O que acontece no couro cabeludo quando você não lava o cabelo regularmente

Deixar de lavar a cabeça regularmente pode causar estranheza, mas essa prática já foi batizada de hair training ou treino do cabelo e até viralizou nas redes sociais pelo mundo. A razão de tanto sucesso é que a medida ajudaria os cabelos a crescerem mais rapidamente e bonitos.

Os embaixadores da proposta se apresentam como se tivessem acabado de sair do salão do cabeleireiro, mas garantem que tal aparência se deve ao fato de ficar 30 dias ou mais sem higienizar as madeixas.

O fato é que seu couro cabeludo funciona como qualquer outra região da pele do corpo e, portanto, todos os dias ele é exposto à poeira, à poluição, à produção de oleosidade e descamação celular, além de produtos cosméticos que podem ser usados a seco.

Será que acumular tudo isso ao espaçamento das lavagens pode mesmo funcionar para todo mundo, estimular o crescimento e ainda tornar os fios mais saudáveis?

O crescimento saudável do cabelo corresponde a 0,35 mm ao dia. Em um ano, isso representa 15 cm, aproximadamente.

A maioria dos homens e mulheres têm cerca de 80 mil/120 mil fios no couro cabeludo.

Cerca de 100 deles caem diariamente.

Os efeitos no seu cabelo

Até o momento, não existem evidências científicas de que ficar sem lavar o cabelo —por muito tempo— seja benéfico para o crescimento dos cabelos, para a saúde do couro cabeludo e a beleza dos fios.

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Segundo os especialistas consultados, longos períodos sem higienização podem ter como consequência os seguintes quadros:

  • Prejuízos para o couro cabeludo
  • Alterações no microbioma

A sujeira é que cresce

Reduzir a frequência das lavagens permite o acúmulo da oleosidade natural (sebo), suor, células mortas, poluentes e produtos cosméticos aplicados no cabelo. Quando o sebo chega naturalmente à superfície da região, a sua química se altera em contato com o ar. E quanto mais o tempo passa, mais modificações acontecem.

As primeiras delas são a presença de ácidos graxos e gorduras que sofrem processo de oxidação, favorecendo o aparecimento de irritações.

Um dos possíveis resultados é a dermatite seborreica. Trata-se de uma enfermidade inflamatória frequente em regiões da pele ricas em glândulas sebáceas.

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Sintomas como coceira podem estar associados ao agravamento de outras dermatites alérgicas, como a de contato e a atópica.

Quadros inflamatórios decorrentes da falta de lavagem podem, indiretamente, facilitar a queda.

Outra possível alteração é no odor local, que passa a ser mais intenso.

Os microrganismos fazem festa

Uma nova área de estudo da saúde capilar é o microbioma. Isso porque, assim como outras regiões da pele, o couro cabeludo tem seu microbioma natural, que é composto por bactérias e fungos que convivem harmonicamente.

Espaçar por muito tempo a higiene local pode levar ao desequilíbrio desse ambiente, facilitando a proliferação de alguns microrganismos.

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A situação mais observada é o aumento de um fungo, o Ptirosporum ovale —que tem sido relacionado ao aparecimento de caspa.

A depender da gravidade desse quadro, a falta de tratamento dessa condição também pode atrapalhar o processo de crescimento dos cabelos.

De onde vêm os fios

Os cabelos são produzidos nos folículos situados na derme, a região logo abaixo da parte da pele que conseguimos visualizar, a epiderme. Cada novo fio é formado no bulbo piloso, uma bolsa microscópica que está na base do folículo.

As células desse bulbo se multiplicam, se projetam para cima, se desidratam, morrem e ficam compactadas dentro de uma massa densa e dura formando o fio do cabelo, também chamado pelos especialistas de haste.

Os fios obedecem a ciclos naturais de crescimento e repouso.

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No couro cabeludo, a primeira fase (crescimento) dura cerca de 2 a 6 anos.

Cerca de 100 fios alcançam a segunda fase (repouso) e caem todos os dias, dando espaço à continuidade desse processo.

Um fio, muitas funções

Manter a temperatura por meio da retenção do calor (no clima frio) ou a prevenção do frio é a função principal dos fios. Veja outros papéis da sua cabeleira:

Proteção contra elementos como os raios UV (ultravioletas).

Psicologia humana: os cabelos colaboram para a identidade e autovalorização pessoais, o que é mais observado na presença de distúrbios capilares como a alopecia.

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Atração sexual.

Existe frequência ideal?

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Imagem: iStock

Os especialistas consultados afirmam que não há uma regra que sirva para todo mundo. Assim, a frequência da lavagem decorre, principalmente, das preferências pessoais.

