Mercedes-Benz Classe X: cancelamento gera atritos entre alemães e Nissan
Resumo da notícia
- Mercedes decidiu abortar o projeto da Classe X na Argentina
- Decisão afetou a produção da Nissan Frontier no país
- E "azedou" o clima entre a montadora japonesa e alemã
Abril de 2012: a Mercedes-Benz dava o pontapé inicial na jogada para concretizar os planos de ter a primeira picape média de sua história, ao definir parceria com a Renault-Nissan para fabricação de um projeto conjunto -- com uma picape de cada uma das marcas, todas derivadas de uma base comum -- na Argentina (também haveria fabricação na Espanha e no México). Abril de 2019: após fazer lançamento global em 2017, definir planos de participação de até 23% nos principais mercados e marcar data de lançamento do carro na América do Sul para o final de 2019, a Daimler (controladora da Mercedes) decidiu abortar o projeto da picape Classe X, "por conta das condições únicas da economia argentina".
No Brasil, a Mercedes-Benz apenas "repassou" a informação do cancelamento da importação da Argentina para nosso país da picape, uma vez que seria o país vizinho o responsável pela fabricação. Não houve uma maior explicação, até o momento, sobre o futuro da Classe X por aqui: se estaria "enterrada" de vez; ou se poderia fazer algum sentido trazer da Espanha ou mesmo do México, ainda que apenas em versões mais caras.
Mas é certo afirmar que o projeto deixado de lado também gera prejuízos. Fontes ligadas de alguma forma à operação já haviam relatado a UOL Carros, em janeiro, que o projeto estava na fase de final definição da campanha de marketing (passo iniciado em agosto do ano anterior), com identificação dos primeiros grupos de clientes em potencial e da melhor maneira de fazer o "barulho" inicial típico do lançamento de um produto inédito, sobretudo em categoria tão concorrida e cheia de peculiaridades. A rede de concessionários também já se movimentava selecionando possíveis compradores há mais de ano.
Na Argentina, porém, a pressão é maior: e gera atritos a Classe X seria responsável por 70% da produção da unidade de Córdoba, fábrica que teve investimento de quase US$ 800 milhões para receber o projeto triplo -- mais de 40 mil unidades da produção total planejada de 70 mil unidades da fábrica seriam do modelo da Mercedes.
Nissan Frontier (que está sendo vendida à Argentina e também ao Brasil desde janeiro) e Renault Alaskan (com lançamento colocado na geladeira), juntas, entregariam menos de 30 mil unidades. Pior: diversos argentinos já haviam feito a reserva da picape a reclamam que foram enganados, por estarem comprando, na verdade, um "conceito, não um produto real", segundo a imprensa local. Cinquenta unidades chegaram da Espanha à Argentina, mas não serão para abastecer consumidores locais e sim destinadas ao Chile.
Assim, Manuel Mantilla, novo presidente da Mercedes-Benz da Argentina, quebrou o silêncio ao jornal argentino "Clarín", na edição da última sexta-feira (17), em entrevista intitulada "É triste que a picape Classe X não seja fabricada na Argentina". Nela, o executivo deixa claro que "não se chegou a um acordo entre Daimler e Nissan" -- a íntegra da entrevista pode se lida neste link.
Mantilla, que é o primeiro argentino a comandar a empresa na história da marca no país vizinho desde Juan Manual Fangio (sim, o piloto cinco vezes campeão da Fórmula 1), não foi claro sobre uma mudança nos termos entre as duas fabricantes. A fábrica de Córdoba pertence ao grupo Renault-Nissan-Mitsubishi e, mesmo tendo uma maior fatia, a Mercedes certamente deveria pagar pela produção.
Segundo o site automotivo Argentina Autoblog, outros executivos da Mercedes argentina já haviam se queixado de que a Nissan havia ampliado este repasse de US$ 26 mil por picape produzida para mais de US$ 35 mil -- valores que UOL Carros não sabe se procedem, mas que parecem demasiadamente elevados.
Mantilla também não fala de valores ao "Clarín", mas é possível perceber, pelo tom de suas respostas, que o negócio com a Nissan teria mesmo azedado. Ao ser perguntado pelo jornal "por que o projeto do trio de picapes teria funcionado na Espanha e não na Argentina", foi direto:
"O que sabemos é que o projeto começou com a fabricação em Barcelona [Espanha] e que a América Latina seria o segundo passo. Acredito que, provavelmente, essa pergunta seja mais adequada para a Nissan". Após isso, afirmou que não pretende mais vender a Classe X por lá, nem mesmo por importação, e passou a tratar dos furgões Vito, que passa a ser feito na Argentina, e novo Sprinter -- ambos projetos que interessam também ao Brasil. Foi o fim da conversa sobre a Classe X.
No Brasil
De fato, há um clima pesado entre Nissan e Mercedes-Benz e isso foi possível notar na última semana, aqui em São Paulo, durante entrevista do novo presidente da marca japonesa para a América Latina, Guy Rodriguez, a jornalistas brasileiros.
Ao ser questionado sobre o imbróglio das picapes, Rodriguez foi direto:
"A Daimler não vai fazer picape lá [na Argentina], mas para Nissan a fábrica é fundamental. Claro que causa algum prejuízo, mas mantemos nossa posição e estamos fazendo nosso trabalho, adaptando nossa produção à demanda".
Sem a Mercedes e com uma fábrica extremamente ociosa, num país em crise, a Nissan terá de achar rapidamente uma solução para não ter prejuízo. A saída, talvez, seja redirecionar fluxos globais de produção da Frontier.
"Estamos analisando mercado, potencial de exportação e também a qualidade do produto, que tem tido grande evolução em relação ao produto que era feito no México, com conforto, motorização e qualidade", apontou Rodriguez, afirmando que a Frontier argentina tem tido "grande aceitação na Argentina e no Brasil".
Apenas para dar o panorama -- e considerando apenas o cenário brasileiro -- a Frontier argentina é a última colocada entre as picapes consolidadas no mercado, com 2.571 unidades emplacadas este ano. Chevrolet S10 entregou 8.247 unidades; Toyota Hilux, 13 mil unidades; e Fiat Toro, que não tem exatamente o mesmo porte, mas é o chamariz desse segmento, teve 17.824 vendas, segundo a Fenabrave.
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