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Nova série da HBO, 'Winning Time' conta história de dinastia dos Lakers

HBO lança série sobre o Los Angeles Lakers em seu serviço de streaming - Reprodução/Twitter HBO
HBO lança série sobre o Los Angeles Lakers em seu serviço de streaming Imagem: Reprodução/Twitter HBO

Por Ágata Máximo

16/03/2022 04h00

No último dia 6, estreou na HBO uma das séries mais aguardadas pelos amantes de basquete nos últimos tempos. Anunciada em 2019, "Winning Time: The Rise of the Lakers Dinasty" ("Lakers: Hora de Vencer", em tradução livre para o português) prometia contar a trajetória de Jerry Buss e seu esforço para transformar um Lakers então marcado por derrotas na maior franquia de basquete do mundo nos anos 1980. E se nós temos excelentes exemplos de produções que contam a história do basquete, de documentários a filmes, eu devo dizer que nada se assemelha ao que a nova série da HBO ousa fazer.

O roteiro da série é baseado no livro "Showtime: Magic, Kareem, Riley, and the Los Angeles Lakers", de Jeff Pearlman, lançado em 2014, que atualmente se encontra em 1° lugar nos livros mais vendidos na categoria esporte da Amazon —o autor e sua esposa, inclusive, fazem uma pequena aparição na série, ele como jornalista e ela como secretária do Chicago Bulls. A primeira temporada da série tem 10 episódios e a direção coube a seis profissionais diferentes: Adam McKay (diretor de "Não Olhe para Cima", "A Grande Aposta" e também do piloto de "Succession", outro grande sucesso da HBO), Jonah Hill, Damian Marcano, Salli Richardson-Whitfield, Tanya Hamilton e Payman Benz.

Um fator determinante para os rumos da série foi a recusa da NBA em ceder as imagens originais dos jogos da época retratada. Sem a possibilidade de contar a história por meio dos vídeos, a série apostou na dramatização e acertou em cheio na escolha de alguns dos personagens como, por exemplo, Jason Clarke na pele de Jerry West, que se tornou um arco tão importante quanto a narrativa principal. E essa dramatização —bem como a recriação de lances famosos— não foi feita ao acaso.

Viagem no tempo

Os criadores da série sempre tiveram uma ideia quanto à forma de gravação a ser utilizada, e apostaram nas lentes analógicas de 35mm —utilizadas na segunda temporada de Euphoria e na maioria dos filmes de Tarantino, por exemplo— que transportam o telespectador diretamente para os anos 80. O efeito granulado da imagem e as paletas de cores que só podem ser alcançadas com essas lentes nos colocam imersos na ensolarada e badalada Los Angeles na narrativa de Jerry Buss, o novo proprietário da franquia, interpretado brilhantemente por John C. Reilly. Nas cenas em que Magic vai para sua casa em Lansing, temos também uma perspectiva de visão em primeira pessoa pelas lentes 8mm —unanimidade nas casas americanas da época para registrar os vídeos caseiros—, novamente aumentando o efeito de autenticidade.

Na forte cena do segundo episódio que nos leva de volta aos anos 50 para entender um pouco mais do passado abusivo vivido por Jerry West, foram utilizadas lentes 16mm, as mais comuns naquele período. E todos esses filmes passaram por um tratamento especial, com os negativos ficando ainda mais tempo na água alcalina para trazer de volta as cores especificas da famosa (e extinta) Kodak Ektachrome —tudo para aumentar a imersão de quem assiste e dar um ar de autenticidade às imagens.

A primeira cena da série se passa em 1991, mais precisamente no dia 5 de novembro, data em que Magic Johnson descobre que é portador do HIV. Sua espera no consultório médico, aliás, se dá enquanto olha a capa de uma revista com Michael Jordan estampado. Mas a história que a HBO se dispõe a contar começa muito antes, devidamente climatizada com Jerry Buss curtindo uma noitada na mansão da Playboy, cena na qual ele nos conta que está prestes a comprar um time de basquete. É a partir daí que acompanhamos os passos iniciais da negociação até a compra dos Lakers em 1979.

A quebra da quarta parede, método usado em grandes séries de sucesso (como a aclamada Fleabag), também está presente, e torna a história mais intimista; Buss está falando diretamente para quem assiste o desenrolar dos acontecimentos, que enxergamos por sua ótica parcial e viesada. O episódio inicial também é brilhante ao introduzir a rivalidade universitária entre Magic e Larry Bird, que revolucionaria a NBA para sempre, e coloca os holofotes de forma cômica e pouco sutil na questão racial que envolvia os dois jogadores e a liga no final dos anos 70.

"A série faz um trabalho magnífico em contextualizar uma NBA muito diferente da que conhecemos: pouco popular —especialmente em Los Angeles, onde os Lakers ficaram marcados por inúmeras derrotas em Finais e com fama de 'amarelões'— e com muitas dúvidas sobre o seu futuro devido a potenciais problemas financeiros, com pouco apelo sob o aspecto do entretenimento (jogos sem as festividades e o glamour que rodeiam os de hoje) e cercada por racismo, representada pela elite de donos milionários que tratam seus atletas como propriedades, e uma mídia conservadora que aponta a quantidade de atletas negros como o fator que derruba a audiência do esporte. Acredito que a maior parte dos fãs atuais da liga não conhecem esse aspecto do seu passado, e a série mostra com muita competência esse contexto" como explica Renan Ronchi, dos podcasts "Na Era do Garrafão" e "NBA 75".

