Quem mora em lugar com áreas verdes tem menos risco de ter obesidade

Pessoas que residem em locais com a maior quantidade de áreas verdes têm menor risco de apresentar obesidade geral, obesidade abdominal e níveis baixos de HDL-colesterol (o colesterol bom). Além disso, têm maior chance de manter a prática de atividade física em intensidade moderada ou vigorosa.

É o que mostraram dois estudos que realizamos recentemente, explorando a associação entre a quantidade de áreas verdes na vizinhança e a prática de atividade física e fatores de risco cardiometabólico, que são um conjunto de condições que aumentam a probabilidade de desenvolvimento das doenças cardiometabólicas, diabetes e doenças cardiovasculares.

A obesidade (geral e abdominal) e os níveis baixos de HDL-colesterol são fatores de risco para o desenvolvimento de diabetes e doenças cardiovasculares. Já a prática de atividade física é considerada um comportamento que reduz o risco de desenvolvimento delas.

Nossos estudos, portanto, indicam que as áreas verdes urbanas têm um possível efeito protetor sobre a saúde cardiometabólica de pessoas adultas.

Saúde urbana: riscos e benefícios de se morar em cidades

O mundo está se tornando cada vez mais urbanizado. De acordo com a Organização das Nações Unidas, 55% da população mundial já vivia em cidades em 2018. Em 2050, espera-se que esse número aumente para 68%.

Quando olhamos para a América Latina e Caribe, esses valores são ainda mais altos: em 2018, 81% da população dessa região já residia em áreas urbanas e esta proporção irá crescer para 90% em 2050.

Esses dados impõem desafios para os setores de planejamento urbano e saúde, pois o ambiente urbano pode oferecer tanto riscos quanto benefícios à saúde das pessoas.

Por um lado, violência, poluição ambiental, degradação das áreas residenciais e as desigualdades na distribuição de recursos sociais e econômicos no espaço urbano são alguns fatores associados a piores indicadores de saúde.

Por outro, o ambiente urbano pode oferecer o acesso a recursos e estruturas que contribuem para a saúde das coletividades, como as áreas verdes, espaços públicos para atividade física, centros de saúde e locais de venda de frutas, legumes e verduras de qualidade e com preços acessíveis.

As áreas verdes urbanas têm sido frequente objeto de estudo de pesquisadores da área de saúde urbana, que é um campo de estudo dedicado a investigar como as características físicas e sociais das cidades podem afetar a saúde e o bem-estar de populações urbanas.

As áreas verdes podem ser definidas como locais públicos com presença de vegetação, como parques, praças, florestas urbanas, zoológicos, jardins e ruas ou canteiros arborizados. As evidências científicas indicam que pessoas que residem em locais com maior quantidade de áreas verdes têm melhor saúde física e mental.

Por que as áreas verdes beneficiam a saúde?

De acordo com a Organização Mundial da Saúde, há algumas explicações para os benefícios das áreas verdes urbanas na saúde das pessoas:

1. A vegetação urbana, especialmente as árvores, contribui para a redução de poluição atmosférica. Árvores promovem a deposição de material particulado na superfície das folhas e absorvem poluentes gasosos pelos estômatos, além de atuar como barreiras ao reduzir a dispersão de poluentes pelo vento. Há menor quantidade de poluição atmosférica no entorno de áreas verdes de grande extensão, como parques, jardins botânicos e florestas urbanas, devido a menor circulação de carros nesses locais.

2. As áreas verdes também podem amenizar a poluição sonora. Árvores podem atuar como uma barreira física ao ruído, principalmente o gerado pelo transporte rodoviário, através dos fenômenos de difração e absorção das ondas sonoras. Além disso, no interior de áreas urbanas de grande extensão há uma tendência a menor ruído devido à ausência de meios de transporte nesses locais.

