O que acontece no seu corpo quando você bebe álcool após a musculação

É claro que chegar até o final de um treino pesado ou superar metas de desempenho são eventos que merecem ser comemorados. Essa é a razão pela qual os cientistas já observaram o comportamento de esportistas para saber como é feito esse brinde após esses eventos.

O resultado das pesquisas mostra que pouco importa se o praticante de atividade física é homem ou mulher, a bebida eleita nessa hora é a cerveja. Para além da sensação de euforia, essa escolha também se dá para repor os líquidos perdidos durante os exercícios.

A dúvida que fica é se o álcool contido nessa bebida pode ou não atrapalhar os lucros do investimento em práticas físicas, especialmente na musculação.

Atletas universitários bebem mais álcool que os não atletas, e tendem ao beber binge [ato de consumir uma grande quantidade de álcool em um curto período de tempo].

4 em 5 mulheres atletas da primeira divisão consomem cerveja.

A associação desse tipo de bebida aos esportes tem forte conexão com os hábitos de consumo desse grupo. Dados publicados pelo International Journal of Sport Nutrition and Exercise Metabolism.

Os efeitos no seu corpo

Embora existam variações de pessoa a pessoa, os riscos e prejuízos decorrentes do consumo do álcool em todos os sistemas do corpo humano já foram exaustivamente comprovados.

Como o álcool é uma substância tóxica que possui efeitos psicoativos e pode gerar dependência, o sistema músculoesquelético e o desempenho esportivo também são prejudicados, não existindo dose que possa ser considerada segura.

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Confira alguns dos efeitos agudos e crônicos já obervados:

Efeitos agudos

  • Cérebro travado

Como o álcool possui receptores no cérebro, já no dia seguinte do consumo de pequenas doses de álcool podem estar presentes alterações comportamentais e psicomotoras.

A redução da atenção, controle, capacidade de julgamento e concentração, habilidades essenciais em todo o tipo de esporte, facilita lesões.

  • Crescimento muscular prejudicado
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Uma das etapas mais importantes para quem investe no crescimento muscular é a síntese proteica, ou seja, a capacidade de absorver nutrientes essenciais (aminoácidos, vitaminas do complexo B e minerais) para manter ou aumentar o músculo.

Exercícios de musculação geram microlesões que, no momento pós-treino, serão reparadas para gerar crescimento.

O álcool prejudica esse processo, além da construção de novas fibras musculares.

Outro possível prejuízo são alterações endócrinas, como por exemplo mudanças nas taxas hormonais: redução da testosterona (hormônio associado ao aumento da massa muscular), bem como o aumento do cortisol (atua na degradação muscular).

  • Perda de líquidos acelerada

Existe a crença de que beber cerveja após o treino é capaz de recuperar fluídos e eletrólitos perdidos por meio do suor.

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Consumir esse tipo de bebida até nem seria um problema, dados os seus ingredientes, mas o que pega nessa equação é o álcool nela contido.

Como a substância inibe o hormônio antidiurético, o resultado é o aumento das idas ao banheiro. Esse efeito acelera a desidratação, o que também prejudica a função muscular e a recuperação.

  • Dano agravado, recuperação lenta

O álcool é uma substância tóxica capaz de elevar os níveis de inflamação no corpo e ainda promove a produção de radicais livres. O resultado é o agravamento de danos musculares já existentes e o atraso do processo de recuperação.

  • Energia na reserva

Exercícios de musculação compreendem atividades de resistência ou treinamento com pesos. Essas práticas requerem a reposição das reservas de glicogênio, uma substância que serve como reserva de energia para o organismo.

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Com o álcool circulando na corrente sanguínea, reduz-se a disponibilidade energética para o tecido muscular.

Outra consequência é a queda da taxa de açúcar no sangue (glicemia), reduzindo os estoques de glicose, um carboidrato importante para quem faz atividade física e busca o aumento muscular.

  • Sono sem descanso

Embora possa causar sonolência, o álcool atrapalha as fases normais do sono, o que atrapalha a liberação de hormônios associados ao crescimento muscular (anabólicos).

Além disso, uma noite mal dormida perturba o processo de recuperação muscular, essencial para o treino dos dias seguintes.

Efeitos crônicos

  • Sem músculos, sem força
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Repetir a prática de beber álcool após o treino mantém o organismo em estado catabólico, ou seja, em vez de promover a síntese proteica, obtendo energia a partir da degradação de macronutrientes (proteína ou carboidratos), o que prevalece é a perda muscular.

A maior dificuldade de ganho e manutenção da massa muscular logo aparece. Com a perda da força muscular, o desempenho nos exercícios que exigem movimentos rápidos e explosivos, como corridas de alta velocidade, levantamento de peso olímpico e variados tipos de saltos decai.

  • De músculo a gordura

O consumo regular de álcool pode também colaborar para o acúmulo de gordura, especialmente na região do abdome, modificando a composição corporal. Isso se deve ao alto valor calórico do álcool (7 kcal por cada grama).

Beber álcool se associa a maus hábitos alimentares, o que leva a um aumento significativo do consumo calórico.

Por ser uma substância tóxica, o corpo prioriza sua eliminação, deixando a oxidação de gorduras e carboidratos em segundo plano. Isso provoca o armazenamento de gordura, inclusive entre os fisicamente ativos.

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Outros mecanismos envolvidos são as mudanças hormonais. Com o aumento das taxas de cortisol e redução da testosterona, fica mais difícil a manutenção da massa magra.

