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Minha idade, minhas regras

Liberdade e ausência de rótulos são segredo de longevidade

No último dia 3 de dezembro, VivaBem apresentou pela primeira vez o Ageless Talks, uma série de painéis e discursos para debater a geração 45+. Idealizado pela jornalista e autora da coluna Ageless Silvia Ruiz, em sua primeira edição reuniu mais de 20 nomes, entre celebridades, atletas, especialistas e formadores de opinião que refletiram sobre suas próprias experiências, clichês e paradigmas de cada fase do amadurecimento.

Dados do IBGE mostram que até 2060 o número de idosos deve superar o de jovens no Brasil. Dentro desse contexto, a nova maturidade deve se tornar tão relevante quanto os chamados millenials. Um reflexo do fato de homens e mulheres atualmente viverem mais no país: enquanto eles alcançam cerca de 72,8 anos de vida, elas completam em média 78,9 anos. E, consequentemente, todos desejam viver melhor.

Esqueça porém —ou se prepare para repensar— tudo o que você sabia sobre maturidade ao observar os mais velhos, imaginando como seria chegar ali aos 45, 50, 60 anos. A idade biológica já não significa limitação, beleza e sexualidade resistem cada vez mais à ditadura da juventude e os novos padrões de comportamento —ou a ausência deles— apontam para uma jornada mais livre e feliz, não obstante aos sinais da chegada da idade.

Invisíveis? Não mais!

Convidada para abrir a programação, a atriz Claudia Raia, 53, lembrou como é difícil viver em uma sociedade que trata mulheres de 50 anos como se fossem invisíveis. Claudia destacou, contudo, que diferente das gerações anteriores de cinquentonas, hoje elas não estão mais relegadas a cuidar dos netos, da rotina de casa ou em atividades antigamente relacionada às idosas.

Confira alguns trechos de seu discurso de abertura e assista-o completo no vídeo abaixo:

"Queria trazer aqui a memória de um vídeo curioso que resgatei há alguns dias, de quando participei do programa Roda Viva, aos 24 anos. Na época, a Mônica Bergamo, então repórter da Veja, me fez uma pergunta em alusão à personagem de um musical que eu interpretava sobre se eu tinha pavor de envelhecer e como me via dali a 30 anos. Do alto da minha ingenuidade, respondi que me via péssima, destruída, acabada e que teria que me casar com um cirurgião plástico... Ainda bem que as coisas mudam.

Hoje, as vésperas de completar exatamente os 54 anos temidos por aquela jovem Claudia de 24, acho essa história hilária. Pois exatamente nada do que ela previu se tornou realidade. Não estou brincando quando digo que estou no meu melhor momento. Começando o segundo ato da minha vida. E o segundo ato, pelo menos no teatro, é sempre o mais marcante e impactante que o primeiro e ainda terá um grand finale.

Hoje sou dona da minha vida, do meu dinheiro, da minha força de trabalho, da minha criatividade, do meu desejo, da minha libido e entendo meu corpo e minha mente de uma maneira muito mais completa. Sei bem o que eu quero, quando quero e como quero. Me sinto completamente à vontade com o que eu vejo quando me olho no espelho.

Nada contra quem está cuidando dos netos e fazendo tricô. Mas vamos celebrar a possibilidade de escolha que a gente tem, de fazer o que a gente quiser. Porém, muitas mulheres de 50 anos hoje também estão cuidando dos filhos que podem ainda estar na infância, estão com a carreira organizada... Ou seja, estamos em potência máxima."

Hoje em dia, o peso da idade parece ser medido muito mais pelo perfil individual de cada um do que literalmente por seus anos de vida. E, além de refletir escolhas pessoais, resulta também das muitas revoluções sociais que essa geração nascida a partir de meados dos anos 60 vivenciou.

Nesta janela de história, especialmente as mulheres protagonizaram mudanças como a entrada no mercado de trabalho com mais força e em territórios inexplorados, poder de escolha como tomar anticoncepcional, fazer planejamento familiar ou se divorciar.

Uma pesquisa realizada há um ano pela SuperHuman constatou que 90% das mulheres mais maduras se sente mais jovens que as próprias mães na mesma idade. O que mostra que a autonomia histórica conquistada parece ter feito com que elas —e também os homens— sejam hoje mais empenhadas em se cuidar e preservar, na medida do possível e com a ajuda de medicina e tecnologias, a vitalidade que sentiam quando mais novas.

67% das mulheres maduras se sentem mais confiantes que há dez anos. SuperHuman

Em painel sobre como estilo de vida define o corpo sem prejuízo da idade biológica, o empresário e modelo Paulo Zulu, 57, e o ex-jogador de futebol e palestrante Zé Roberto, 46, foram unânimes em reconhecer nas escolhas de alimentação e na prática constante de atividades físicas ao longo da vida, a disponibilidade física que ainda sentem para se dedicar aos esportes que amam.

