Topo

Química que dá sabor ao seu prato pode estar prejudicando sua saúde

Imagem: Getty Images

Colaboração para VivaBem

08/01/2025 05h31

A crosta levemente tostada de um pão assado, o dourado crocante de um frango grelhado, ou até a caramelização que dá sabor ao bacon são exemplos clássicos dos chamados AGEs, a sigla em inglês para 'Advanced Glycation End Products', em português 'produtos finais da glicação avançada.'

Parece algo bem complexo, mas a gente explica: os AGEs estão profundamente inseridos na rotina alimentar ocidental, sendo amplamente gerados durante o cozimento, especialmente por meio da reação de Maillard —um processo químico em que açúcares e proteínas se combinam em altas temperaturas, criando alterações de cor e sabor nos alimentos.

A reação, além de acontecer nos preparos caseiros, também está presente em muitos alimentos ultraprocessados, como salgadinhos e até cereais que comemos nos café da manhã.

Embora sejam quase irresistíveis ao paladar, os AGEs, quando consumidos em excesso, estão associados a processos inflamatórios, danos celulares e ao envelhecimento precoce. Entender como e onde eles se formam pode ajudar a equilibrar sabor e saúde na alimentação diária.

Os malefícios dos AGEs à saúde

"Esses compostos se acumulam nos tecidos ao longo do tempo, especialmente em condições de alto nível de açúcar no sangue, como no caso do diabetes", explica Michelle Davenport, nutricionista e pesquisadora de nutrição treinada pela UCSF (University of California, San Francisco) e pela NYU (New York University).

De acordo com a especialista, os AGEs estão relacionados ao envelhecimento porque danificam proteínas, DNA e células, provocando inflamação e estresse oxidativo, que aceleram o desgaste celular.

"Essa inflamação causa danos em órgãos, tecidos e vasos sanguíneos, acelerando o envelhecimento e elevando o risco de doenças como Alzheimer, doenças cardiovasculares e renais."

Davenport também alerta que os AGEs alteram a estrutura de proteínas importantes como o colágeno e a elastina, que não só são responsáveis por manter a firmeza da pele e a flexibilidade das articulações como contribui para alterações que estão ligadas à formação de placas que contribuem para doenças cardiovasculares.

Existe um limite de quanto consumir?

Imagem: Keiny Andrade/UOL

Clique para acessar conteúdo externo

Keiny Andrade/UOL ()

A médica endocrinologista Deborah Beranger explica que não existe um limite específico para o consumo de AGEs, mas uma menor ingestão está relacionada a menos danos celulares, e consequentemente, um possível retardamento do envelhecimento.

Vale ressaltar, no entanto, que os AGEs não são os únicos responsáveis pelos problemas de saúde mencionados, e que outros fatores pouco saudáveis, como fumar, a falta de exercícios, o excesso de gordura corporal e a privação de sono, também contribuem para danos celulares e o desenvolvimento de diversas doenças.

Beranger também destaca que algumas pessoas são mais suscetíveis aos danos causados pelos AGEs.

"Pacientes diabéticos, por exemplo, tendem a ter mais glicação [isso significa que, com níveis elevados de glicose no sangue, há uma maior reação entre o açúcar e as proteínas do corpo, formando AGEs em maior quantidade]. Por isso, é fundamental manter os níveis de glicose dentro de um intervalo saudável, o que reduz significativamente a formação desses compostos", explica a médica, que tem pós-graduação em endocrinologia e metabologia pela Santa Casa de Misericórdia do Rio de Janeiro.

Para controlar a doença, a recomendação é adotar uma alimentação equilibrada, praticar atividades físicas regularmente e usar as medicações apropriadas, sempre com acompanhamento médico, para manter a glicemia sob controle.

Como diminuir o consumo de AGEs

"Métodos como o cozimento a vapor, fervura e até o preparo no micro-ondas, que utilizam temperaturas mais baixas e maior quantidade de água, produzem menos AGEs", aponta Marcella Garcez, médica nutróloga, diretora da Abran (Associação Brasileira de Nutrologia) e docente do curso nacional de nutrologia na mesma entidade.

Garcez lista dicas para quem quer diminuir o consumo dos compostos adotar na cozinha:

Priorizar métodos como cozinhar no vapor, ferver e assar em temperaturas mais baixas.

Marinar carnes e proteínas em vinagre ou suco de limão, o que pode diminuir a formação de AGEs durante o cozimento

Limitar o consumo de fast food e produtos ultraprocessados, que são ricos em AGEs

Aumentar o consumo de alimentos de origem vegetal que tendem a conter menos AGEs e oferecem antioxidantes que combatem os efeitos oxidativos desses compostos.

Neta de vietnamitas, a nutricionista Michelle Davenport conta à reportagem que, durante sua pesquisa sobre o tema, ficou surpresa ao perceber como as recomendações para uma dieta pobre em AGEs se alinhavam às comidas culturais com as quais cresceu.

"Grande parte da culinária tradicional vietnamita baseia-se em métodos como cozimento com água, marinadas ácidas, muitas especiarias e uma grande variedade de plantas. Essa abordagem não é exclusiva da Ásia; ela reflete práticas culinárias tradicionais de várias culturas."

Para quem deseja adotar uma mudança gradual no cardápio —e não apenas experimentar uma receita única com menos 'AGEs', a sugestão de Davenport é buscar receitas que façam sentido para você. Isso pode, inclusive, envolver uma pesquisa nos livros antigos de receitas da sua avó ou bisavó.

"Não se trata de adotar novos hábitos, mas de redescobrir aqueles que foram esquecidos. E se não houver referências em sua família, tudo bem —você pode adaptar receitas e torná-las suas. Essa é uma das vantagens da internet."

Comunicar erro

Comunique à Redação erros de português, de informação ou técnicos encontrados nesta página:

Química que dá sabor ao seu prato pode estar prejudicando sua saúde - UOL

Obs: Link e título da página são enviados automaticamente ao UOL

Ao prosseguir você concorda com nossa Política de Privacidade


Alimentação