvolver transtornos mentais, todos os trabalhadores são suscetíveis. Isso porque o fator predominante para o desenvolvimento de empregados com transtorno mental é a qualidade do ambiente de trabalho.

Segundo Elizeu Borloti, professor do departamento de psicologia social e do desenvolvimento da UFES (Universidade Federal do Espírito Santo), a maior parte dos transtornos mentais tem origem por três causas:

  1. Vulnerabilidade biológica: se um familiar tem transtorno mental, o risco de a pessoa também desenvolver é maior;
  2. Experiência com eventos estressantes incontroláveis: a maneira como se lida com as situações estressantes pode tanto aumentar quanto diminuir o risco de desenvolver problemas de saúde mental;
  3. Aprendizagem de reações inadequadas às ameaças: quem tem histórico de abusos psicológico, físico ou sexual, incluindo o assédio moral, também tem risco maior de ter sintomas de depressão, porque esses abusos foram situações estressantes incontroláveis.

Transtornos mais comuns

Na lista dos dez transtornos mentais e comportamentais que mais acometeram trabalhadores no Brasil em 2023, segundo dados do Ministério da Previdência Social, seis são decorrentes da depressão. São eles:

  1. transtorno misto de ansiedade e depressão;
  2. episódios depressivos;
  3. episódio depressivo grave sem sintomas psicóticos;
  4. transtorno depressivo recorrente;
  5. transtorno depressivo recorrente, episódio atual grave sem sintomas psicóticos;
  6. episódio depressivo moderado.
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Lima explica que o transtorno misto de ansiedade e depressão se distingue dos demais, pois apresenta uma combinação de sintomas. "Em vez de ter um padrão dominante de um tipo de sintoma, o indivíduo pode experimentar uma mistura de ambos os grupos. Isso pode incluir sentimentos persistentes de tristeza e desesperança (depressivos) combinados com preocupações excessivas e tensão (ansiosos)."

Além dos transtornos de depressão, os de ansiedade também aparecem no ranking do Ministério da Previdência Social. "O transtorno da ansiedade generalizada é caracterizado pelo seu principal sintoma: a preocupação excessiva e descontrolada. Ele é facilmente entendido pelo pensamento ser precedido por 'e se?', uma 'catastrofização' de acontecimentos que poderão ocorrer ou que se acha que irão ocorrer. Isso repercute em sintomas físicos (palpitações cardíacas), cognitivos (esquecimento) e emocionais (insegurança)", explicou Elizeu Borloti, professor da UFES.

Também aparecem no ranking os transtornos mentais e comportamentais causados pelo uso de múltiplas drogas ou substâncias psicoativas. "Muitas das condições de trabalho são tão insalubres que cada vez mais trabalhadores usam a bebida alcoólica como uma espécie de analgésico. Isso faz com que o índice de trabalhadores afastados por essa causa que é reconhecida como transtorno mental e comportamental continue alta no Brasil", explicou Thiago Dias Costa, professor da UFPA.

Como evitar

Costa aponta que a melhor forma de evitar transtornos mentais é a prevenção. "Às vezes são coisas simples que fazem diferença para todos os funcionários, como mudar um gestor ou treiná-lo, fazer uma rotatividade maior de trabalho ou, no caso de trabalhos insalubres, diminuir a carga de trabalho."

Já Borloti defende que além de oferecer amparo ao trabalhador, também é importante iniciativas como da Lei da Saúde Mental (14.831/2024, sancionada em abril de 2024), que busca incentivar empresas a cuidar da saúde mental dos seus empregados ao criar o Certificado Empresa Promotora da Saúde Mental —concedido pelo governo federal a empresas que implementam políticas e práticas para promover a saúde mental dos seus funcionários.

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"A criação de um ambiente de trabalho mais saudável e produtivo inclui programas de grupo, como o Stress Reverse e o Grupo de Bem-Estar Emocional. É importante pensar em títulos que atraiam os trabalhadores que estão lidando com estresse, ansiedade e depressão, para que se sintam mais à vontade em uma atividade focada no bem-estar emocional em geral, do que em sintomas de transtornos, devido ao medo de serem estigmatizados", diz o professor da UFES.

Ainda segundo Borloti, é necessário o empregado ficar de olho nos sintomas e procurar ajuda o quanto antes para evitar um quadro mais grave de doenças psíquicas. "É preciso dar mais atenção aos primeiros sinais: dificuldades para dormir, abuso de álcool, irritabilidade e dores são um indicativo", diz.

Além disso, há ações cotidianas que aliviam o estresse e ajudam na prevenção, como alimentação equilibrada, exercícios físicos, sono reparador e momentos de relaxamento de lazer em família e entre amigos.

Fontes: Elizeu Borloti, professor do departamento de psicologia social e do desenvolvimento da UFES (Universidade Federal do Espírito Santo); Manuella Rodrigues de Almeida Lima, médica psiquiatra da Área de Promoção da Saúde do SIASS (Subsistema Integrado de Atenção à Saúde do Servidor) da UFG (Universidade Federal de Goiás); Thiago Dias Costa, professor da faculdade de psicologia da UFPA (Universidade Federal do Pará).

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