Personagens marcantes

Como dito antes, Jerry West é um personagem à parte, seu temperamento imprevisível, violência excessiva e descontrole caricatos são repetidamente creditados às seis derrotas consecutivas para o Boston Celtics em Finais na década anterior, com direito a um flashback maravilhoso e sua revolta ao ganhar MVP das Finais em 1969 mesmo tendo perdido a série —até hoje, o único jogador a realizar o feito. E por falar em Boston Celtics, Red Auerbach está mais do que presente: sua apresentação na série é de deixar qualquer fã de basquete arrepiado, e com seus famosos charutos ele logo se torna o antagonista da história e o grande motivador de Buss para remodelar os Lakers, como fica claro ao longo dos episódios.

Mas o grande protagonista e agente dessa mudança é o jovem e recém-draftado Magic Johnson. As várias facetas do maior armador de todos os tempos são apresentadas de forma desordenada e caótica, causando a sensação pretendida ao retratar um jovem com muito mais possibilidades que jamais imaginaria possível. No papel mais importante de sua carreira, Quincy Isaiah entrega o Magic Johnson carismático, sedutor e com boa lábia que esperávamos, mas sem as imagens originais as cenas de basquete basquete ficam um pouco aquém das expectativas. A série mostra como sua carreira universitária astronômica garantiu a primeira posição no Draft de 1979, mas não sem um pequeno empurrão de Buss, demonstrando a capacidade de relacionamento que o dono da franquia tinha com seus jogadores quando um indeciso Magic Johnson é convencido a entrar na NBA após pisar no LA Fórum e sentir a importância que teria para o time.

Já para viver Kareem Abdul-Jabbar foi escolhido Solomun Hughes, que não tinha experiência prévia em atuar e embarcou em uma jornada psicodélica. O intérprete aproveitou a pandemia para mergulhar de cabeça na vida de Kareem, um dos atletas mais politizados e excêntricos da história da NBA. Sua passagem pela Universidade da Califórnia e até mesmo pelos Harlem Globetrotters, além da semelhança óbvia com o jogador, ajudaram a valorizar seu currículo e trazer Kareem à vida. Temos ainda Norm Nixon vivido por seu próprio filho, DeVaughn Nixon, lutando pela posição de armador titular com Johnson, e nomes icônicos como Pat Riley e Paul Westhead que, se ainda não apareceram nos primeiros episódios, devem ser apresentados em breve.

Outros grandes personagens já presentes também devem ganhar ainda mais espaço com o passar do tempo, principalmente a filha de Jerry, Jeanie Buss, atual presidente dos Los Angeles Lakers que começava a trilhar sua carreira na época. As mulheres, inclusive, foram um pilar estrutural do sucesso do time, e não existiria sequer um Showtime Lakers sem a presença e visão de Claire Rothman, interpretada pela vencedora do Emmy, Gabby Hoffman. A lendária GM e presidente do LA Fórum —ginásio em que a franquia jogava— foi quem viabilizou os sonhos de Buss, transformando a arena em uma inesgotável fonte de renda e permanecendo no comando até 1995. Seu temperamento explosivo também é evidenciado na série, bem como sua fixação por contas e economias, e como sua mentoria foi de extrema importância para tornar Jeanie Buss a profissional que é hoje. Aliás, no auge dos seus 95 anos, Claire Rothmann chegou a ler o script do primeiro episódio e não gostou nem um pouco de como sua imagem foi retratada, mas seu papel deve continuar crescendo ao longo dos episódios.

Showtime?

Postos esses elogios, um elemento principal foi esquecido em muitos momentos: o basquete, o showtime, o espetáculo em quadra me parece ser um coadjuvante que não teve a importância que deveria. Para se ter uma ideia, a temporada de 1980 começa de fato somente no episódio 5, enquanto no 8 ainda estamos no All-Star Break.

Com a cena inicial focada em 1991, algumas perguntas se destacam: qual é o propósito da cena para a temporada? E por que ela está ali, se o foco é o início da dinastia? A primeira temporada do seriado deve se ater à temporada 1979-1980, culminando nos playoffs e no mitológico jogo 6 das Finais que garantiu o único prêmio de MVP Finals concedido a um calouro na história da liga (Magic) —demonstrando a intenção da produtora de criar uma narrativa longeva, uma vez que os anos 80 foram dominados pela franquia da Califórnia e o que não falta é história para contar.

A série ainda está em seu terceiro episódio, com lançamentos todo domingo, às 23h, na HBO Max. Se você ainda não deu o play, tá na hora de embarcar nessa jornada histórica e aproveitar para reviver ou conhecer o nascimento de uma das maiores dinastias do esporte.