Parassonia: entenda distúrbio do sono alegado por agressor de paisagista

A Justiça do Rio de Janeiro considerou inimputável Vinícius Batista Serra, acusado de tentativa de feminicídio e agressão contra a paisagista Elaine Caparroz. Segundo a decisão, ele não pode ser responsabilizado pelo crime porque o teria cometido durante um episódio de parassonia.

O que é parassonia?

Uma categoria de distúrbios do sono. Para receber este diagnóstico, o paciente deve apresentar um estado de sono "dissociativo", segundo a Classificação Internacional de Transtornos do Sono, em que a pessoa acorda apenas parcialmente — o que acontece durante períodos de transição dos estágios do sono.

Há uma série de sintomas. Entre eles estão movimentos, comportamentos, emoções, percepções e sonhos anormais durante a noite. Fala desordenada, caminhar enquanto dorme, troca de roupas, abrir e fechar de portas e janelas são comportamentos já relatados por pessoas com parassonias.

Nem toda parassonia é igual. Entre os diversos tipos de parassonias estão sonambulismo (levantar-se e andar enquanto dorme), terrores noturnos, transtornos alimentares relacionados ao sono (com episódios de comer compulsivo enquanto dorme, por exemplo), paralisia do sono e sexsomnia (comportamentos sexuais durante o sono, que vão de masturbação a tentativa de relação sexual com parceiro e movimentos violentos).

Outros distúrbios do sono podem coexistir com a parassonia. Além disso, há uma série de condições que podem levar a um episódio de parassonia. São eles: cansaço, fadiga, privação de sono, estresse, consumo de álcool e drogas, lesões ou doenças neurológicas, gravidez, menstruação, doenças inflamatórias, genética (histórico familiar de pessoas com parassonias). Distúrbios do sono também podem estar ligados a outros problemas de saúde mental, como depressão e ansiedade.

Há pacientes que desenvolvem comportamentos que não têm acordados. Muitas vezes, no entanto, não é determinado qual processo neurobiológico leva ao início do episódio de parassonia.

Pessoas com parassonias não se lembram do que fizeram. Elas não têm consciência do que estão fazendo no momento da ação.

Parassonia pode levar à violência?

Nem toda parassonia gera comportamentos agressivos. No entanto, há comportamentos agressivos que ocorrem durante um episódio de parassonia, em alguns pacientes. Por exemplo, há relatos de pacientes com parassonia sexual (sexsomnia) que estupraram parceiros ou conhecidos que dormiam nas suas proximidades.

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Parassonia violenta predomina em homens. Acredita-se que o distúrbio comportamental em sono REM, o RBD, aconteça por uma falha do corpo em gerar a perda de tônus muscular durante a noite. Por causa disso, a pessoa pode agir conforme esteja sonhando, levando a atos físicos e até violentos, apontou um artigo publicado no periódico Arquivos de Neuro-Psiquiatria em 2014. Cerca de 90% dos pacientes com o problema são homens, mas é importante frisar que nem todo paciente com histórico de agressividade durante o sono tem RBD.

Para chegar à conclusão que agressão aconteceu por parassonia é preciso perícia especializada. Isso inclui avaliação de neurologistas, psicólogos e psiquiatras, apresentação de histórico médico e de vida, além de possíveis testemunhas. A realização ainda de um exame específico, a polissonografia, principal ferramenta de diagnóstico de distúrbio do sono, é fundamental.

Ter parassonia não indica, necessariamente, que um crime aconteceu durante um episódio. Por isso, este tipo de decisão judicial é desafiadora para médicos e juristas.

Se há certeza de que agressão aconteceu durante episódio, paciente não pode ser responsabilizado. Isso porque não haveria a vontade humana de cometer o crime. Para determinar se houve o crime, é preciso dois tipos de prova técnica: uma de que a pessoa sofre a condição e outra de que o ato foi cometido por conta do distúrbio.

Explicação, contudo, já é aceita em diversos países. Nos EUA e no Reino Unido, parassonias já foram utilizadas em tribunais para inocentar acusados de crimes cometidos.

Tratamento compulsório e medida de segurança

Justiça determinou uma medida de segurança contra o acusado. Inicialmente, Vinícius Batista Serra deveria ser internado em hospital psiquiátrico. Após recurso da defesa, a medida foi alterada para ''tratamento ambulatorial'', indo a uma unidade de saúde todo mês e se medicando.

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O estado de saúde dele passará por reavaliações. Dependendo do resultado, Serra poderá ser internado em um local de tratamento psiquiátrico. ''Tem função análoga à da pena, uma vez que implica na restrição da liberdade, total ou parcial do agente'', justificou o documento.

Universidade de Navarra, na Espanha, recomenda o uso de ansiolíticos com efeito calmante em pacientes com parassonia. Entre as substâncias mais utilizadas estão o diazepam e alprazolam, sempre tomados sob orientação médica, dependendo do quadro. Terapia cognitiva-comportamental e modificação do ambiente do sono também são técnicas empregadas para minimizar riscos para o paciente e aqueles ao seu redor.

*Com informações de matérias publicadas em 09/07/2014, 27/05/2019, 22/08/2023 e 03/12/2024.

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