O que acontece no seu corpo quando você sente dor
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Na categoria dos sintomas, nenhuma outra queixa supera a dor nos consultórios médicos. O curioso é que, apesar de ela ser frequente na população em geral, o seu tratamento pode ser desafiador. Afinal, cada pessoa é única no jeito de perceber esse desconforto, que pode ir muito além da gravidade de uma lesão.
Entre os especialistas, a dor é definida como uma experiência sensorial e emocional desagradável associada ou semelhante a algum dano real ou potencial nos tecidos, o que é influenciado por fatores biológicos, psicológicos e sociais. No entanto, ela tem um papel fundamental no equilíbrio do organismo, sinalizando que algo não vai bem.
Presente em todas as faixas etárias, a dor acomete mais as mulheres. Até o momento, porém, a razão para isso não foi totalmente esclarecida. As pistas apontam para questões hormonais, culturais, além da maior atenção feminina com a saúde, o que leva a um maior volume de diagnósticos.
4 em cada 10 pessoas têm dor crônica no Brasil.
Dor lombar é a mais frequente (77%), seguida de dor no joelho (50%); no ombro (36%), no tornozelo (28%), nas mãos (23%) e na cervical (21%).
Entre pessoas de 15 a 64 anos, as dores musculoesqueléticas são o problema de saúde mais comum e relacionado à aposentadoria precoce. Elas ainda estão entre as principais causas de tratamento de longo prazo. Dados do Ministério da Saúde.
Os efeitos no seu corpo
Diante da dor que aparece de forma súbita (aguda), o seu organismo responde com a ativação de variados processos que estão interligados e são mediados pelo sistema nervoso central, principalmente o neuroendócrino, que regula as funções corporais e emocionais.
Quando a agressão que causou a dor é afastada, restabelece-se o equilíbrio do organismo e tudo volta ao normal. No entanto, enquanto a ameaça durar, algumas mudanças podem ser observadas em variados sistemas. Confira algumas delas:
Sistema nervoso sensorial
Alterações no processamento da dor
Risco de a dor se tornar crônica
Tremores
Arrepios
Dores intensas podem ativar regiões do cérebro associadas às emoções (amígdala, hipotálamo, córtex, etc.). Isso pode resultar em ansiedade porque a dor pode desencadear o estado de vigilância e seus respectivos sintomas.
A dor também pode gerar um estado depressivo, tornando a pessoa mais sensível à experiência dolorosa.
Esses componentes emocionais podem dificultar o tratamento. Daí a importância de uma abordagem multidisciplinar, que inclua a psicoterapia.
Cardiovascular
Aumento do ritmo cardíaco e da pressão sanguínea
Retenção de líquidos
Aumento da necessidade de oxigênio
Musculoesquelético
Tensão e contrações musculares
Cãibra
Endócrino
Aumento da glicose no sangue
Aumento da produção de cortisol
Gastrointestinal
Náusea
Vômito
Redução do esvaziamento gástrico e motilidade intestinal
Urinário
Urgência para urinar
Incontinência
Entenda o caminho da dor
As terminações nervosas existentes em todo o seu corpo são responsáveis pela percepção de estímulos externos. São elas que o ajudam a distinguir o frio do calor e texturas, por exemplo, mas algumas têm a função específica de detectar as sensações dolorosas.
1. Quando um ferimento externo acontece é como se ligasse um alarme que manda uma mensagem por meio de terminações nervosas até o sistema nervoso central.
2. Na sequência você sente e localiza onde houve a agressão.
3. Nessa hora, o sistema interno (sistema inibitório dependente) que controla a percepção dolorosa é ativado.
4. A partir daí inicia uma espécie de efeito cascata que compreende respostas do organismo que desencadearão uma ação reflexa para que você se afaste da agressão.
Um exemplo é encostar em uma chapa quente: a resposta imediata é retrair a mão para não se queimar.
De onde ela vem

A causa mais frequente da dor é alguma lesão nos órgãos ou sistemas do corpo, o que é definido pelos especialistas como dor nociceptiva.
Tais lesões podem ter origem inflamatória, infecciosa ou traumática. Quando existe inflamação, a dor nociceptiva é inflamatória e geralmente é acompanhada por inchaço e vermelhidão.
São exemplos desse tipo de dor a tendinite, osteoartrite, alguns tipos de dor de cabeça; amputação, compressão tumoral etc.
Essa dor pode se manifestar como dor profunda, em peso, pontada, aperto, latejamento, tensão, queimação, etc.
Quando a dor decorre de uma disfunção ou lesão nos nervos causada por problemas que afetem a medula espinhal, como uma hérnia de disco, por exemplo, o sistema nervoso periférico também é ativado. Nestes casos, trata-se de dor neuropática.
Esse tipo de experiência dolorosa é semelhante à sensação de frio doloroso, amortecimento, agulhada, formigamento etc.