Todas essas mudanças, somadas às possíveis perdas na qualidade do sono, estão associadas ao aumento do apetite e à redução do consumo de proteínas e carboidratos, nutrientes importantes para o processo de ganho, manutenção e recuperação muscular.

Quando se pensa em mudança do estilo de vida, hábitos saudáveis e controle do peso corporal, a restrição de bebidas alcoólicas é uma estratégia importante que traz resultados significativos.

  • O coração reclama

O consumo crônico de álcool pode afetar a saúde cardiovascular, diminuir a capacidade aeróbica, aumentando o risco de hipertensão e outras doenças do coração.

O primeiro passo no metabolismo do álcool é a oxidação do acetaldeído por meio de uma enzima (álcool desidrogenase ou ADH). Mesmo em pequenas concentrações, o acetaldeído é tóxico para o organismo.

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Deficiências de nutrientes e níveis aumentados de toxinas no corpo aceleram o processo.

Ao longo do tempo, o músculo do coração enfraquece (cardiomiopatia alcoólica).

A pressão aumentada ainda pode levar a danos nos rins.

Entenda o trajeto do álcool pelo corpo

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Imagem: iStock / Getty Images

Ao ser ingerido, ele é absorvido por meio do estômago, intestino e fígado, órgão no qual ele sofrerá a ação de enzimas [majoritariamente o álcool desidrogenase (ADH) e a aldeído desidrogenase (ALDH)] que ajudarão na quebra e excreção [metabolização] da substância.

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Os efeitos no organismo podem ser observados por meio dos limites de concentração de álcool no sangue. Mas ainda que duas pessoas tenham consumido o mesmo volume de bebida alcoólica, essa taxa pode variar. A razão para isso é que a concentração sanguínea do álcool é também influenciada pelos seguintes fatores:

Sexo

Idade

Composição corporal

Fase do ciclo menstrual

Exposição prévia ao álcool

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Tipo e volume da bebida consumida

Uso de determinados medicamentos (cimetidina, anti-histamímicos, fenotiazina)

Tabagismo

Presença de doenças crônicas

Tolerância (perfil genético da metabolização)

Esteroides x álcool

Hormônios esteroides naturais ou sintéticos promovem o crescimento celular e sua divisão, levando ao desenvolvimento de variados tipos de tecidos, como o muscular —mas podem ser proibidos ou contraindicados em determinadas situações.

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Beber álcool durante o uso desses esteroides ou outros suplementos similares reduz a eficácia desses produtos, e ainda pode ter efeitos colaterais indesejáveis, especialmente para o fígado.

O álcool reduz a síntese proteica, influencia negativamente as taxas hormonais, inclusive a testosterona natural: os benefícios buscados podem ser reduzidos ou retardados.

Álcool e esteroides são metabolizados no fígado, portanto geram sobrecarga ao órgão, promovendo a maior produção de radicais livres.

Esse estresse oxidativo eleva a probabilidade de vir a ter problemas hepáticos (esteatose, hepatite tóxica e até cirrose).

Álcool e esteroides ainda causam dependência: quanto mais se usa, mais dependente se fica, o que ainda abre as portas para a experimentação de drogas ilícitas.

A testosterona, quando usada por pessoas que não tem deficiência desse hormônio, ainda pode causar alterações cardiológicas, renais e morte neuronal.

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Nos quadros nos quais a indicação do uso desse tipo de hormônio é necessária, os especialistas recomendam fortemente evitar o consumo de álcool durante o período da suplementação. A medida maximiza benefícios e protege a saúde hepática.

Uma questão feminina

As mulheres metabolizam o álcool de forma diferente da dos homens e ainda possuem mais gordura corporal. Esses fatores, juntos, fazem delas mais suscetíveis aos efeitos das bebidas alcoólicas nos músculos.

As mudanças hormonais naturais ao grupo feminino, somadas àquelas provocadas pelo álcool podem prejudicar a recuperação muscular e o desempenho atlético de forma mais acentuada.

A sugestão dos especialistas é ter cautela com o uso de álcool para garantir o desempenho esportivo e colaborar para a recuperação muscular.

Fontes: Ana Beatriz Baptistella, nutricionista pós-graduada em nutrição clínica funcional e esportiva, professora de pós-graduação da VP Nutrição Funcional (SP), dos cursos de pós-graduação em medicina integrativa e medicina do envelhecimento da Fapes Saúde (SP) e no Instituto Premium (SP); Matheus Schettini de Carvalho, médico endocrinologista, professor do curso de medicina da Uniara (Universidade de Araraquara); e Paula Maduro, profissional de educação física, tem doutorado em ciências da saúde e atua no HU-Univasf/Petrolina (Hospital Universitário da Universidade do Vale do São Francisco), que integra a rede Ebserh (Empresa Brasileira de Serviços Hospitalares). Revisão técnica: Paula Maduro.

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Referências:

Simon, L., Bourgeois, B. L., & Molina, P. E. (2023). Alcohol and Skeletal Muscle in Health and Disease. Alcohol research : current reviews, 43(1), 04. https://doi.org/10.35946/arcr.v43.1.04

Levitt, D. E., Luk, H. Y., & Vingren, J. L. (2022). Alcohol, Resistance Exercise, and mTOR Pathway Signaling: An Evidence-Based Narrative Review. Biomolecules, 13(1), 2. Disponível em: https://doi.org/10.3390/biom13010002

Wynne, J. L., & Wilson, P. B. (2021). Got Beer? A Systematic Review of Beer and Exercise. International journal of sport nutrition and exercise metabolism, 31(5), 438-450. https://doi.org/10.1123/ijsnem.2021-0064

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