Cria de Ramos, rainha da Imperatriz exalta favela: 'Poder de mudar eleição'
"Sem comunidade não se faz carnaval". É esse o recado que Maria Mariá, 21, deixa após ver a sua escola do coração levar o título de campeã de Carnaval do Rio após 22 anos de jejum. Cria de Ramos, ela está a frente da bateria da Imperatriz Leopoldinense pelo primeiro ano.
A jovem, que é faixa preta de Taekwondo e formanda em comunicação, vive a poucos quarteirões da quadra da escola. Ela frequenta o espaço desde pequenininha e acredita que o Carnaval pode ajudar a transformar a realidade das favelas. "O samba nasceu aqui", afirma.
Ela enaltece o poder de Ramos e do Complexo do Alemão, além de lamentar as fake news criadas em torno da comunidade no último ano - durante o período eleitoral — e críticas proferidas à favela mesmo quando está no auge.
"Infelizmente, o nosso país foi montado com base escravocrata. Isso perpetua até hoje. As pessoas que estão nas favelas eram as que estavam naquele lugar. Ainda existe esse olhar de superioridade, de achar que eu sou melhor que você pelo tom de pele ou por onde veio", diz.
Ela reforça que o Carnaval é uma época boa para mostrar que pessoas talentosas vivem nas comunidades.
"Pessoas capacitadíssimas vivem aqui dentro e são produtoras de conhecimento. Não existe ninguém melhor que a gente para falar da gente e da favela", continua.
"Quando a gente demonstra aos preconceituosos que eles não estão mais num lugar confortável, principalmente os que sempre tiveram no topo, eles se sentem incomodadas porque estão vendo uma subversão. Ainda assim, tentam apagar", completa.
A gente produz muito, a gente movimenta, a gente é capaz de mudar o rumo de uma eleição. Nós podemos fazer tudo e não vai ter ninguém para parar. A gente é criado em um ambiente que mostra que nunca podemos desistir, que só nós podemos fazer por nós.
Hora das rainhas das comunidades
Um marco aconteceu em 2023: o protagonismo de mulheres pretas e de comunidade à frente das baterias. Das 12 agremiações, 6 delas contaram com rainhas que cresceram nas quadras das escolas de samba.
"Nosso lugar não deveria ter sido tirado. Esse resgate das escolas é importante para mostrar a representatividade do samba. A conexão com a comunidade é a pessoa mais fundamental... Sem essas pessoas que estão aqui na quadra, não se tem Carnaval. É importante que elas se sintam representadas", afirma.
Força de Lampião
Para Maria, o enredo que fortalece a cultura nordestina é uma lição contra xenofobia.
A escola levou o enredo "O aperreio do cabra que o excomungado tratou com malquerença e o santíssimo não deu guarida" para a avenida na segunda noite de desfiles da série especial.
"Nesses últimos quatro anos, a gente percebeu que o preconceito aumentou de uma maneira surreal, principalmente com a polarização das coisas. A xenofobia está aí. As pessoas não olham com carinho pelo outro. Não é assim que funciona", reflete a rainha de bateria.
Por ser um país com dimensão continental, o Brasil tem diversas culturas dentro de si.
"A gente precisa entender que cada local tem seu jeito de viver e sua engrenagem. O que funciona no Norte ou Nordeste, não funciona no Sul ou Sudeste. Somos diversos, isso é bacana", finaliza.
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