Incômodos mais comuns
Nos consultórios médicos, as queixas mais frequentes são dores lombares, tendinites, generalizadas (como a fibromialgia), decorrentes de sequelas de acidentes ou fraturas, além das neuropáticas periféricas, como as associadas ao diabetes.
Dor aguda x crônica
A dor é compreendida como um mecanismo de proteção que sinaliza a presença de uma lesão, inflamação ou uma doença.
Quando ela é súbita, é definida como aguda, pode ser intensa, mas tende a passar tão logo o corpo se recupere das condições que lhe deram origem.
Quando ela dura no tempo, por meses e até anos, é definida como crônica, e pode ter uma causa definida, como uma doença de base, mas nem sempre é possível identificar a origem do sintoma.
Nem sempre a dor é sintoma
Atualmente, os cientistas já descobriram que, por vezes, a dor é uma doença decorrente de alterações no sistema nervoso que fazem que você se torne mais sensível à ela.
Nesses quadros o desconforto é contínuo e mais intenso. É como se o sistema de alarme que sinaliza que existe algo errado estivesse disparado o tempo todo.
O que indica que a dor deixou de ser sintoma e passou a ser uma doença é a falta de justificativa —já não há mais fratura, nem processo inflamatório, nem artrite etc., mas você continua sentindo dor.
Dá para controlar
Como a experiência de cada pessoa com a dor é única, o tratamento é sempre individualizado. O objetivo é reduzir o sofrimento e restabelecer a qualidade de vida.
A maior preocupação dos especialistas é oferecer opções eficazes e seguras que atendam a cada tipo de dor (aguda ou crônica) e combatam a sua causa. Na maioria das vezes, essas medidas abrangem o uso de medicamentos e outras práticas.
Conheça as possíveis estratégias:
Uso de MIPs (medicamentos isentos de prescrição), como analgésicos e medicações que combatem inflamações, como os AINEs (anti-inflamatórios não Esteroidais).
Fisioterapia
Psicoterapia
Acupuntura
Meditação (mindfulness)
MIPs e AINEs devem ser utilizados por breve tempo e, preferencialmente, sob orientação médica, dado o perfil de efeitos colaterais, especialmente entre a população idosa.
Outros medicamentos mais específicos, que requerem prescrição médica e são capazes de bloquear os sinais da dor ou o processamento dela também podem ser utilizados. A depender do quadro de cada pessoa, outras classes de medicamentos poderão ser indicadas.
O que cabe a você
Agora que você já entendeu que o tratamento da dor, especialmente quando ela é crônica, envolve uma série de práticas e o trabalho de diferentes especialistas, é importante saber como colaborar com seu médico.
Além de aprender mais sobre a dor e seus mecanismos, a sugestão é que você aceite que apesar de essa condição ser desafiadora, é possível conviver com ela por meio do cuidado especializado e estratégias terapêuticas individualizadas.
Muitas vezes, a dor não possui uma doença relacionada que precisa ser diagnosticada. O incômodo pode ser ele mesmo a própria doença.
Dadas as características da dor, nem o médico e nenhuma medicina de ponta vão dar conta da complexidade que envolve esse tipo de tratamento.
Assim, esteja disponível para as sugestões terapêuticas que vão além do uso de medicamentos, como a psicoterapia e a fisioterapia, por exemplo.
O seu autocuidado, que compreende um estilo de vida saudável, desenvolvendo atividades sociais, mentais e físicas aumentam —e muito— a probabilidade de controle adequado da dor e melhoria significativa da sua qualidade de vida.
Fontes: Josenília Alves Gomes, professora de medicina da UFC (Universidade Federal do Ceará) e atual superintendente do Complexo Hospitalar da mesma instituição; desenvolve suas atividades médicas no Ambulatório de Dor do HUWC-UFC (Hospital Universitário Walter Cantídio), que integra a rede Ebserh (Empresa Brasileira de Serviços Hospitalares); Karina Barros, cientista com mestrado e doutorado pela Unifesp e University of Southampton (Reino Unido), diretora associada da área médica da Kenvue Latam; e Thiago Mattar Cunha, professor de farmacologia da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto da USP. Revisão técnica: Josenília Alves Gomes.
Referências:
IASP (International Association For the Study of Pain).
Ministério da Saúde. Portaria Conjunta SAES/SAPS/SECTICS/NS n. 01, de 22 de agosto de 2024. Disponível em https://www.gov.br/conitec/pt-br/midias/protocolos/dorcronica-1.pdf
Chen JS, Kandle PF, Murray IV, et al. Physiology, Pain. [Atualizado em 2023 Jul 24]. In: StatPearls [Internet]. Treasure Island (FL): StatPearls Publishing; 2025 Jan-. Disponível em: https://www.ncbi.nlm.nih.gov/books/NBK539789/
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