3. Áreas verdes diminuem a temperatura local pelo processo de evapotranspiração, que consome a energia solar para o resfriamento das folhas. O sombreamento também é outro fenômeno que explica a diminuição da temperatura ao bloquear a radiação solar e impedi-la de chegar à superfície. Dessa forma, áreas verdes urbanas são responsáveis por promover maior sensação de conforto térmico entre aqueles que residem ou frequentam esses locais.

4. Áreas verdes urbanas proporcionam uma ambiência favorável à prática de atividade física ao ar livre, sendo efetivamente utilizadas se também oferecerem segurança. Essas áreas proporcionam também o contato social em atividades de lazer, sociais e recreativas, contribuindo para a interação social e favorecendo a coesão social em uma vizinhança e, por conseguinte, contribuindo para o sentimento de pertencimento ao local, o bem-estar subjetivo e a diminuição dos níveis de estresse.

5. A presença de áreas verdes pode contribuir para a redução de estresse dos indivíduos. Frequentar e ver uma paisagem com vegetação pode estimular a evocação de emoções e pensamentos positivos, ao passo que bloqueia as negativas, contribuindo, dessa forma para amenizar o estresse.

Impacto de áreas verdes na saúde

O Estudo Longitudinal de Saúde do Adulto (ELSA-Brasil) é o maior estudo epidemiológico realizado na América Latina sobre os fatores determinantes das doenças cardiovasculares e do diabetes. Conduzido com servidores públicos, ativos e aposentados, de seis capitais brasileiras —Belo Horizonte, Porto Alegre, Rio de Janeiro, Salvador, São Paulo e Vitória—, o ELSA-Brasil fez a primeira avaliação de seus participantes em 2008-2010.

Já são mais de 17 anos de acompanhamento dos participantes do estudo e foram realizadas mais três visitas para novas entrevistas e exames. Mais de 500 artigos científicos já foram publicados sobre os mais diversos temas na área da saúde usando o ELSA como base de dados. Nossos estudos estão entre eles.

No primeiro trabalho, realizamos uma análise transversal com cerca de 2 mil participantes residentes na cidade de Belo Horizonte na linha de base do ELSA-Brasil (2008-2010).

O estudo, publicado na renomada revista na área de saúde urbana Health & Place, mostrou que os participantes que residiam em locais com a maior quantidade de áreas verdes, quando comparados àqueles que moravam em locais com a menor quantidade de áreas verdes, tinham menor risco de apresentarem obesidade geral e abdominal e níveis baixos de HDL-colesterol.

No outro estudo, publicado no Journal of Urban Health, foi realizada uma análise longitudinal de 4,8 mil participantes residentes em Belo Horizonte e São Paulo. Esses participantes foram indagados quanto à prática de atividade física em três visitas de seguimento do ELSA-Brasil: 2008-2010, 2012-2014 e 2017-2019.

Quando comparados aos participantes que residiam em locais com a menor quantidade de áreas verdes, aqueles que residiam em locais com maiores quantidade de áreas verdes tinham maior chance de manter a prática de atividade física em intensidade moderada/vigorosa durante esse período de seguimento.

Importante destacar que essas associações foram independentes de outras características do ambiente da vizinhança, como a percepção de segurança e a quantidade de calçadas pavimentadas e postes de iluminação pública.

No entanto, foram fortemente influenciadas pela condição socioeconômica da vizinhança, ou seja, locais com melhor condição socioeconômica tinham mais áreas verdes e mais moradores fisicamente ativos.

Esses estudos mostram, portanto, que o desenvolvimento de intervenções no ambiente urbano que visem a proteção, a manutenção e o aumento da quantidade de áreas verdes podem contribuir para melhorar a saúde da população.

Também, acreditamos que essas intervenções contribuam para atenuar desvantagens contextuais, sobretudo nas áreas urbanas mais vulneráveis, contribuindo para redução das iniquidades em saúde.The Conversation

* Luciene Almeida, pesquisadora do Laboratório de Educação em Ambiente e Saúde, Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz)

Este artigo foi republicado do The Conversation sob uma licença Creative Commons. Leia o artigo original aqui

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