No entanto, a higiene capilar também depende de fatores ambientais, ou seja, o tipo de cabelo (liso, cacheado, crespo, oleoso, seco, normal), a região da residência, estilo de vida, além da maior ou menor exposição a poluentes, etc.

Para quem vive em climas úmidos e tem a raiz dos cabelos oleosa ou com caspa (dermatite seborreica) a necessidade de lavagem pode ser diária, com produtos adequados.

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Já entre mulheres no período pós-menopausa, cabelos muito crespos ou secos, as lavagens podem ser mais espaçadas e benéficas, porque a oleosidade natural não é distribuída uniformemente pelos fios.

Por outro lado, excessos de lavagem ou do uso de produtos cosméticos e químicos (alisamento, tintura) podem facilitar reações aos componentes de suas fórmulas (corantes, fragrância, etc.) e levar a quadros inflamatórios ou alérgicos.

Xampu, cada um tem o seu

Assim como os tipos de cabelo dependem da herança genética, ter maior ou menor oleosidade no couro cabeludo é também determinado geneticamente. A escolha do xampu, então, deve corresponder a essas características pessoais.

Sejam eles mais leves ou mais intensos, na fórmula dos xampus são encontrados detergentes, estabilizadores, espuma, agentes condicionantes e corretivos, conservantes, fragrâncias e corantes, além de componentes que controlam a oleosidade, hidratam, etc.

O que faz os produtos terem preços tão diferentes entre si são ingredientes como ativos, fragrâncias, hidratantes mais potentes, desengordurantes, além de agregados que tornam a lavagem mais agradável e cujos preços das matérias primas podem ser mais caros.

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Xampus em barra contêm ativos semelhantes aos líquidos.

Existem ainda xampus medicinais que compõem estratégias de tratamento de algum problema do couro cabeludo.

Instruções de lavagem

O uso do xampu é sempre indicado porque ele facilita a retirada do acúmulo de oleosidade, do suor, da descamação celular, além da poluição e resíduos de outros produtos usados nos cabelos.

O xampu deve ser depositado e distribuído em todo o couro cabeludo, especialmente nas áreas em que possuem maior secreção de sebo, ou seja, a nuca e a parte de cima da cabeça (coroa). Essa distribuição pode ser mais difícil com os xampus em barra.

Na sequência, aplique nas margens próximas à face e às orelhas.

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A espuma do xampu deve descer naturalmente pelos fios, mas não é necessário usar o produto neles.

Como os xampus possuem componentes detergentes, o ideal é não repetir esse processo, caso você tenha os cabelos secos ou quimicamente tratados.

Reserve o condicionador para finalizar a lavagem dos fios. O objetivo dessa etapa é neutralizar cargas negativas, reduzir o frizz e facilitar o desembaraço dos cabelos.

Fios descoloridos ficam fragilizados e merecem um tratamento pré-lavagem:

Aplique óleo vegetal (coco, girassol, etc.) de sua preferência nos fios, mantendo o couro cabeludo intacto longe dos raios solares. A medida preserva a camada de proteína dos cabelos durante a lavagem e colabora para a hidratação.

Para ter um cabelo saudável é preciso...

Estar em boas condições de saúde, livre de doenças e manter um mínimo de cuidados com os cabelos.

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Os fios terão aparência de limpos, serão macios ao toque, sem embaraço ou frizz. Brilho e maleabilidade também estarão presentes.

O uso de xampu e condicionador pode ajudar a potencializar esses efeitos por meio de seus variados ingredientes.

Ao observar qualquer alteração nos cabelos ou no couro cabeludo procure por um dermatologista para uma avaliação. Algumas doenças e alguns sintomas se iniciam nessa região e adiar uma consulta pode levar à perda permanente dos fios e ao agravamento de enfermidades sistêmicas.

Fontes: Ana Lísia Giudice, médica dermatologista pela SBD (Sociedade Brasileira de Dermatologia). É preceptora do serviço de residência médica em dermatologia do Hupes-UFBA (Hospital Universitário Professor Edgard Santos da Universidade Federal da Bahia), que integra a rede Ebserh (Empresa Brasileira de Serviços Hospitalares); Angela Bonjorno Arantes, farmacêutica e professora da disciplina de tecnologia de cosméticos nos cursos de farmácia e de estética da PUC-PR; e Fabiane Brenner, médica dermatologista que se dedica ao estudo dos cabelos e membro da diretoria da SBD (Sociedade Brasileira de Dermatologia). Revisão técnica: Fabiane Brenner.

Referências: SBD (Sociedade Brasileira de Dermatologia), AAD (American Academy of Dermatology Association).

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