Para mulheres, esses mesmos hábitos podem e devem estar aliados a terapias de reposição hormonal se necessárias. A endocrinologista e nutróloga Vânia Assaly alerta para o cuidado com exageros. Mas, como declarou Silvia Ruiz, adepta da reposição desde os 47 anos, esta é uma boa alternativa para quem como ela, prefere não vivenciar os incômodos da menopausa.

O novo conceito de como envelhecer não envolve apenas mudanças de estilo de vida. Ainda passa por enfrentar opressões sociais como a ideia de que beleza e juventude nunca andam em separado. A pressão para permanecer impecável e assim mais bela assombra mulheres em suas vidas pessoais e profissionais.

De acordo com o estudo canadense Body Image in Adult Women, aquelas que estão no período pós-menopausa enfrentam uma imensa queda na autoestima e confiança em função dos sinais mais claros do envelhecimento. E a maioria delas só sente a confiança voltar após intervenções estéticas.

No Brasil, essas constatações são avalizadas pelos índices que posicionam o país no topo do ranking de cirurgias plásticas, aplicação de botox e outros tratamentos para atenuar ou mascarar efeitos do tempo. Na conversa sobre como abraçar a idade e a beleza em outras idades, ficou evidente que a ditadura da juventude precisa e deve perder espaço nesta geração que não se define mais pela data de nascimento.

Debatedoras no painel "O fim do age shaming", a cineasta Marina Person, 51, a atriz Olívia Araújo, 48, e a diretora de cena Camila Fauss, 48, que mediou o papo, lembraram que na falta de colágeno sobra inteligência emocional com o passar dos anos. "É inegável que algumas coisas melhoram com a idade, sobretudo a cabeça da gente. O importante é se sentir bem", afirmou Marina.

Outra participante da mesa, a dermatologista Mariana Muniz atentou para a necessidade de gerenciar a ansiedade em mulheres que após os 45 anos investem indiscriminadamente em procedimentos estéticos e acabam por chegar a resultados artificiais e exagerados. "O ideal é que intervenções a partir dos 40 anos tragam benefícios a longo prazo. E o tratamento precisa ser condizente com o estilo de vida, para que o resultado não seja mais uma fonte de frustração", alerta.

Em meados dos anos 1950, foi criado nos Estados Unidos o Conselho Nacional do Envelhecimento (CDA), que nasceu como instituição de caridade. Sete décadas depois, a organização evoluiu sua atuação para a defesa dos direitos dos idosos.

E não estamos falando aqui apenas em direitos legais, mas, e principalmente, aqueles previstos para uma vida plena. Por isso, em julho desse ano, o CDA anunciou um curso de sexo na maturidade.

Houve estranheza, afinal isso significa que os mais velhos desaprendem a transar? De maneira alguma, disse a diretora da instituição. A ideia nasceu por acreditarem que saúde sexual é parte importante da saúde como um todo. Contudo, como tantos outros aspectos, também a sexualidade dos mais velhos é de certa forma, negada e desestimulada. Como se a partir de uma certa idade, você deixasse de fazer sexo.

Mas há, sim, vida na cama na maturidade. E ela fica muito mais prazerosa, como atestaram a jornalista Patrícia Parenza e a atriz Totia Meireles, duas das participantes no papo sobre como manter uma vida amorosa ativa e plena após os 45, mediado pela jornalista Conceição Lourenço. Para Totia, a manutenção da libido em determinada fase da vida tem a ver com a rotina e os hábitos sexuais que a pessoa já tinha.

Tanto homens como mulheres enfrentam alterações hormonais a partir dos 45, 50 anos. E o envelhecimento pode afetar a potência sexual, interferir no desejo e provocar sintomas físicos em mulheres como maior dificuldade de lubrificação.

Para todas essas questões, há solução na medicina e também na intimidade entre os parceiros —vale para relacionamentos longos e mais recentes.

O psiquiatra Jairo Bouer comentou que homens são mais resistentes a procurar ajuda para lidar com suas restrições, sobretudo biológicas. "Ainda hoje, muitos deles têm pavor de ir ao urologista para fazer controles periódicos da saúde da próstata, por exemplo", lembrou o médico.

A nova maturidade tem recebido muitas alcunhas e termos relacionados a ela. Perennials, ageless, etarismo, gerontolescência —são muitos os neologismos que designam aspectos comportamentais e rompem com estereótipos que quase sempre associavam a velhice a fragilidade e dependência.

A este dicionário somou-se há pouco tempo o "Elasti Generation", termo que designa o grupo de pessoas acima dos 50 anos que vem liderando e influenciando não apenas sua geração como também os mais jovens a viver no seu tempo, se mantendo atual sem querer ocultar ou fingir a idade.

Para falar sobre o assunto, Tatiana Schibuola, gerente geral de marcas e conteúdo do UOL, conduziu um painel com personalidades que representam essa nova turma.

