Diante de um cemitério quase vazio, onde só é possível ouvir o latido dos cachorros e a chegada dos carros do serviço funerário, o motorista da prefeitura pergunta: "É ali?" Apontando para os túmulos mais próximos. O sepultador James Alan balança a cabeça e responde que sim: "Onde está o pessoal de branco".
Não dá nem cinco minutos para um outro carro encostar e o funcionário fazer a mesma pergunta. Nas mãos, um formulário com o código D3, indicando que a pessoa morreu de covid-19 ou estava sob suspeita. Cenas como essas viraram quase que rotina no maior cemitério da América Latina, o Vila Formosa, na zona leste da capital paulista. "Tivemos 750 sepulturas ocupadas em 15 dias. Lembro de um dia que, em um intervalo de três horas e meia, fizemos 43 sepultamentos, sendo que 22 foram de covid", relembra Alan.
A cidade de São Paulo conta com 257 sepultadores, 49 só no Vila Formosa. O local precisou fazer algumas mudanças para garantir a saúde e evitar a contaminação desses funcionários. E, se antes o serviço já era exaustivo, agora o cansaço vai além do físico e já deixa a saúde mental na corda bamba. "Parece que você sempre está com a cabeça pesada", diz Wilker Costa, sepultador que trabalha no cemitério há nove anos.
Saindo do estado de São Paulo e indo para o Amazonas, em Manaus, o cenário é ainda pior. O colapso no sistema de saúde e os enterros em valas deixam o psicológico muito abalado. Para Genésio Filho, que trabalha há 15 anos no cemitério Nossa Senhora Aparecida, conhecido como Tarumã, não tem como se acostumar.