Por que devemos ficar céticos com anúncio russo de vacina contra o câncer?
O governo russo anunciou esta semana que desenvolveu uma vacina contra o câncer. De acordo com a agência russa de notícias, a previsão é que o imunizante comece a ser distribuído para pacientes de forma gratuita a partir do início de 2025.
O que aconteceu
Governo russo anunciou vacina contra o câncer. De acordo com a agência russa de notícias, o imunizante foi desenvolvido em colaboração com "diversos centros de pesquisa". "Ensaio pré-clínicos demonstraram que a dose suprime o desenvolvimento de tumores e de potenciais metástases."
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Dois tipos de vacina. O Centro Nacional de Pesquisa Médica do Ministério da Saúde russo informou que trabalha com duas linhas de vacinas oncológicas. Uma delas é uma vacina personalizada que utiliza tecnologia mRNA. O segundo imunizante é a Enteromix, formulada com base numa combinação de quatro vírus não-patogênicos que têm a habilidade de destruir células malignas e, simultaneamente, ativar a imunidade de pacientes contra um tumor.
Não há dados científicos conhecidos. A Rússia não divulgou sequer um único dado de estudo científico sobre os quais pesquisadores do mundo todo possam se debruçar para entender os imunizantes divulgados.
Existem milhares de tipos de câncer. David Jenkinson, chefe de pesquisa sobre câncer infantil na instituição de caridade médica LifeArc, de Londres, disse à Newsweek: "Acho que o que não faz sentido é uma vacina para câncer, já que todos sabemos que existem múltiplos tipos de câncer", disse Mills. "Então, seria esta uma vacina universal para todos os cânceres? Eu seria muito cético em relação a isso. Acho que isso é impossível."
Perguntas sem resposta. Qual é o câncer? Qual é o antígeno? Onde estão os dados do ensaio clínico? Cientistas do mundo todo se fazem todas estas perguntas, por enquanto, sem resposta. Não há disponível qualquer dado, de qualquer fase de estudo, que permita uma avaliação adequada.
Eles disseram que têm dados, mas eles não foram publicados e apresentados, estamos aguardando. Debora Dornellas, oncologista no Hospital Albert Einstein, em vídeo no Instagram
Sim, estamos cada vez mais perto de vacinas contra o câncer, principalmente depois da tecnologia de mRNA. Entretanto, anúncios científicos de verdade se dão através da transparência da publicação dos dados, da execução e do compartilhamento de informações a partir de estudos clínicos e a gente não tem nada sobre essa vacina da Rússia. Absolutamente nada. Então o que me resta sobre essa notícia é o ceticismo. Não há absolutamente nada que aponte claramente para que essa notícia seja real. Luana Araújo, médica infectologia, em vídeo no Instagram
O que já existe
Vacina contra HPV previne câncer. A vacina de HPV, disponível no SUS para meninos e meninas de 9 a 14 anos, previne o surgimento da infecção pelo vírus HPV, que pode provocar alguns tipos de câncer, sendo o de colo de útero o principal, mas também de pênis, vulva, vagina, do canal anal, de garganta e orofaringe.
Vacina de mRNA contra melanoma. Em abril deste ano, um inglês foi o primeiro paciente a tomar uma nova vacina contra o tipo mais mortal de câncer de pele, o melanoma. Imunizante foi projetado para ajudar o sistema imunológico do paciente a reconhecer e eliminar células cancerígenas.
Injeção é "personalizada" para cada paciente. Medicamento faz o corpo produzir até 34 proteínas, cada uma visando "neoantígenos" identificados por sequenciamento genético e que se acredita estarem causando o câncer naquele paciente específico. Como as vacinas de covid-19, vacina é baseada em mRNA. Não há previsão de chegada de medicamento ao Brasil. Atualmente, a vacina é produzida pela Moderna e MSD, e está em fase de testes, que se estendem a outros tumores, como de pulmão, bexiga e rins.