Para algumas mulheres, como a modelo e empresária Luiza Brunet, 58, e a escritora Mariliz Pereira Jorge, 48, essa revolução tomou forma na amplificação de suas vozes. Luiza se tornou, depois de ser vítima de violência doméstica, uma das principais ativistas em defesa dos direitos das mulheres. E, para isso, teve de deixar de lado o modo discreto com que sempre levou a vida e que parecia obrigação para mulheres mais velhas.

Já Mariliz é colunista e roteirista das mais influentes em redes sociais. Seus textos assertivos e sem filtro já renderam ofensas relacionadas a sua idade. "Como se velho fosse xingamento", comentou.

Nada, no entanto, que abale a confiança de quem chegou a esta etapa da vida compreendendo e acompanhando as mudanças também como Zeca Camargo, apresentador que sempre teve uma forte conexão com o público jovem. Ele explica que adorar coisas de todas as idades não significa fingir que se tem 20 anos.

Estar focado nos benefícios da maturidade e se sentir livre são mais alguns dos segredos da longevidade. Atriz e arte educadora, Edvana Carvalho, 52, já avó, fez de suas experiências a partir dos 50, roteiro de um bem humorado monólogo. Em "Aos 50, quem me aguenta", ela aborda sexo, relacionamento, opressões patriarcais e cobranças sociais. Há temas mais atuais na vida adulta ou madura?

Elas estão ativas, trabalhando, consumindo, são vaidosas na medida ou livres se quiserem passar da medida, fazem sexo e falam sobre isso de forma mais aberta. Mas ainda enfrentam, mais ou menos a partir dos 45 anos, uma série de temores relacionados ao principal marco biológico da maturidade: a menopausa.

"As brasileiras ainda são as que mais deixam de trabalhar, sair e ir a festas quando se sentem velhas", diz a antropóloga Mirian Goldenberg, especialista em estudos de velhice e longevidade. E neste contexto, a última menstruação parecer ser a senha para essa sensação de invalidez ou invisibilidade. Por isso o último painel do Ageless Talks foi dedicado a este tabu.

É possível, com ajuda da medicina e por força de decisões pessoais, passar por esta fase com plenitude e livre de sofrimentos. Ginecologista e obstetra, Flavia Fairbanks busca conscientizar suas pacientes sobre ser essencial lidar sem tantas neuras com essa fase da saúde feminina para que boa parte da vida não seja desperdiçada. "A mulher passa um terço de sua vida entre climatério e menopausa. É muito tempo para não ser bem vivido."

A médica defende ainda que as terapias de reposição hormonal sejam vistas com menos preconceitos. Em doses ideais, geralmente até baixas, elas podem ajudar muito a administrar sintomas clássicos e outros menos perceptíveis, embora igualmente incômodos.

Há ainda alguns alimentos naturais que podem ajudar quem tem receio de hormônios. A jogadora de basquetebol Janeth Arcain, 51, que desde os 50 sofre com os famosos fogachos, lançou a dúvida para Flavia Fairbanks, que indicou aumentar o consumo de soja, linhaça e amora.

A musa fitness e apresentadora, Solange Frazão, 57, trouxe o exemplo de como é possível se sentir ainda mais bonita, feliz e confiante quando o climatério e suas posteriores mudanças apontam. No caso dela, a prática de musculação ajudou bastante.

A conclusão é de que não há receita pronta, mas ingredientes que devem se somar à necessidade do organismo e disposição de cada mulher. Também em relação à menopausa, esta geração tem liberdade de escolha. O importante é não se conformar ou paralisar a vida por conta dessa passagem.

A ressignificação do envelhecimento

"Depois de mais de dois anos publicando a coluna Ageless e de centenas de entrevistas, vejo claramente como nossa geração está ressignificando o envelhecimento e provando que idade é apenas número", afirma Silvia Ruiz.

Se por um lado há maior consciência de como a maturidade traz aquela liberdade que só o passar dos anos e uma infinidade de vivências permite conquistar, há ainda transformações sociais necessárias para que esta população seja mais vista e representada.

Mirian Goldenberg atenta que é preciso também uma transformação interna, inclusive entre os mais velhos: "a 'velhofobia' existe dentro de nós, quando enxergamos a velhice de outras mulheres e a julgamos com crueldade", diz. "Quando é justamente nessa fase que chegamos ao auge da vida".

Realizado por VivaBem, o Ageless Talks foi um encontro da geração que passou dos 45 anos para falar de corpo, mente, vitalidade e sexualidade. Em sua primeira edição teve apoio de Natura Chronos e Vitasay 50 e produção das jornalistas Bárbara Therrie, Diana Cortez e Lia Rizzo.

O evento está disponível na íntegra no canal do UOL no YouTube. Bem como os melhores momentos da cobertura em tempo real estão no perfil de VivaBem no Instagram e ainda na coluna assinada por Silvia Ruiz, idealizadora e curadora do projeto.

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