Hormônio do crescimento pode ter ligação com a ansiedade

Conhecido por seu papel no crescimento de todos os tecidos do corpo humano, o hormônio do crescimento, o GH, pode ter relação com a ansiedade, segundo uma pesquisa feita com camundongos.

Um estudo realizado por pesquisadores da USP (Universidade de São Paulo) e publicado em outubro de 2023 no periódico The Journal of Neuroscience aprofundou o entendimento sobre a capacidade do GH em reduzir a ansiedade. Além disso, pela primeira vez, foi identificada a população de neurônios responsável por modular os efeitos do hormônio em doenças neuropsiquiátricas, como o transtorno de ansiedade, depressão e estresse pós-traumático.

Como o estudo foi feito

No estudo, os pesquisadores utilizaram três tipos de experimentos com os camundongos (campo aberto, labirinto em cruz elevado e caixa claro-escuro) para testar a capacidade dos animais de explorar o ambiente e de se colocar em risco. Esses experimentos medem o comportamento do animal semelhante à ansiedade e à memória do medo (que está por trás dos movimentos de estresse pós-traumático).

Os pesquisadores observaram que, ao retirarem o receptor de GH de células neuronais que expressam o peptídeo somatostatina (um antagonista do hormônio de crescimento), houve um aumento do comportamento semelhante à ansiedade em camundongos machos.

Os testes demonstraram ainda que, depois de retirarem o receptor de GH, houve redução da memória do medo em animais de ambos os sexos. A descoberta pode permitir que no futuro novas classes de medicamentos ansiolíticos sejam desenvolvidas.

"A descoberta sobre o mecanismo envolvendo o efeito ansiolítico do GH abre caminho para uma possível explicação — meramente química— sobre esses distúrbios e por que em situações com maior ou menor secreção do hormônio do crescimento os indivíduos apresentam maior ou menor prevalência desses distúrbios", explica José Donato Júnior, professor do ICB-USP (Instituto de Ciências Biomédicas da Universidade de São Paulo) e autor do artigo.

O pesquisador afirma que ainda não se sabe por que no estudo não houve aumento de comportamento semelhante à ansiedade em camundongos fêmeas. "Acreditamos que seja pelo fato de haver um dimorfismo sexual. Sabemos que a estrutura nessa área do cérebro onde estão os neurônios que estudamos é um pouco diferente entre machos e fêmeas. Não por acaso, alguns transtornos são diferentes entre homens e mulheres", diz.

A parte química

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Imagem: Getty Images
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Milhares de pessoas sofrem de doenças neuropsiquiátricas em todo o mundo. Embora ansiedade e depressão estejam entre os transtornos mais comuns, ainda não está totalmente esclarecido quais são as causas exatas para estes problemas. Acredita-se, inclusive, que possa ser uma combinação de fatores como estresse, genética, pressões sociais, econômicas, de gênero, entre outros que possam contribuir para a ocorrência desses transtornos.

Evidências crescentes sugerem que os hormônios também podem desempenhar um papel importante na regulação de diversos aspectos neurológicos, modificando assim a predisposição a esses distúrbios.

Alterações nos níveis de hormônios sexuais como o estradiol, por exemplo, afetam comportamento semelhante à ansiedade ou depressão e memória de medo em roedores e humanos. Outros estudos, ainda preliminares, demonstraram que os glicocorticoides (hormônios sintetizados a partir do cortisol) podem estar envolvidos no surgimento de doenças neuropsiquiátricas.

Pelo menos no caso do GH, ainda não havia sido identificado o mecanismo de regulação do hormônio em neurônios associados a doenças neuropsiquiátricas. "Demonstramos que o hormônio do crescimento muda a sinapse alterando estruturalmente os neurônios que secretam somatostatina", relata o pesquisador.

No estudo, os pesquisadores comprovaram ainda que transtorno de ansiedade, memória de medo e estresse pós-traumático são faces diferentes de um mesmo circuito neuronal.

Vale destacar que a ansiedade pode ser definida como um medo excessivo (falta de confiança). Já a memória do medo, explica Donato Júnior, está relacionada a algum evento negativo que gera uma resposta (uma alteração no cérebro), e toda vez que o animal ou o indivíduo é exposto novamente à mesma situação, há uma reação exagerada de medo, podendo haver paralisia ou outros sintomas, como choro excessivo ou tremedeira.

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"Tudo isso acontece na mesma população de neurônios. São eles que expressam o receptor de GH e quando, no nosso experimento, desligamos esse receptor, os animais tiveram uma redução na formação de memória do medo. Isso significa que a capacidade de formação dessa memória de medo fica prejudicada. Pode ser que em situações de estresse pós-traumático o GH seja um fator que contribua para o desenvolvimento desses transtornos", diz.

Isso porque uma sucessão de estresse crônico eleva outro hormônio denominado grelina, um potente estimulador da secreção de GH. "A grelina já vem sendo estudada no estresse pós-traumático há bastante tempo e alguns estudos demonstraram que é justamente essa secreção de GH induzida pela grelina que está aumentada no estresse crônico. Isso favorece o desenvolvimento da memória de medo e estresse pós-traumático no cérebro do animal."

*Com informações de reportagem publicada em 13/12/2023

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