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Fórmula 1

Rubinho nervoso e dúvidas. Como a F-1 encarou ressaca da morte de Senna

Diego Salgado e Maurício Dehò

Do UOL, em São Paulo

26/03/2015 06h00

Um capacete verde e amarelo ainda era o destaque do grid de largada do GP do Brasil de 1995. Nele, milhares de brasileiros depositavam a esperança por novas vitórias e títulos. Naquele domingo, dia 27 de março, porém, as cores do País foram levadas a público por outro piloto: Rubens Barrichello, que prestava uma homenagem a Ayrton Senna na abertura da primeira temporada após o acidente fatal do tricampeão mundial em Ímola, 11 meses antes.

"Foi estranho para todos começar aquele negócio sem ele. Você via na cara de todo mundo que estava faltando alguém, um sentimento de ausência", disse o jornalista Reginaldo Leme ao UOL Esporte.

Havia mesmo um clima diferente no ar quando os motores da Fórmula 1 voltaram a soar no autódromo paulistano há exatos 20 anos. A principal categoria do automobilismo dava início a uma nova era. Na pista, além do vazio deixado por Senna, havia a preocupação com a segurança dos pilotos depois de graves acidente em 1994. Assim, novas regras foram implantadas, como a limitação da velocidade e restrições aerodinâmicas dos carros.

Após anos de intensa disputa, a temporada 1995 trazia à tona uma realidade oposta à registrada nas décadas anteriores. No grid de largada, apenas um campeão mundial lutava por mais uma conquista: Michael Schumacher. Ainda na Benetton, o piloto alemão iria garantir, com tranquilidade, o segundo título seguido da Fórmula 1 em outubro daquele ano, no GP do Pacífico -- ao término da temporada, o alemão superou Damon Hill por 33 pontos (102 a 69).

O cenário era alvo de críticas de grande pilotos. O francês Alain Prost, dias antes da primeira corrida da temporada, chegou a afirmar que a Fórmula 1 estava decadente. "A minha geração tinha pilotos de muito mais carisma. Além disso, o mundo viu imagens muito chocantes em 1994, o que contribuiu para a má reputação da categoria", disse o tetracampeão mundial, lembrando dos acidentes fatais de Ayrton Senna e Roland Ratzenberger no circuito de Ímola.

Em 1995, três brasileiros tentavam suprir a falta de Senna: além de Rubens Barrichello, da Jordan, Roberto Pupo Moreno e Pedro Paulo Diniz, ambos da Forti-Corse, representavam o Brasil na Fórmula 1. Na sua terceira temporada, Barrichello era o piloto mais novo da categoria. Aos 22 anos, ele tinha como maior trunfo o sexto lugar geral em 1994, com direito a um pódio no GP do Pacífico e um quarto lugar em Interlagos.

No GP do Brasil de 1995, Sid Mosca, criador do modelo de capacete usado por Senna nas 11 temporadas da Fórmula 1, desenhou um modelo especial para Barrichello. "É sempre uma força a mais. O Sid fez uma pintura excelente. Dá a impressão da pintura do Ayrton dentro e a minha por cima. Para realizar um desejo de todos nós, um desejo do povo, de tentar, de uma certa forma, tapar um pouquinho do buraco que foi deixado", afirmou Barrichello à Rede Globo minutos antes da largada em Interlagos.

Para Pupo Moreno, a homenagem fez a torcida brasileira enxergar um novo Senna. "O Rubens cometeu um grande erro quando pintou o capacete com as cores do Ayrton. As pessoas interpretaram que ele seria o novo representante. O brasileiro estava buscando um novo vencedor. Até hoje busca. Mas era difícil ter um cara que substitua o Ayrton", disse à reportagem o ex-piloto de Fórmula 1, que voltou à categoria em 1995, aos 36 anos, para a disputa da sua última temporada.

Rubinho foi saudado pela torcida enquanto esteve na pista. O apoio, entretanto, era sempre seguido de uma menção a Senna. Uma das faixas levadas à arquibancada de Interlagos, por exemplo, incentivava Barrichello depois de uma lembrar o ídolo morto: "Ayrton Senna, ainda estamos com saudade. Acelera, Rubinho". O brasileiro chegou a chorar nos boxes após rodar na pista durante o treino oficial e marcar o 16º melhor tempo.

Antes da corrida, Senna recebeu mais homenagens. Os 25 pilotos do grid desfilaram em carro aberto com bandeiras do Brasil. Na pista, poucas mudanças ocorreram em relação à temporada 1994. Schumacher voltou a vencer depois de largar na segunda colocação -- Damon Hill, pole position, teve problemas com a Williams na 30ª volta.

David Coulthard, companheiro do inglês, e Gerhard Berger, que ainda corria pela Ferrari, completaram o pódio. Barrichello e Pupo Moreno deixaram a prova nas voltas 16 e 47, respectivamente. Já Pedro Paulo Diniz, na sua estreia na categoria, cruzou a linha de chega na décima posição.

A temporada de 1995 ainda foi marcada pela despedida Nigel Mansell da Fórmula 1. O campeão mundial de 1992 perdeu a vaga na Williams para Coulthard e chegou a disputar duas corridas pela McLaren (San Marino e Espanha). O piloto inglês acabaria substituído por Mark Blundell por estar acima do peso e não caber no carro da equipe de Ron Dennis.

Público abaixo do normal

Segundo Reginaldo Leme, Schumacher, à época, ficou surpreso com a presença de público no GP do Brasil de 1995. Para o piloto, isso não ocorreria na Alemanha se o país perdesse um ídolo da Fórmula 1. "Ele me falou que isso mostrou como ele passou a amar os brasileiros, pela paixão que eles tinham pelo automobilismo", disse o jornalista.

Pupo Moreno, por sua vez, disse que muitos torcedores continuaram assistindo às corridas após a morte de Senna. "O brasileiro que perdeu a vontade de ver a Fórmula 1 assistia por causa do Ayrton. Não por causa da Fórmula 1. Aquele que assistia pela Fórmula 1 continua vendo até hoje. Nós perdemos um grande herói do automobilismo, mas a Fórmula 1 sempre foi a mesma. Ela fez o Ayrton. É muita ambição dizer que a Fórmula 1 caiu sem ele. Para os torcedores do Ayrton, sim", frisou.

O GP do Brasil de 1995, porém, apresentou queda de público em relação aos anos anteriores. No total, 37 mil pessoas assistiram à vitória de Schumacher. Em 1990, quando a Fórmula 1 voltou a Interlagos, 100 mil pessoas foram ao autódromo no dia da corrida. Além da lotação máxima do circuito (75 mil lugares), outros 30 mil não puderam entrar no local devido a uma fraude na impressão dos ingressos.

Os torcedores brasileiros também lotaram as arquibancadas entre 1991 e 1994 -- neste período, Senna venceu duas vezes em Interlagos (1991 e 1993). Nos últimos anos, o melhor público se deu na temporada 2008, quando Felipe Massa correu no Brasil com chances de ser campeão. Na ocasião, 76.400 espectadores compareceram ao local.

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